O mês de agosto se tornou simbólico para que a sociedade dialogue e reconheça a importância da amamentação e aleitamento materno não só no Brasil, mas em todo o mundo. Este ano com a pandemia da covid-19, o "Agosto Dourado" como é conhecida a ação, apesar de ter um formato modificado, continua com o mesmo foco: estimular o aleitamento e amamentação.
O tema deste ano será: apoie o aleitamento materno, por um planeta saudável. O objetivo é analisar o impacto da alimentação infantil no meio ambiente e também pensar formas de proteger, promover e apoiar o aleitamento para a saúde das pessoas em todo o planeta.
O Brasil de Fato convidou a Coordenadora do Banco de Leite Humano do Instituto Nacional de Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente Fernandes Figueira, Daniele Aparecida da Silva, especialista no assunto, para falar desse ato tão importante.
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Confira a entrevista completa:
Brasil de Fato: Quais são os benefícios da amamentação para vida das crianças?
Daniele Aparecida da Silva: Os benefícios são inúmeros e não só para vida das crianças, mas como bem destaca o tema da semana mundial, esse benefício vai refletir para a vida adulta, para a mãe desse bebê, a família e, consequentemente, para a sociedade.
No primeiro momento, a criança amamentada recebe os fatores de proteção da mulher. O leite humano, que pode ser considerado uma vacina. Ele vai prevenir doenças típicas da primeira infância: diarreias, otites, infecções pulmonares e , no longo prazo, contribuir para menor incidência de diabetes e cardiopatias.
Além disso, enquanto a mãe amamenta ela vai criando vínculo e desenvolvendo o crescimento afetivo da criança. Para a mulher, a amamentação ajuda na diminuição da incidência de câncer de mama e no retorno da involução uterina e lógico, outros produtos têm um custo. O leite humano não tem custo, então para a família também há ganhos.
Existe diferença entre aleitamento materno e amamentação?
Na amamentação, a mulher está dando peito diretamente ao lactente, ela está com ele no colo, amamentando. O aleitamento materno é quando a gente procura uma outra forma de expressar esse leite, então, ele pode ser oferecido em um copinho ou uma colher a esse bebê.
A gente orienta evitar a mamadeira ou outros tipos de bicos, porque ele vai causar um confundimento, que pode levar a um desmame. Então, se você pode amamentar o seu filho, amamente.
Agora se a mulher teve um bebê prematuro, vai voltar a trabalhar ou precisa ir ao médico e quer deixar o leite para o seu filho, ela pode retirar esse leite e orientar a pessoa que vai dar o leite para o bebê, por colher ou copinho.
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Quais são as melhores formas de a mulher garantir que o bebê receba o leite por mais tempo, já que as dificuldades são muitas?
A primeira coisa que a mulher tem que ter é informação, correta e precisa. Essa é a primeira coisa que eu falo, desde a gestação: procure as informações corretas.
Depois no decorrer do tempo, ela já tem que ir pensando: quem é ela na sociedade? É uma mulher que ela trabalha em uma empresa? Que valoriza a licença maternidade? É autônoma? Não vai poder parar?
Isso também é algo para ser pensado já na gestação, qual é a opção da amamentação? Se ela tiver a informação correta, 15 dias antes de voltar a trabalhar, ela já começa a estimular essa produção fazendo massagem e guardando o leite em frascos.
Ela também pode perguntar para o pediatra mais ou menos quanto o neném deve mamar, naquela faixa etária, levando em conta que esse leite, se ela congelar, vai ter duração de 15 dias e uma vez descongelado tem duração de 12 horas, sob refrigeração.
Se ela sai de manhã, antes de trabalhar, ela pode oferecer o seio. Depois de duas ou três horas, o neném vai se alimentar novamente e quem está cuidando descongela esse leite e mantém o resto sob refrigeração. Vai fazendo isso durante o dia até o retorno dessa mulher.
Eu chamo a atenção mais ainda para o fato de que muitas vezes as mulheres conseguem a licença de quatro meses e colocam o bebê na creche. Estas também poderiam ter a responsabilidade de apoiar a mulher, receber o leite materno e oferece-lo durante a jornada em que o bebê fica lá. Ou seja, a informação é uma grande aliada para gente evitar o desmame.
