Paraíba

Coluna

Uma memória do 25 de Julho na Paraíba

22ª edição do 25 de julho na Paraíba - Divulgação
Na Paraíba, desde 1998, ativistas negras vêm marcando essa data

Uma memória do 25 de Julho na Paraíba

 

Por Terlúcia Silva* e Durvalina Rodrigues**

 

Desde 1992, o “25 de Julho” tem sido um data para marcar, celebrar e fazer mobilização em torno das pautas políticas das mulheres negras da América Latina e do Caribe.  Em tal ano ocorreu o I Encontro de Mulheres Afro-Latino-Americanas e Caribenhas, em Santo Domingo/República Dominicana, em referência à luta de resistência à invasão das Américas (1492).  A partir de então, o 25 de julho passou a ser considerado Dia Internacional de luta das mulheres negras. 


Na Paraíba, desde 1998, ativistas negras vêm marcando essa data, que nos primeiros três anos, tiveram ações mais comemorativas em residências de algumas mulheres.  A partir de 2001, com a institucionalização da Bamidelê – Organização de Mulheres Negras na Paraíba, o “25 de Julho” se tornou agenda permanente, com a intencionalidade política de visibilizar a luta das mulheres negras, sobretudo, para a sociedade paraibana.


Nesse percurso de realização/demarcação do “25 de Julho” na Paraíba, foram realizadas ações diversas, como seminários, encontros, debates, apresentações  culturais, incidência política, em parceria com o Movimentos de Mulheres e o Movimento Negro, ambos da Paraíba, sempre na perspectiva de denunciar o racismo e dar visibilidade a luta das mulheres negras no estado e no Brasil. 


Algumas edições são expressivas no que diz respeito à ampliação do debate sobre o racismo, identidade racial negra, desigualdades de gênero, Educação Antirracista, Representação, entre outros temas. Assim, na 8ª Edição (2005), o 25 de julho chegou “às ruas”, no espaço público (praça) com a realização de um ato político e cultural na área central de João Pessoa – Parque da Lagoa –, com participação de crianças, jovens, mulheres de Santa Rita e mulheres da Comunidade Caiana dos Crioulos, ativistas de variados campos de atuação e pedestres. Na 12ª Edição do 25 de julho, em 2009, tivemos o lançamento da Campanha de Afirmação da Identidade Negra na Paraíba: Moren@, Não. Eu sou Negr@! no Teatro Paulo Pontes e, anos depois, em 2015, aconteceu o I Encontro Estadual das Mulheres Negras da Paraíba, que reuniu cerca de 100 mulheres negras, em parceria com o Comitê Impulsor Paraibano da Marcha das Mulheres Negras, com a Rede de Mulheres Negras do Nordeste, com a Articulação de Mulheres Negras Brasileiras/ AMNB  e a Articulação de Mulheres Brasileiras/AMB, como parte da programação da 18ª Edição do “25 de Julho PB” e processo organizativo da Marcha de Mulheres Negras, iniciado em julho do ano anterior. 


Com o processo de criação da Rede de Mulheres Negras do Nordeste, em 2013, as organizações da Rede passaram a organizar o “Julho das Pretas”, idealizado pelo Odara – Instituto da Mulher Negra da Bahia, como estratégia para revelar a luta das mulheres negras na região. Nesse período, iniciava-se também a mobilização em torno da realização da 1ª Marcha Nacional das Mulheres Negras contra o Racismo, a Violência e pelo Bem Viver, concretizada em 2015. O processo de mobilização da marcha na Paraíba foi protagonizado pela Bamidelê – OMN/PB em conjunto com o Comitê Impulsor Paraibano. E a partir desse momento, as organizações de mulheres negras da Paraíba passam a integrar também o Julho das Pretas, durante o mês da visibilidade das lutas das mulheres negras, alinhando, assim, o tema local ao que está sendo assumido pela Rede de Mulheres Negras do Nordeste, sem perder a dimensão histórica do que vinha sendo construído desde o final da década de 1990. 


No contexto pós-Marcha/2015, o “25 de Julho” se expande ainda mais, a partir do surgimento de outras “sujeitas” políticas, como a Abayomí – Coletiva de Mulheres Negras na Paraíba e a integração de mulheres negras de diferentes áreas e locais de atuação, mas que não estavam vinculadas a organizações ou grupos, dando-se assim um processo de concretização do Movimento de Mulheres Negras na Paraíba (2016). E o “25 de Julho” deixa de ser apenas um dia de ação política, tornando-se uma Agenda Afro Feminista durante todo o mês de julho.


Portanto, em 2020 realiza-se a 22ª Edição do “25 de Julho na Paraíba” e a 8ª Edição do "Julho das Pretas" e em consonância com as mulheres negras do nordeste e, considerando o contexto da Pandemia da COVID 19 e intensificação do racismo, com o avanço do neofascismo em nível local e mundial, temos como tema “Mulheres Negras na Paraíba: Em defesa das Vidas Negras e pelo Bem Viver!”. Com uma Agenda Afro Feminista ampla, com cerca de quarenta ações, protagonizadas por diferentes grupos e organizações que integram Movimento de Mulheres Negras na PB durante  todo o mês,  são debates, ações de denúncia e visibilidade preta nas redes sociais, diálogos, lives, ciclos de formação, título de reconhecimento de mulheres negras que se destacam na luta contra o racismo, entre outras. E considerando este contexto pandêmico, todas as realizações estão sendo por meio virtual, com conteúdos difundidos nas mídias sociais e nas emissoras de rádios. Além disso, está sendo efetivada uma Campanha de arrecadação de alimentos e produtos de higiene para distribuição a mulheres negras que se encontram em dificuldades materiais.


Banner divulgação Agenda Afro-Feminista 2020 / Divulgação

Por fim, a realização do “25 de Julho” e do “Julho das Pretas,  se constitui um importante momento político para a ampliação do debate sobre as desigualdades raciais, discutir a presença do racismo e do sexismo em nossa sociedade, revigorar a luta e dar visibilidade às pautas e demandas específicas desse segmento populacional, assim como são construídas algumas oportunidades para outros sujeitos políticos se aproximarem dos debates e incorporarem as pautas do movimento de mulheres negras às suas lutas. É um momento, enfim, para o fortalecimento da luta antirracista! 


E finalizamos com a voz poética de Miriam Alves, com o poema “Carregadores” de 1985, que renova o nosso Esperançar:

Carregamos nos ombros 
feito fardos
a luta, a dor dum passado 
Carregamos nos ombros 
feito fardo 
a vergonha 
que não é nossa 
Carregamos nos ombros 
feito carga
o ferro da marca do feitor 
Carregamos na mão 
feito lança 
as esperanças 
o que virá.

 

*Mestra em Ciências Jurídicas e Graduada em Serviço Social. Integra a Bamidelê – Organização de Mulheres Negras na Paraíba e o Núcleo de Estudos e Pesquisas Afro-Brasileiros e Indígenas/NEABI-UFPB.

**Mestranda em Antropologia, Graduada em Psicologia e Integrante da Abayomi – Coletiva de Mulheres Negras na Paraíba e o Núcleo de Estudos e Pesquisas Afro-Brasileiros e Indígenas/NEABI-UFPB.

 

Edição: Cida Alves