INTERESSE DO MERCADO

Após 8 meses de racionamento, água pode ficar mais cara em Curitiba

Mercado reclama do baixo lucro e pede reposição do índice que foi suspenso durante a pandemia

via Porém.net |
O "presente de Natal" dos acionistas que comprarem ações da Sanepar está encomendado para o início de dezembro - Divulgação

Após a privatização da Copel Telecom - braço de telecomunicações da Companhia Paranaense de Energia -, no último dia 9 de novembro, os acionistas do mercado financeiro esperam, agora, pelo reajuste de 9,6299% da tarifa de água como presente de Natal da Companhia de Saneamento do Paraná (Sanepar), controlada pelo governador Ratinho Junior (PSD). Pelo menos é o que indica relatório da Corretora Planner, do último dia 18 de novembro, ao indicar a compra de ações da empresa de saneamento.

Desde março, Curitiba e região metropolitana estão fazendo  um rodízio de abastecimento de água. Apesar dos problemas que a população enfrenta a Sanepar registrou, este ano, lucro maior do que no ano passado. Isso com a Agência Reguladora de Serviços Públicos Delegados do Paraná (Agepar) tendo adiado o reajuste que ocorreria em maio, por conta da pandemia, e suspenso a sua aplicação em outubro, devido a pressão da sociedade. O lucro consta no “Relatório de Resultados do terceiro trimestre de 2020 e que serviu como parâmetro para a corretora projetar um lucro maior em 2021.

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O presente de Natal dos acionistas que comprarem ações da Sanepar está encomendado para o início de dezembro. É quando termina o prazo dado pela Agepar, controlada pelo Governo do Paraná, para que a Sanepar e o próprio governo debatam o valor do reajuste suspenso. Na ocasião, em primeiro de setembro, o governo do estado não reivindicou a revogação do aumento. O estado tem 20% das ações. Os outros 80% estão divididos quase que exclusivamente entre acionistas nacionais (38,24%) e estrangeiros (35,56%).

Sanepar registra lucro com tarifa atual

Mesmo sem o reajuste solicitado pela Sanepar, ainda em fevereiro, a empresa aumentou seu lucro em relação a 2019. De acordo com o relatório de resultados apresentado em 17 de novembro, ao comparar o arrecadado até setembro de 2020 com o mesmo período de 2019, os indicadores financeiros apresentam 5,3% de crescimento da receita líquida, 3,3% de aumento EBITDA, chegando a R$ 1,38 bilhão, e 1,6% de crescimento do lucro líquido. Resultados obtidos em meio a pandemia de Covid-19 e estiagem que obrigou a empresa a adotar diversos modelos de rodízio.

A Sanepar destacou impactos financeiros com pessoal e programa de demissões: “a Companhia obteve um lucro líquido de R$164,6 milhões no 3T20, 32,4% abaixo do resultado líquido de R$243,6 milhões registrado no 3T19 devido ao impacto do crescimento de 10,3% dos custos e despesas operacionais, principalmente em função do Programa de Aposentadoria Incentivada -PAI”.

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Por outro lado, reafirmou seu compromisso em gerar lucros. “A estratégia de crescimento e desenvolvimento da Sanepar, para operar num mercado de serviços está baseada na busca de resultados efetivos, comprometimento com a qualidade dos serviços prestados e principalmente atendimento às necessidades do poder concedente e acionistas”, anota o relatório para o mercado financeiro, enfatizando que a empresa espera ter “um saldo positivo de R$79,5 milhões, que a Sanepar deverá recuperar, via tarifa”.

Presente Natalino e de Aniversário para acionistas

O lucro abaixo do esperado, todavia, é visto como um bom indicativo. É esse o ponto principal apontado pela Corretora Planner aos acionistas: que a aplicação do índice de 9,62% amplie ainda mais a margem de distribuição dos dividendos. Segundo o corretor Victor Luiz de F Martins, a queda no lucro e a estiagem não devem ser barreira para quem quer lucrar com ações da empresa de saneamento porque é “esperada uma melhor precificação com a melhora das condições hídricas, notadamente em 2021, e a retomada dos reajustes tarifários”.

A recomendação não é mera conversa de vendedor. A Corretora Planner tem proximidade com o Governo do Paraná. Ela foi uma das agências habilitadas para concorrer ao leilão da Copel Telecom, representando o grupo Bourdeaux Fundo de Investimentos, que arrematou a empresa de banda larga por R$ 2,395 bilhões e que já havia comprado a Sercomtel Telecom.


