Rio de Janeiro

Desigualdade

Artigo | Crise para quem?

Enquanto trabalhadores perdem emprego e se arriscam nas ruas, bilionários brasileiros aumentam renda em plena pandemia

Brasil de Fato | Rio de Janeiro (RJ) |
comércio Rio de Janeiro
Segundo relatório da Oxfam, 40 milhões de pessoas devem perder o emprego e 52 milhões vão entrar na faixa de pobreza na América Latina e Caribe em 2020 - Tomaz Silva/Agência Brasil

Enquanto o Brasil vive uma grave crise econômica, social e de saúde, bilionários brasileiros veem suas riquezas crescerem. Dados da Oxfam - organização que atua em diversos países e que analisa as desigualdades sociais locais - informam que no Brasil, 42 super ricos aumentaram suas fortunas em US$ 34 bilhões durante a pandemia, passando de US$ 123,1 bilhões para US$ 157,1 bilhões.

A pandemia já infectou mais de 2.610.102 pessoas, com mais de 91.263 mortos no Brasil, até a última quinta-feira (30) - esses números são maiores a cada dia. Também são vítimas dessa crise milhares de trabalhadores que perderam o emprego e a renda. O relatório da Oxfam apresenta uma estimativa de que 40 milhões de pessoas devem perder o emprego e que 52 milhões vão entrar na faixa de pobreza na América Latina e Caribe em 2020.

Comércio lidera fechamento de vagas

O desemprego já cresceu em 2020 e já atinge mais de 12 milhões de pessoas - o equivalente a 12,4% da população ativa. Entre jovens de 18 a 24 anos, os números alcançam 27%, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).  O comércio liderou o fechamento de vagas neste ano. Entre janeiro e maio, foram menos 446 mil empregos formais, conforme o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged). Só em abril o saldo foi de menos 280.716 empregos. Já o estado do Rio de Janeiro perdeu 55.517 vagas no mesmo período. Na cidade do Rio, o saldo negativo é de 17.268 vagas.

Leia mais: "Reabertura rápida e intensa pode levar a sobrecarga de leitos", alerta pesquisador

A situação é ainda pior para os trabalhadores informais. Nesse momento, 33% dos comerciários estão nessa situação, o que representa cerca de 5 milhões de trabalhadores, segundo o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), vivendo em uma situação total de precariedade e insegurança, sem carteira assinada, trabalhando por conta própria ou como autônomos, sem qualquer proteção da Previdência Social.

Para os que permanecem com a carteira assinada, a Medida Provisória (MP) 936, transformada em Lei 14.020, provocou perda na renda e suspensão de contrato.

Dos cerca de 10 milhões de trabalhadores que foram pegos pela mudança, aproximadamente 2,5 milhões são do comércio, ficando atrás somente do setor de serviços - com 3,8 milhões trabalhadores atingidos. Os dois setores foram fortemente impactados por conta das medidas de isolamento, que obrigaram as lojas a fecharem as portas durante alguns meses.

A forma como os governos vêm tratando a pandemia piora ainda mais a situação nacional, sem medidas mais efetivas de isolamento para conter a proliferação do vírus, como orientam as autoridades de saúde.

Também faltam medidas de proteção ao emprego e à renda, além de ações para a retomada do consumo e da indústria nacional. Pequenas empresas têm encontrado dificuldades para conseguir o acesso ao crédito, muitas com o pedido negado, pelos bancos, até mesmo por já terem alguma pendência financeira.

Além disso, há reclamações com a demora na liberação dos recursos, quando cada dia é vital para a manutenção do empreendimento. O programa de apoio às micro e pequenas empresas (Pronampe) precisa agilizar e desburocratizar o acesso a esse crédito especial, essas empresas são responsáveis por 52% dos trabalhadores com carteira assinada no setor privado.

Soma-se a essa crise a redução de investimentos públicos, a falta de hospitais, de um transporte público adequado, entre outros pontos que seriam fundamentais para o momento. Podemos ainda ter o segundo semestre de 2020 pior, pois além do desemprego, alguns estados talvez encarem o que seria uma segunda onda da pandemia.

Em um momento que volta a se discutir a reforma tributária, é preciso que os mais ricos deem sua contribuição. Taxar as grandes fortunas no Brasil, algo já previsto na Constituição Federal, mas nunca regulamentada, poderia ajudar o país a sair dessa crise. Atualmente, vários projetos sobre esse tema estão no Congresso. Através desse imposto poderiam ser arrecadados mais de R$ 40 bilhões, por ano, dependendo da alíquota a ser aprovada. Por outro lado, é importante reduzir o imposto sobre o consumo de bens de primeira necessidade, produtos de uso sanitário e da cesta básica familiar.

Por último, uma notícia do Portal UOL chamou atenção: “Crise? Como a Porsche bateu recorde de vendas no Brasil em plena pandemia”. A matéria informa que a venda desses carros de luxo também cresceu na pandemia. Esse é um dado surpreendente e como dito lá no começo, a crise não chegou para todos e nem atingiu cada um da mesma forma. Enquanto uns passeiam nos seus carrões, nossa preocupação é que o país tome medidas para manter a renda e o emprego e crie novos postos de trabalho para os brasileiros.

*Márcio Ayer é Presidente do Sindicato dos Comerciários do Rio de Janeiro, Miguel Pereira e Paty do Alferes.

Edição: Mariana Pitasse