Cada dia de silêncio representa mais uma bofetada no rosto da sociedade civil brasileira
Quem mandou matar Marielle? Esta é a pergunta de um milhão de dólares. Nesta terça-feira, 8 de dezembro, completa-se o milésimo dia de silêncio sobre o assassinato da vereadora do PSOL carioca e seu motorista Anderson Gomes. Eles foram mortos na noite de 14 de março de 2018, pouco depois das 21h., no Estácio, centro do Rio, quando um carro emparelhou com o deles e 13 tiros foram disparados.
Quem mandou matar Marielle? Cada dia de silêncio representa mais uma bofetada no rosto da sociedade civil brasileira. São mil dias de vergonha.
Há muito mais perguntas perseguindo respostas do que suspeitos levantados pela polícia.
Por qual motivo Marielle foi assassinada?
Por que a polícia deixou passar tanto tempo antes de ouvir testemunhas importantes que estavam nas imediações do local do crime?
Os ex-policiais Ronnie Lessa e Élcio Vieira de Queiroz, presos e apontados como os assassinos, negam até mesmo a autoria. Não disseram nada mais além disso?
Policiais teriam obtido “imagens relevantes” do dia do atentado que acabaram perdidas. Foi isso mesmo?
Por que a polícia carioca demorou um ano para chegar aos suspeitos?
Coluna: Brasil, a bala em lugar do voto
Os ex-policiais Ronnie Lessa e Élcio Vieira de Queiroz, presos e apontados como os assassinos, negam até mesmo a autoria. Não disseram nada mais além disso?
No local do crime foram encontrados oito cartuchos de um lote UZZ18, munição exclusiva da Polícia Federal. A PF já sabe como o lote foi parar nas mãos dos assassinos?
Lessa era vizinho de Jair Bolsonaro no condomínio Vivendas da Barra. Segundo o site condomíniosdobrasil.com.br, o Rio de Janeiro tem 21.506 condomínios. O fato do suposto assassino morar a poucos passos de Bolsonaro – uma possibilidade em 21,5 mil -- entra na conta das coincidências?
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Expulso da PM por envolvimento com milicianos, Elcio Queiroz, que teria dirigido o Cobalt prata de onde Lessa disparou contra Marielle e Anderson, também frequentava o Vivendas da Barra, onde tem foto com Jair Bolsonaro. Casualidade?
Outro Queiroz, Fabrício, ex-policial, mago da “rachadinha” e amigo do peito do chefe do clã Bolsonaro, era também segurança do então deputado Flávio Bolsonaro e íntimo do miliciano Adriano da Nóbrega, morto na Bahia em 2019, um dos cabeças do Escritório do Crime. Até que ponto ia essa relação?
Quando explodiu o escândalo da “rachadinha” no final de 2018, Queiroz sumiu. Em janeiro de 2019, Nóbrega também desapareceu. Mas o MP descobriu que continuaram mantendo contato. Sobre o que falavam?
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A mãe de Nóbrega, Raimunda Magalhães, e a ex-mulher do miliciano, Danielle Mendonça, viraram funcionárias fantasmas no gabinete do então deputado estadual Flávio Bolsonaro. Por qual motivo?
Existe vinculação entre Nóbrega e o assassinato de Marielle e Anderson?
Se a polícia não obteve as respostas fundamentais, é necessário que outras perguntas sejam feitas, não mais sobre o crime mas sobre a própria polícia
A polícia carioca apreendeu 13 (treze!) celulares de Nóbrega. Quem ligava para ele e para quem ele ligava?
Desde os assassinatos, um deputado federal, Jean Wyllys, e uma candidata a governadora, Márcia Tiburi, tiveram que deixar o Brasil ameaçados de terem o mesmo destino das vítimas. Hoje, outra deputada pelo Rio, Talíria Petrone, vivendo sob o mesmo risco, denunciou o fato à Organização das Nações Unidas (ONU).
Investigar é, sobretudo, fazer perguntas. Para os outros e para si mesmo. E refletir. Parece que quem investiga não fez as perguntas certas para as pessoas certas.
Se a polícia não obteve as respostas fundamentais, é necessário que outras perguntas sejam feitas, não mais sobre o crime mas sobre a própria polícia. Não fazê-las custará muito mais vergonhas para uma democracia já anêmica como a nossa.
*Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.
Edição: Leandro Melito