Rio Grande do Sul

Coluna

Como abordar o problema do fascismo?

Imagem de perfil do Colunistaesd
Foto tirada em Viena, 1927. Wilhelm Reich (marcado por uma circunferência branca) engajado nas questões sociais de seu tempo - https://www.psychorgone.com/tag/orgonon
Um trabalho de higiene mental precisa defender a necessidade de uma vida sexual satisfatória

Para Wilhelm Reich, o papel da ciência é o de orientar a sociedade acerca das questões básicas e fundamentais da vida, de forma que as instituições possam agir de maneira racional – isto é, de acordo com os princípios vitais – na condução e organização dos processos sociais. Nesse sentido, em se tratando do fenômeno do fascismo, ele pensava que somente a partir de uma compreensão correta a respeito do tipo de distorções bioenergéticas em que este último estava baseado, seria possível traçar diretrizes para um trabalho de higiene mental de massas.

Reich concluiu que uma política de higiene mental antifascista demandaria, necessariamente, um trabalho de amplo esclarecimento da sociedade a respeito do funcionamento da sexualidade natural, como esforço educativo que pudesse refrear o medo generalizado do encontro genital, ancorado corporalmente na população por meio de couraças de toda a sorte. Para ele, uma consciência sexual clara e uma regulação natural da vida sexual poderiam erradicar as raízes do misticismo, do fascismo e da irracionalidade social, que marcam nosso desenvolvimento histórico. Nos artigos anteriores, tratei de detalhar a relação que Reich constatou entre a repressão sexual e as tendências emocionais e psíquicas a aderir a comportamentos e movimentos fascistas.

Um trabalho de higiene mental precisa defender abertamente a necessidade de uma vida sexual satisfatória. É preciso inserir o problema sexual das massas humanas na discussão mais ampla sobre questões sociais e políticas. Para isso, é necessário também superarmos socialmente a predominância da moralidade compulsiva que, como vimos, cria a sexualidade distorcida cujo controle ela considera ser sua tarefa: a abolição desse tipo de moralidade é uma condição prévia para a abolição da imoralidade que ela se esforça, em vão, por eliminar.

Seria papel de um trabalho sério de higiene mental o de canalizar o extraordinário interesse populacional pela sexualidade para o domínio científico e racional, de modo a oferecer informações fidedignas, claras e simples a respeito desse tema, de sua importância biológica, psíquica e emocional para a espécie humana e dos efeitos catastróficos da repressão sexual tanto para os indivíduos quanto para as sociedades. É importante mencionar que, no contexto em que vivemos, o interesse pela sexualidade acaba sendo destinado, de maneira mais ou menos escondida, à pornografia, às fantasias ou a fofocas e escândalos sexuais.

Como importante contribuição social deixada por Reich nesse sentido, menciono brevemente o movimento das Sex-Pols, as Organizações Sexo-Políticas. Nestas ele, junto com um pediatra, um ginecologista e uma professora da escola de enfermagem, dirigiram uma van entre os subúrbios e zonas rurais de Viena durante a primavera e verão de 1928 e 1929. Seu objetivo era conversar com a população trabalhadora sobre assuntos sexuais, gravidez e contracepção, com base na teoria do orgasmo (leia também o artigo acerca da potência orgástica que pode ser consultado para mais informações sobre a teoria do orgasmo).

Ao fim do dia de conversas com a população, Reich dava palestras que tinham o objetivo de ligar as questões individuais imediatas relativas à sexualidade com questões políticas mais amplas: a população não poderia ter uma vida sexual satisfatória sem uma política de habitação que oferecesse casas adequadas para todos, de modo que as famílias trabalhadoras não precisassem mais habitar um único cômodo, por exemplo.

Em janeiro de 1929, além disso, foram abertas clínicas de higiene sexual e pesquisa sexológica fundadas por Reich em vários distritos de Viena. Todas eram dirigidas por médicos colaboradores e tinham como objetivo disponibilizar informação e consultoria em assuntos sexuais à população mais pobre. Semelhantes instituições foram abertas por Reich também em Berlim, quando ele se mudou para lá.

“A reação política nunca será capaz de contrapor à Economia Sexual revolucionária um programa reacionário de política sexual que vá além da total repressão e negação da sexualidade” (Psicologia de Massas do Fascismo). Com essa frase Reich exprime a potencial vantagem da Economia Sexual em relação às políticas reacionárias, que não podem oferecer nada além de repressão sexual como ferramentas de integração social.

As pessoas precisam urgentemente tomar conhecimento do alcance dos danos sociais e individuais causados pelo processo coletivo de encouraçamento, que tem a repressão da sexualidade como viga mestra. As doenças emocionais, as crises sociais, o fascismo e a destruição do meio ambiente são os produtos mais graves de todo esse processo de distorção do funcionamento vital no animal humano.

Descrição da imagem: trata-se de uma foto em preto e branco, tirada em Viena, em 1927. Wilhelm Reich (que está marcado por uma circunferência branca na foto) está ao lado de um grupo de simpatizantes do Partido Comunista. No grupo podemos ver homens e mulheres. Eles estão na frente de um edifício e abaixo de algumas faixas antifascistas, escritas em alemão.

Edição: Katia Marko