O Natal, para além de seu simbolismo religioso, representa um momento de troca de afetos. Com a pandemia de covid-19, no entanto, as coisas mudaram: não só porque evitar aglomerações é a recomendação científica, mas também porque a doação de alimentos e a compra de produtos agroecológicos de pequenos produtores pode ser um gesto de carinho e auxílio neste momento àqueles que sofrem com a crise econômica intensificada pela pandemia.
Nesse sentido, movimentos que atuam em prol da reforma agrária, agricultura familiar e agroecologia, como o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA) iniciaram as campanhas "Natal Sem Veneno" e a "Cesta Esperança", respectivamente, com a venda de cestas de alimentos a preços acessíveis.
Segundo o camponês e dirigente nacional do MPA, Leomárcio Araújo, o objetivo da campanha é reforçar o acesso ao alimento agroecológico por parte do povo trabalhador que está na cidade.
“Quando se fala do alimento saudável na cidade, estamos falando em grande medida do alimento orgânico, que é tratado em muitos momentos como nicho de mercado, onde muitas vezes o trabalhador de baixa renda não tem acesso”, afirma Araújo.
::Compra de alimentos da agricultura familiar é crucial, diz ex-diretor da Conab::
A campanha também visa a valorização dos alimentos provenientes da agricultura familiar, que, segundo relatório da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), possui “importância econômica vinculada ao abastecimento do mercado interno”: representa 35% do Produto Interno Bruto Nacional e absorve 40% da população economicamente ativa brasileira.
Com a crise econômica e a redução de políticas de desenvolvimento da agricultura familiar, no entanto, esse quadro fica fragilizado, e, por isso, a importância de valorização com as campanhas.
“Nesse momento, isso tudo se agrava em medida alarmante, uma vez que são cortadas todas as possibilidades de apoio. Mesmo que alguns programas não sejam extintos, mas na medida que o recurso não chega, que não viabiliza e não fortalece, isso complica muito mais”, afirma Araújo.
Como exemplo, o dirigente cita o veto presidencial à quase totalidade da proposta que previa um auxílio financeiro aos agricultores durante a pandemia de covid-19. O recurso seria repassado para os produtores que não receberam o auxílio emergencial. No total, seriam cinco parcelas de R$ 600, ou seja, R$ 3 mil.
Diante deste cenários, campanhas como as realizadas pelo MPA e MST se tornam ainda mais “necessárias”, ressalta Araújo, por meio de uma “perspectiva de fazer chegar às cidades esses alimentos agroecológicos produzidos a muitas mãos das comunidades quilombolas, dos pequenos agricultores, na sua diversidade, para que essas famílias de renda baixa também possam ter acesso”.
Com isso, o MPA espera vender cerca de 20 mil cestas básicas, com produtos agroecológicos, em cada um dos 19 estados nos quais o movimento está presente.
Na mesma linha, segundo Cristiano Czycza, do assentamento Santa Maria, do MST, em Paranacity, no norte do Paraná, o objetivo do movimento é “dialogar com a sociedade uma nova forma de consumo, tanto de comercialização, que seja direto dos produtores ou de suas entidades representativas com o consumidor, e dialogar com os consumidores uma nova forma de consumo, de consumir produtos que estejam na perspectiva da agroecologia”.
A campanha do MST do Paraná, "Cesta Esperança", tem dois modelos de cestas. É possível comprar cestas para consumo pessoal e presentear ou comprar uma cesta com produtos básicos, como arroz, feijão e macarrão, que será doada pelo MST, em âmbito nacional, para famílias em situação de vulnerabilidade, junto com outros produtos, in natura, do movimento, em uma ação que ocorrerá no fim do ano.
Segundo o movimento, a ação é uma continuação da campanha iniciada pelo MST no início da pandemia de doação de alimentos por todo o país. Apenas no Paraná, foram doadas 442 toneladas de alimentos, em 121 assentamentos e 51 acampamentos, por 80 municípios. A expectativa é que sejam vendidas cerca de duas mil cestas até o dia 14 de dezembro, em Curitiba e Região Metropolitana.
::Campanha nacional do MST já doou 1.200 toneladas de alimentos durante pandemia::
“Além de garantir a ceia e a celebração da vida neste Natal, queremos que este kit de alimentos seja símbolo de esperança. Que cada item ganhe um sabor especial e fortaleça as mulheres, homens, jovens, crianças e idosos no desejo de construir uma realidade mais justa para todas e todos”, enfatiza Czycza, que também é integrante da Cooperativa Central de Reforma Agrária do Paraná (CCA).
Edição: Leandro Melito