Governador Ratinho Junior (PSD), em evento de privatização da Copel Telecom / Rodrigo Félix Leal/AEN

No Relatório de Análise de Investimentos do dia 18 de novembro, portanto, um dia após a divulgação do balanço da Sanepar e das explicações ao mercado financeiro, a Planner sugere que postergado o reajuste tarifário de 2020, a Agepar adotou procedimento de mediação entre Sanepar e Governo do estado. “Esperamos que o reajuste seja retomado em dezembro de 2020", aponta o relatório.

A expectativa foi criada pelo Diretor Financeiro e de Relação com Investidores da Sanepar, Abel Demétrio. Ao responder os questionamentos dos corretores do Credit Suisse, XP Investimentos e acionistas minoritários, afirmou que a Companhia, obviamente, busca o interesse dos acionistas e a reparação da receita do reajuste não aplicado em maio e em outubro.

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“Diante do reajuste de 9,62%, houve a solicitação de mediação por parte do governo do estado à Agepar. Após isso, o período de mediação. A gente acredita que mais tardar em dezembro se tenha uma evolução sobre esse tema. A gente evoluiu bastante", deu pistas sobre o reajuste, Demétrio.

Além do “presente de Natal”, o presente de aniversário também está encomendado para maio de 2021. É quando deve ser aplicado um novo reajuste inclusive repondo as perdas lucrativas deste ano. “Estamos em processo de busca do índice de reajuste tarifário. A Agência já solicitou as informações para o reajuste previsto em 2021. A Agepar deve publicar a tarifa em 15 de abril, mantendo a data-base de reajuste para vigorar em maio. Ela sinalizou que o reflexo da aplicação na data oportuna seria objeto de análise para a próxima revisão tarifária”, projetou Demétrio, enfatizando a aproximação dos interesses dos acionistas com a agência reguladora e destacando a falta de pessoal na Agepar.


Relatório Sanepar / Reprodução

Na última vez que teve reajuste travado pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE/PR), o valor perdido foi recuperado no próximo aumento tarifário, como deixa claro o próprio relatório de resultados do terceiro trimestre de 2020, na página 13: “a Companhia registrou entre novembro de 2019 até o mês de maio de 2020, o faturamento no montante de R$ 82 milhões referente ao reajuste retroativo de 3,76%, finalizando as diferenças de reajuste não aplicado na data base de 2019”. Informação que tranquiliza os acionistas.


Sanepar virou queridinha do mercado financeiro com política de reajuste de tarifas / Rafa Von Zuben/BMF/Bovespa

Sanepar distribuiu mais lucros do que fez investimentos

94% da receita da Sanepar veio principalmente do aumento da tarifa cobrado dos consumidores. É o que aponta relatório do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese-PR). No estudo “Análise dos investimentos da Sanepar – Reajustes tarifários (expressivos) não necessariamente resultam em maiores investimentos”, o economista Fabiano Camargo da Silva argumenta que as tarifas aumentaram de modo expressivo nos últimos anos junto aos dividendos distribuídos para os acionistas, sem que os investimentos fossem ampliados na mesma velocidade e proporção.

Segundo o levantamento, o valor investido entre 2003 e 2010 (R$ 5,4 bilhões) era 6,2 vezes maior do que os dividendos distribuídos para os acionistas (R$ 878,9 milhões), proporção que caiu quase pela metade para 3,2 vezes no período de 2011 a 2018 (R$ 7,4 bilhões investidos em comparação com R$ 2,3 bilhões em dividendos).


Falta de chuvas leva o Paraná a estiagem / Gilson Abreu/ANPr

É, inclusive, o modelo que a empresa adota neste momento, segundo o deputado estadual Tadeu Veneri (PT). A Sanepar está fazendo empréstimo de meio bilhão de reais para enfrentar a crise hídrica de um valor que poderia ser obtido da redução da distribuição dos lucros. “Ela está emprestando para pagar daqui uns anos e assim manter o interesse dos acionistas", critica Veneri.

A explicação para a escolha é a mudança da política de distribuição de dividendos da Sanepar em 2011, elevando os proventos de 25% para 50% do Lucro Líquido Ajustado. Com isso, os acionistas ganharam com o aumento do percentual distribuído e pela lucratividade impulsionada pelos reajustes tarifários.

“A lógica desta política tarifária que gera receitas e lucros cada vez mais expressivos para Sanepar, é somente favorecer os acionistas que já receberam mais de R$ 2,7 bilhões em dividendos nos últimos anos, em detrimento dos trabalhadores e dos consumidores da empresa”, comenta o economista Fabiano Camargo da Silva. Lógica essa que está sendo retomada após a suspensão da tarifa em 2020.

Fonte: BdF Paraná

Edição: Rebeca Cavalcante e Lia Bianchini