Articulação

Oposição pede a Maia prioridade para votar PL que suspende despejos durante pandemia

Movimentos populares e parlamentares se reuniram com o presidente da Câmara; Bolsonaro já vetou tema em outro PL

Brasil de Fato | Fortaleza (CE) |

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Pressionado pela presença de representantes dos movimento populares, Rodrigo Maia (DEM-RJ) se comprometeu a dialogar com os líderes das bancadas na Câmara - Divulgação

Em encontro virtual com o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), nesta segunda-feira (10), parlamentares do PT e do PSOL se somaram a representantes de movimentos populares para pedir rápida aprovação do Projeto de Lei (PL) 1975/2020, das oposicionistas Natália Bonavides (PT-RN) e Rosa Neide (PT-MT), que tenta evitar ações de despejos durante a pandemia.

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“Foi uma reunião positiva porque a participação dos movimentos nos ajuda a pressionar Maia a colocar o tema na pauta. O presidente se comprometeu a dialogar com os líderes para saber o posicionamento das bancadas, o que é importante para a nossa estratégia de mobilização e convencimento. Essa sondagem é importante para construirmos o texto que irá ao plenário”, disse ao Brasil de Fato o coordenador da Frente Parlamentar Mista em Defesa da Democracia e dos Direitos Humanos, Marcelo Freixo (Psol-RJ).

Maia não se pronunciou após o encontro, em que não teria dado garantias de colocação do tema em votação, segundo as fontes ouvidas pela reportagem. Na Câmara, pelo menos 21 propostas tratam do assunto e tramitam de forma conjunta com o PL 1975, que já teve o regime de urgência aprovado pelo plenário.

O Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra (MST) levanta a preocupação com o ritmo em que a política nacional tem levado o tema: primeiro projeto de lei sobre o assunto, o PL 827/2020, de autoria deputado André Janones (Avante-MG), foi protocolado na segunda quinzena de março.

Estamos numa pandemia terrível, com despejos marcados, com violência acontecendo a todo tempo.

Já a primeira medida analisada e aprovada pelo Congresso, o PL 1179/2020, saiu do Legislativo com destino à sanção presidencial no mês de maio, mas teve o conteúdo vetado por Jair Bolsonaro (sem partido) em junho, o que deixou o tema à deriva em meio à crise política e sanitária do país.

“É lamentável,  porque nós estamos numa pandemia terrível, com despejos marcados, com violência acontecendo a todo tempo, com mais de 100 mil mortes no Brasil pela covid-19. O despejo, neste momento, é um crime. Vai contra tudo e contra todos, dos pontos de vista do cuidado com a saúde e humanitário”, avalia o dirigente nacional do MST Alexandre Conceição, sublinhando ainda que o contexto da pauta reforça o coro da entidade pelo impeachment de Bolsonaro.  

“A emergência do tema é porque tem uma ofensiva do outro lado, negacionista, bolsonarista, de fazer despejo à revelia dos direitos das famílias. Por isso nós entendemos que o Maia deveria também avaliar os pedidos de impeachment. Com o atual presidente no poder, entendemos que as coisas não vão mudar muito”, acrescenta Conceição.

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Despejo Zero

Tecnicamente, o PL 1975/2020 propõe a suspensão do cumprimento de medidas judiciais, extrajudiciais e administrativas que resultem em despejos, desocupações ou remoções forçadas durante o estado de calamidade, que vigora no país até 31 de dezembro deste ano.

Somente no estado de São Paulo, por exemplo, foram registradas 4.018 ações de despejo liminar entre 20 de março e 20 de maio deste ano, primeiro bimestre da pandemia. Os dados são do Tribunal de Justiça de São Paulo e foram publicados pelo site Yahoo, que obteve a estatística por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI).

Infelizmente, as remoções estão acontecendo o tempo todo.

Para tentar ampliar a audiência em torno do tema, as entidades populares envolvidas na articulação política junto ao presidente da Câmara decidiram, esta semana, pela criação de um comitê que irá fortalecer a campanha “Despejo Zero”, que vigora desde julho e pede políticas de habitação para a população do campo e da cidade.   

“Essa campanha tem um conjunto de ações e também  a questão de dar visibilidade porque, infelizmente, só aqueles despejos mais famosos, que têm conflitos ou até perda de vidas, violência, é que ficam conhecidos, mas, infelizmente, as remoções estão acontecendo o tempo todo. Então, a campanha e o comitê são pra dar uma visibilidade e sensibilizar a sociedade porque nós precisamos tratar esse assunto com mais seriedade”, afirma a militante Eveniza Rodrigues, da União dos Movimentos de Moradia de São Paulo (UMM).

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Bastidor

Nos bastidores da Câmara, o assunto é visto pelos parlamentares da oposição com mais otimismo em relação a outras demandas populares, pelo fato de a Casa já ter aprovado um projeto sobre o tema. O PL 1975, no entanto, precisará, assim como todas as medidas que chegam ao plenário, passar por um crivo coletivo.

Freixo aponta que a maior resistência vem da direita liberal, um guarda-chuva que abriga diferentes legendas e deputados. O discurso do grupo é o de que a proibição dos despejos interfere indevidamente nos contratos. “Mas é possível construir um projeto de consenso para que possamos votar a matéria”, acredita o psolista.

Sobre o risco de a medida ser aprovada e acabar tendo um destino semelhante ao do PL 1179/2020, vetado pelo presidente, o parlamentar acredita que para reduzir essa possibilidade é preciso fortalecer o diálogo entre todos os grupos da Casa.  

“Nós temos que construir um projeto que contemple a maioria das bancadas, que seja uma proposta do Parlamento, não somente da oposição, porque, se Bolsonaro vetar novamente o texto, nós teremos força política para derrubá-lo”, encerra.

Edição: Rodrigo Chagas