A jogadora de vôlei Carol Solberg foi condenada com uma advertência pela 1ª Comissão Disciplinar do Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD) após dizer “Fora, Bolsonaro”, no final de entrevista concedida ao canal SporTV, depois de ganhar o bronze em uma partida da etapa de Saquarema (RJ), do Circuito Brasileiro de Vôlei de Praia, no final do mês de agosto. A atleta ainda não se posicionou oficialmente após a decisão.
O julgamento do STJD do vôlei aconteceu no início da tarde desta terça-feira (13), depois de ter sido adiado na última semana. A decisão foi mais branda do que a denúncia apresentada pela procuradoria do STJD, que havia pedido que a jogadora carioca recebesse penalidade máxima: uma multa de R$ 100 mil e suspensão por seis torneios.
A denúncia havia citado dois artigos do Código Brasileiro de Justiça Desportiva (CBJD). O primeiro deles, o artigo 191, trata sobre a penalização do atleta que deixar de cumprir o regulamento da competição, o segundo, o artigo 258, estabelece penalidade ao atleta que “assumir qualquer conduta contrária à disciplina ou à ética desportiva não tipificada pelas demais regras do código”.
Pelo primeiro artigo, que pedia a multa R$ 100 mil, a penalização foi convertida primeiro em uma multa de R$ 1 mil e depois em advertência. Pelo segundo, que pedia a suspensão de até seis partidas, provas ou equivalentes, a atleta foi absolvida. Os auditores também deixaram claro que Carol não pode voltar a se manifestar politicamente na quadra de jogo. Tanto a procuradoria quanto a defesa podem recorrer ao Tribunal Pleno do STJD.
Sessão
Durante a sessão de julgamento, a jogadora foi questionada algumas vezes pelos auditores do STJD se considerava que sua fala havia provocado algum prejuízo à Confederação Brasileira de Voleibol (CBV) ou aos patrocinadores, como o Banco do Brasil, e se estava arrependida das declarações.
“Não me sinto arrependida, acredito na minha liberdade de expressão. Outros atletas já se manifestaram também. Minha opinião foi contra um governo que sou contra. Conheço as normas e estou certa de que não ofendi nem a CBV, já que a instituição não é partidária e não tem ligação com o governo Bolsonaro. Também não ofendi o Banco do Brasil”, disse Carol, que lembrou ainda que não é beneficiária do Bolsa Atleta.
Advogado de defesa da atleta, Leonardo Andreotti destacou que a conduta de Carol, para que fosse condenada, precisaria infringir a ética desportiva. Ele disse que atos como vitória de uma partida obtida por fraude, menosprezo à vitória do adversário, desrespeito aos árbitros, corrupção, dopping e manipulação de resultados, bem como racismo, violência e atos discriminatórios são exemplos de infração das regras no esporte.
Na votação, o auditor Robson Vieira, também relator do processo, disse que existe um entendimento internacional para se rever a punição de atletas por posicionamentos políticos, mas que a legislação vigente veda esse tipo de manifestação. "Não cabe a mim decidir se essa lei é melhor ou pior", afirmou, acrescentando que a CBV e o Banco do Brasil podem ter tido suas imagens prejudicadas.
Na sequência, o auditor Rodrigo Darbilly acompanhou o voto da relatoria, mas divergiu quanto à aplicação do artigo 191 do CBJD à atleta. O artigo disserta sobre o desrespeito ao regulamento da competição. Já o artigo 258, no qual a jogadora foi enquadrada, trata de "conduta contrária à disciplina ou à ética desportiva não tipificada pelas demais regras deste Código".
O presidente da 1ª Comissão Disciplinar do STJD, Octacílio de Araújo, votou pela condenação da jogadora. Segundo ele, "outros atletas foram denunciados porque falaram coisas diferentes do que ocorreu na partida". Ele citou como exemplo um caso de 2019, em que um técnico e um clube de futebol reclamaram do VAR (árbitro assistente de vídeo).
"O que ela [Carol Solberg] falou naquele momento não faz bem ao esporte", argumentou Araújo, para quem a jogadora se manifestou no local errado.
Os auditores Marcos Bomfim e Gustavo Silveira votaram pela absolvição de Carol. "Não vejo como enquadrar a atleta no artigo 191. Ela não desrespeitou as regras da competição e não houve nenhum tipo de prejuízo aos parceiros, à CBV e aos patrocinadores. Voto pela absolvição", disse Marcos em seu voto.
Repercussão
A fala da atleta teve grande repercussão no noticiário e nas redes sociais ao longo das últimas semanas. No último sábado (10), o Ministério Público Federal (MPF) pediu que a Confederação Brasileira de Vôlei (CBV) e o STJD expliquem a denúncia.
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O MPF questiona também o diferente tratamento que teria sido dado à Carol em relação ao que foi empregado contra os jogadores da seleção masculina de vôlei de quadra, que fizeram o número do então candidato Jair Bolsonaro (sem partido) após um jogo. Não houve punição aos atletas, nem foi apresentada denúncia à época.
No mesmo dia da manifestação da atleta, a CBV emitiu nota repudiando sua postura. No texto, a confederação utilizou o termo racista “denegrir” para dizer que a jogadora “manchou a imagem” da modalidade nacionalmente. Ainda garantiu que tomaria todas as medias cabíveis para punir a atleta.
A Comissão Nacional de Atletas de Vôlei de Praia, presidida por Emanuel Rego, também criticou Carol, avisando que vai lutar pela proibição de posicionamentos do tipo. Emanuel foi embaixador do Banco do Brasil, secretário no governo de Jair Bolsonaro.
Nas redes sociais, perfis extremistas atacaram a atleta e cobraram que o Banco do Brasil retire o patrocínio a ela. Mas, na verdade, ela não é patrocinada pelo banco.
Em seu perfil do Instagram, a atleta se posicionou logo após a repercussão. “Falei porque acredito na voz de cada um de nós. Vivemos em uma democracia e temos o direito de nos manifestar e de gritar nossa indignação com esse governo”, disse.
Em outro post, Carol questionou o porquê de muitas pessoas acreditarem que esporte e política não podem se misturar. “Quem disse que atleta não pode se manifestar politicamente? Quem disse que esporte é só entretenimento? Estamos ali só para correr atrás de uma bola e vivemos alienados do mundo? O atleta não é um cidadão como outro qualquer? Eu acredito que esporte e política devem andar juntos, simplesmente pelo fato de que é impossível dissociar um do outro”, argumentou.
Edição: Jaqueline Deister