Na última segunda-feira (10), acabou a quarentena no Haiti. Iniciada em 18 de março passado. Foram, portanto, quase cinco meses em que governo do presidente Jovenel Moïse atuou na tentativa de conter o avanço da covid-19 no país. Em números de casos, o Haiti tem 20.023 casos em investigação, 7.649 casos confirmados e 183 pessoas que já morreram em decorrência da pandemia.
É possível que esses números sejam reais? É possível que o Haiti, um dos cinco países mais pobres do mundo, tenha conseguido se proteger da pandemia?
O que é possível afirmar, é que, em cinco meses, desde o anúncio da primeira morte no país por covid-19, ocorreram protestos por direito ao auxílio saúde e proteção prometidos pelo governo, para que as pessoas pudessem ficar em casa. Aconteceram também manifestações de feirantes que se recusaram a parar de trabalhar por não terem outra forma de renda. As feiras do país são o lugar com a maior aglomeração de pessoas e manifestações, incluindo greves de policiais por melhores condições de trabalho e segurança, por estarem encontrando dificuldades no enfrentamento das gangues existentes no país.
Nesse quadro de pandemia, movimentos sociais do Haiti, sindicatos de trabalhadores, professores, a classe trabalhadora do país, incumbiram-se da tarefa de proteção à vida, fazendo o trabalho de sensibilização e solidariedade à população, e sendo a voz de denúncias contra o governo nesse período.
Assim, durante a quarentena, houve manifestações e protestos contra o governo. Com o fim da quarentena, obviamente, inicia-se uma nova onda de protestos por todo o país, diante do governo de Jovenel Moïse. Com a covid-19 como importante “aliada”, ele está determinado a desprezar a população, se colocando em uma bolha, longe da verdadeira realidade do povo haitiano.
Exatamente no dia 10 de agosto, dia do término da quarentena, em frente ao anexo do Ministério de Educação Nacional e Formação Profissional, localizado na avenida Martin Luther King, na capital Porto Príncipe, vários sindicatos e movimentos sociais denunciaram a irresponsabilidade do ministro Pierre Josué Agénor Cadet em retomar as atividades escolares, sem consultar a sociedade haitiana. A manifestação também reivindicou melhores condições de trabalho para os professores.
"Não temos problema para a reabertura das aulas, já prevíamos isso, mas é necessário que planejemos em perfeita colaboração com os diferentes atores do sistema educacional", diz o professor Josué Mérilien, coordenador geral da União Nacional dos Normalistas Haitianos (UNNOH).
Este último reivindica um salário razoável para os professores, porque, segundo ele, não é normal que um professor tenha menos de US$ 100 (equivalentes a cerca de R$ 537) por mês como salário em comparação com os US$ 5 mil (quase R$ 27 mil) que o Estado desembolsa para pagar o aluguel mensal da residência do ministro Pierre Joshua Agéner Cadete.
Nos cartazes, pôde-se ler as seguintes mensagens: "Kile lekòl ki nan katye popilé yo ap louvri"? ("Quando vão abrir escolas em bairros populares?"), "pa gen lekòl san sekirite!" ("Não tem escola sem segurança"), para apontar alguns exemplos. A situação de insegurança e violência que passa o país também estavam no centro dos protestos.
Em uma situação em que a insegurança está a todo vapor, a precariedade chegou ao topo. O que podemos esperar nos próximos dias em que os conflitos sociais se aprofundam? O Estado haitiano está ciente da dimensão da crise para entrar no processo de reabertura das atividades escolares no país? De qualquer forma, o futuro dirá.
*A Agência de Imprensa Popular Haitiana (Ajans Pres Popilè Ayisien) contou com a colaboração da Brigada Internacionalista Jean Jaques Dessalines.
Edição: Rodrigo Durão Coelho