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Coluna

A Atualidade de Florestan Fernandes e a crítica ao liberalismo – 1

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Autor desvendou o movimento da burguesia brasileira enquanto classe ao longo da História - Pedro Carrano
Revolução burguesa no Brasil e o fim da colônia ganhou um caráter de contrarrevolução contra o povo

Inicio aqui nesta coluna alguns textos dialogando com análises de Florestan Fernandes, úteis e estruturais para desafios que vivemos nos dias de hoje. Sabe-se que, para o sociólogo e militante Florestan Fernandes, a revolução burguesa no Brasil e o fim da colônia ganhou um caráter de contrarrevolução contra as classes populares.

O processo de fim da colônia e seu estatuto e o início da transição para uma sociedade de mercado, chamada pelo autor de “ordem social competitiva” foi um processo imposto de fora, sob o ritmo de fora, e no caso brasileiro sem uma burguesia que, enquanto classe social, estivesse disposta a alargar seus horizontes democráticos.

Nesse processo de consolidação de expansão e diversificação do mercado, o processo de concentração de poder se mantém estreito. Não se vive no Brasil, reconhece Florestan, um momento democrático. A ordem social competitiva mantém questões que permanecem da aristocracia agrária. O mercado, mesmo após o rompimento com a metrópole, busca uma heteronomia controlada e em nenhum momento se abre à integração e, por outro lado, à autonomia nacional.

Seguimos controlados de fora, porém ao fim da colônia e início do império o senhor agrário se adapta, e a classe burguesa absorve características do período anterior: escravismo, patrimonialismo, mandonismo, estamentos sociais e privilégios de classe, enquanto o poder e a terra seguem concentrados. Com isso, temos a concentração e a limitação do mercado interno de massas – que seria resultante de uma reforma agrária que não ocorre em nossa realidade. A escravidão foi abolida apenas décadas mais tarde da instalação do império e independência, porém sem que a força de trabalho da população negra fosse absorvida por esse mercado em crescimento.

Esse processo, chamado por Fernandes de uma revolução burguesa dentro da ordem, é uma revolução limitada, sufocada, e quero destacar um debate pautado ainda nos dias de hoje e que para Florestan tem uma raiz impossível na realidade e história brasileira: o liberalismo surge em nosso processo histórico como um discurso geral, mas que encobre a restrição de direitos e de participação política por parte de uma sociedade civil, nas palavras de Florestan, que não acessa direitos e espaço político.

Conhecemos esse processo até hoje. Quantas vezes, afinal, a burguesia brasileira, por meio dos meios empresariais de comunicação, fala em nome do povo, da nação, do país, para defender na realidade seus privilégios?

Vemos em Florestan:

“Doutro lado, esse fato também explica como as formas de poder político, criadas através da implantação de um Estado nacional, foram assimiladas pelos estamentos senhoriais e convertidas, desse modo, em dominação estamental propriamente dita. As normas constitucionais que regulavam os direitos de escolha e representação, através das eleições primárias e das eleições indiretas, bem como o poder de decisão inerente aos diferentes mandatos eletivos e a possibilidade aberta ao poder moderador de recrutar ministros e conselheiros de Estado entre deputados e senadores, condicionavam uma tal concentração de poder político no nível dos privilégios senhoriais, que ‘sociedade civil’ e ‘estamentos sociais dominantes’ passaram a ser a mesma coisa. De fato, não só o grosso da população ficou excluído da sociedade civil. Esta diferenciava-se, ainda, segundo gradações que respondiam à composição da ordem estamental”, página 59.

Edição: Lia Bianchini