Frequentemente leio matérias que trazem declarações de pessoas a respeito dos possíveis benefícios que a privatização dos Correios poderia trazer para o comércio eletrônico brasileiro. Desconheço a motivação das pessoas que fazem essas declarações e sempre me espanto com elas, pois não vislumbro um único benefício que poderia advir dessa eventual privatização para estes players e, por outro lado, enxergo uma série de riscos que me parecem muito concretos, os quais tratarei neste artigo.
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Inicialmente, é importante mencionar que o mercado de transporte de encomendas é totalmente livre no Brasil. Assim, há milhares de transportadoras de todos os portes atuando no país. Os Correios, apesar de serem o principal desses operadores, são apenas mais uma opção à disposição das empresas de comércio eletrônico, não havendo nenhum monopólio ou reserva de mercado.
Então, qual seria a vantagem de se retirar do mercado uma das opções existentes?
Ou então qual a vantagem de o controle dessa empresa passar a ser de um dos privados que hoje já opera ou pode operar no mercado? Como isso pode resultar em algum benefício para quem envia encomendas?
A resposta óbvia é que não há vantagem aí. Menos oferta leva a maior preço. E, se o privado hipoteticamente pode praticar um preço menor que os Correios, por que já não o faz agora, considerando que tem total liberdade de atuação? Por que será que na imensa maioria dos casos, os fretes dos Correios são os mais econômicos nas lojas virtuais?
No mundo todo, os processos de privatização de correios sempre levaram a aumento de preços e a redução de rede de atendimento. Aqui não será diferente. E isso não é bom para os operadores de comércio eletrônico, principalmente para as menores que dependem mais dos serviços postais.
Na atualidade, qualquer empreendedor pode lançar seu e-commerce e já começar vendendo para o Brasil todo, utilizando os Correios, com suas opções de encaminhamento normal (PAC) e expresso (Sedex). Se preferir, pode usar outros transportadores para determinados destinos em que isso for mais conveniente. É uma situação muito favorável, em que a utilização dos serviços dos Correios é sempre uma opção à mão, inclusive para os pequenos, mas não uma obrigação.
A pandemia acelerou o comércio eletrônico e incrementou o surgimento de novos entregadores.
Isso é bom para os operadores, que possuem agora ainda mais opções no mercado. Mesmo assim, os Correios continuam sendo muito importantes pela inigualável capilaridade de seus serviços, pelos preços competitivos em muitas situações e pela regularidade de suas operações. Mexer nisso só faria sentido se faltasse capilaridade à rede dos Correios ou se seus preços fossem exorbitantes, duas coisas que efetivamente não acontecem.
Como principal transportadora do comércio eletrônico brasileiro, os Correios têm certamente muito a melhorar. Isso é inegável. Mas também é inegável a importância da presença dos Correios nesse mercado, assim como o fato notório de que qualquer concorrente que se julgue melhor pode se estabelecer e prestar seus serviços livremente.
Não faz, portanto, nenhum sentido imaginar que a privatização dos Correios possa ser positiva para o comércio eletrônico brasileiro.
Não será. Os únicos beneficiados se essa intenção se materializar serão outros, que intermediarão ou participarão de um negócio bilionário de transferência de um patrimônio público extremamente valioso a preço de liquidação, ou que dividirão o bolo das entregas sem a concorrência dos Correios, podendo praticar preços maiores. Assim, se você opera no comércio eletrônico, desconfie de quem prega que a privatização dos Correios lhe será favorável, pois não será.
*Marcos César Alves Silva é vice-presidente da Associação dos Profissionais dos Correios (ADCAP).
Edição: Mariana Pitasse