O aumento do preço do arroz e de outros alimentos básicos voltou às manchetes. Mais que os vaivéns da inflação, a política – ou a falta de política – ajuda a explicar algumas situações. Algumas altas podem ser atribuídas, também, a fatores como a ênfase dada ao agronegócio e o descaso com a segurança alimentar. O que se viu desde o início do atual governo: um dos primeiros atos foi extinguir o Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea).
No caso do arroz, o aumento acumulado neste ano, até agosto, é de 19,17%, segundo o INPC-IBGE – que, por sua vez, soma 1,16%. Segundo o Dieese, que faz acompanhamento em 17 capitais, o preço médio do arroz agulhinha teve alta em 15 capitais no mês passado. De acordo com o instituto, essa elevação “se deve à retração dos produtores, que aguardam melhores preços para comercializar o cereal e efetivam apenas vendas pontuais”.
Pauta de exportação
Um dos produtos mais básicos na mesa do brasileiro, o arroz parece estar mais presente na pauta dos exportadores do que na produção local. Enquanto o vice-presidente Hamilton Mourão oferece como “explicação” um aumento da demanda causado pelo auxílio emergencial, a realidade mostra que tem sido mais negócio vender para outros países.
Apenas em agosto, as vendas ao exterior cresceram 93% sobre igual período do ano passado. E já se fala em recorde neste 2020, segundo a Cogo, consultoria especializada em agronegócio.
Outro fator é a área de plantio. De acordo com o Levantamento Sistemático da Produção Agrícola (LSPA), do IBGE, em 10 anos, até julho, a área plantada de arroz no Brasil encolheu 39,5%, de 2,8 milhões para 1,7 milhão de hectares. No mesmo período, a área da soja cresceu 58,3%, para 36,9 milhões de hectares.
A economista Patrícia Costa, do Dieese, observa que alguns produtos têm oscilações intensas, especialmente os in natura, que precisam ser consumidos logo. Ela também aponta fatores como exportação e clima. “Essa estiagem às vezes não é boa para os produtos.” E vê com preocupação algumas notícias de que alguns mercados estão limitando vendas. “Vamos ter problemas se as pessoas começarem a estocar.”
Política de governo
Além disso, ela ressalta a prioridade dada ao agronegócio e a redução da área plantada de vários produtos, o que também leva ao atual aumento do preço dos alimentos. “Vai faltando política de governo, política de segurança alimentar. Tem uma Conab (Companhia Nacional de Abastecimento) que não está mais mantendo estoques mínimos, reguladores. E quem sofre mais é quem já está sofrendo com a pandemia, o mais pobre”, observa.
“Quem está pagando a conta mesmo é a família de baixa renda”, acrescenta Patrícia. Aliás, vem pagando várias contas, lembra a economista: antes da pandemia, sofreu com a alta do gás. Agora, com falta de uma política de alimentação.