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Há um senso comum com relação à amamentação de que a mulher, muitas vezes, não tem leite suficiente para alimentar o bebê e ele acaba chorando muito. Assim, essa mulher precisar complementar com uma fórmula. Queria que tu esclarecesse essa informação.
Não é que o leite não supra, que o choro seja sempre fome. Não é culpa da mulher. Muitas vezes essa mulher espreme um pouquinho do seio e acaba vindo um leite mais clarinho. A gente tem que pensar que a formação, a fábrica do leite primeiro vai ter esse mais clarinho, mas não quer dizer que ele não vai alimentar, pelo contrário.
Primeiro, ele vai matar a sede e depois vai proteger. É nesse leite mais clarinho que estão esses fatores de proteção, e se você continuar com curiosidade e ir extraindo assim o leite, ele vai se tornar uma forma mais densa.
Ao final da mamada ele vai estar bem denso, ou seja, só no final da mamada vem a gordura do leite, porque essa criança primeiro mata a sede, depois ela se alimenta e no final vem a energia, vem a gordura para que esse bebê ganhe peso.
Muitas vezes você tem um bebê recém nascido, ele chora e todo mundo acha que é fome. Antes de pensar que é fome, vale verificar a fraldinha, se ele não está muito agarradinho, se algo não está incomodando.
Depois, coloque o bebê no seio e deixe ele sugar à vontade. Não precisa seguir à risca aquela história de cinco minutos em cada seio. Esse bebê precisa esgotar o seio todo para se satisfazer, passar por todas as fases do leite. Então permita, quando ele soltar o seu seio, coloque o bebê para arrotar e ofereça o outro. Se ele não quiser, quer dizer que ele está satisfeito.
A gente precisa lembrar também que depois que o bebê nasce, na primeira semana de vida, ele tem uma perda de peso natural de até 10% do seu peso. Então, nessa primeira semana é bom que se diga para a mãe que a perda é natural, o bebê desinchou.
Isso porque ele vivia em um meio aquoso, então, absorvia toda essa água. Aqui fora não há mais esse meio líquido. Então, calma e perceba antes de dizer: – meu bebê berra de fome. Observe os outros sinais. Ele não sabe falar e, nesse começo, lembre que ele tinha o cordão umbilical ligado à mãe, ele comia a hora que queria, não a hora que gente imagina que ele quer.
Nesse começo recomendo oferecer o seio mais vezes por dia. Não quer dizer que o seu leite seja fraco, mas é uma necessidade do bebê. Depois de um tempo a amamentação vai se espaçando, os horários vão se tornando mas fixos e você vai perceber que a criança vai ganhando peso.
Como está a questão da doação de leite humano com relação à covid?
Da mesma forma que a gente sempre tratou. A higiene sempre foi um pré-requisito dentro dos bancos de leites. Inclusive, independente da pandemia, orientamos a mulher doadora a lavar bem as mãos até o cotovelo, proteger a boca e o nariz pra evitar as gotículas e prender os cabelos antes da coleta.
Isso a gente sempre exigiu. Durante esse tempo, alguns bancos de leites mantiveram a coleta domiciliar, ou seja, foram à casa da mulher buscar a doação.
Para que essa mulher seja seja doadora, não precisa sair de casa. Nossos coletores, os profissionais de saúde, estão levando álcool em gel, luvas e máscaras.
Falamos em visita domiciliar, mas a gente não entra na casa da pessoa. Chegamos na porta, solicitamos o frasco cheio e entregamos o material esterilizado.
Nesse tempo, conseguimos informar as nossas doadoras, as mulheres que buscam os bancos de leite e com isso as nossas doações não caíram.
Lógico que no comecinho da pandemia caiu um pouco, mas a gente conseguiu retomar e manter. Em alguns casos tivemos, inclusive, aumento de até 20% da coleta.
Como está a programação do Agosto Dourado esse ano?
Não teremos nenhum evento presencial. Todos estão disponíveis no rblh.fiocruz.br. Nós tínhamos feito o mesmo no Dia Mundial de Doação de Leite Humano, em Maio. Agora estamos nos especializando e o melhor disso tudo é a possibilidade de trocar conhecimento e experiências com outras regiões, aprendendo mais da cultura local, mais da informação e ver como está o aleitamento materno naquela região. Então, é grande oportunidade também de a gente ter essas comemorações via internet.
Edição: Rodrigo Durão Coelho