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Dez critérios marxistas para a definição do bolsonarismo como neofascista

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As relações de Bolsonaro com as Forças Armadas e as polícias, e os choques permanentes com os Tribunais Superiores e Congresso, confirmam a tentação bonapartista - Marcos Corrêa / Fotos Públicas
O projeto político de Bolsonaro é um autogolpe para a instalação de um regime bonapartista

Os modelos teóricos para classificar o neofascismo podem ser vários. Eis um esboço de dez critérios para a compreensão do bolsonarismo: (a) a origem social de seus líderes; (b) a trajetória do movimento; (c) a sua base social e a dimensão eleitoral de sua audiência; (d) o que defende: sua ideologia ou programa; (e) o projeto político; (f) a posição diante do regime político, ou a relação que manteve com as instituições, com o Congresso e as Forças Armadas; (g) a relação que manteve, respectivamente, com a classe dominante, e com a classe trabalhadora; (h) que tipo de partido ou movimento é o seu instrumento de luta; (i) quais são as relações e apoios internacionais; (j) de onde vem o dinheiro, ou quais são suas fontes de financiamento.

Considerando estes dez critérios, podemos concluir que:

1. A origem social de Bolsonaro é a pequena-burguesia plebeia. A procura de ascensão social rápida através de uma carreira de oficial no Exército não foi incomum, durante gerações, especialmente entre euro-descendentes. Ela exigia um desempenho escolar inferior às carreiras de medicina, direito, engenharias nas Universidades Públicas (além de oferecer um soldo desde o início), e oferecia como recompensa de estabilidade, e uma remuneração, comparativamente, muito mais elevada que a de um professor de educação física.

Esta origem de classe explica algumas das obsessões de Bolsonaro: racismo rancoroso, misoginia paranoica, homofobia primitiva, ressentimento social, anticomunismo feroz, militarismo radical, nostalgia do mundo rural, antipatia pela ciência, fascínio pelo pensamento mágico, referências messiânicas religiosas, nacionalismo suburbano, deslumbramento pelo modo de consumo da classe média norte-americana, e aversão intelectual.

2. A trajetória de Bolsonaro, durante os últimos quarenta anos, foi a de um oficial insubordinado delirante e de um deputado corporativista folclórico marginal no último degrau do “baixo clero” parlamentar. O que o distinguiu o bolsonarismo foi sempre a defesa incondicional da ditadura militar, em especial, dos métodos de terror contra o perigo de uma revolução socialista.

Bolsonaro sempre foi medíocre, tosco, desaforado, boçal. Bolsonaro está presente na luta política há trinta anos, e acumulou seis mandatos de deputado federal, portanto, seu lugar não foi um improviso.

3. Não se pode compreender o lugar, qualitativamente, diferente que ocupa hoje na presidência sem analisar o papel da Lava Jato desde 2014, e a apropriação histórica da bandeira anticorrupção por setores da classe dominante.

Frações da burguesia brasileira já usaram essa bandeira em suas lutas intestinas, em 1954, para derrubar Getúlio Vargas, em 1960, para eleger Jânio Quadros, em 1964, para legitimar o golpe militar, em 1989, para eleger Collor de Melo e, em 2016, para fundamentar o impeachment de Dilma Rousseff.

Bolsonaro saiu da obscuridade nas mobilizações pelo impeachment, entre 2015/16, quando a exigência de intervenção militar ganhou audiência entre dezenas de milhares dos milhões que saíram às ruas, em mais de duzentas cidades. O bolsonarismo expressa o repúdio de setores da classe média contra as conquistas sociais e democráticas da Constituição de 1988.

4. O projeto político de Bolsonaro é um autogolpe para a instalação de um regime bonapartista. Desde março, quando o impacto da pandemia passou a ser devastador, projetando algo entre cem e duzentos mil mortos, este plano vem fracassando.

Mas se Bolsonaro recuou, ainda não foi derrotado. Sua estratégia é a subversão do regime semi-presidencialista híbrido estabelecido nos últimos trinta e cinco anos. Bonapartismo, derivado de Bonaparte, inspirado pelo modelo francês, significa um regime autoritário em que a presidência se eleva acima das outras instituições, como o Congresso e o Judiciário, e concentra poderes excepcionais, em nome da defesa da ordem.

Essa é a importância do slogan “Brasil acima de tudo”. Há, historicamente, vários tipos de bonapartismo nos países periféricos. O projeto de Bolsonaro, apoiado na mobilização de um movimento de massas contrarrevolucionário, obedece ao plano de um regime autoritário que, dependendo das condições da luta político-social, poderia vir a adquirir formas semi-fascistas.

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5. As relações de Bolsonaro com as Forças Armadas e as polícias, e os choques permanentes com os Tribunais Superiores e Congresso, confirmam a tentação bonapartista. Bolsonaro não é um Trump tropical. Não é, tampouco, somente um líder autoritário, que poderia ser neutralizado, facilmente, pela pressão da classe dominante.

Desde a posse do governo começou a aprovação de emendas na Constituição, como a reforma da previdência social, com pleno suporte do Exército. Avança e recua, mede as suas forças, provoca e negocia, mas não interrompe a ofensiva.

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6. Bolsonaro vem cultivando uma relação com a grande burguesia através da nomeação de Paulo Guedes como seu superministro da economia. Trata-se de uma improvisação que se acelera. O plano econômico apresentado é ultraliberal, com ênfase em privatizações indiscriminadas, choque fiscal brutal, e ataque frontal aos direitos dos trabalhadores.

Sua estratégia é reposicionar o Brasil no mercado mundial ao lado dos EUA contra a China. Conta para isso com investimentos dos EUA no Brasil para sair da estagnação.

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7. Esta estratégia é coerente com os planos dos núcleos mais poderosos da burguesia, mas não pode ser aplicada sem que haja confronto social, porque não ocorreu, até agora, uma derrota histórica da classe trabalhadora brasileira.

Desde 2015/16, o que aconteceu ao longo de quatro anos – o processo que começou com o golpe institucional que derrubou o governo Dilma Rousseff – não foi uma derrota histórica. O que vivemos foi uma inversão desfavorável da relação social de forças: uma derrota político-social que abriu uma situação reacionária. Mas não estamos em situação contrarrevolucionária.

8. Bolsonaro não se apoia ainda em um partido fascista de combate. Usou como instrumento eleitoral um partido de aluguel, que depois descartou. Mas esta debilidade orgânica foi compensada pela fascistização de um movimento político de massas que tem a maior presença nas redes sociais. Ele poderá construir um partido a partir do controle do Estado.

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9. Subestimar Bolsonaro, ou a capacidade de sua corrente se articular no terreno internacional seria um grave erro. Existe uma Internacional de extrema direita sendo construída no mundo, ainda em formas embrionárias, com financiamento robusto de alguns grandes grupos econômicos, que respondem ao projeto de uma fração do capitalismo norte-americano de oferecer resistência à ascensão da China como potência proto-imperialista.

10. O financiamento da campanha eleitoral de Bolsonaro permanece, essencialmente, obscura. No entanto, a potência de sua presença nas redes sociais sugere que há grupos empresariais seriamente engajados. Alguns destes grupos já são, amplamente, conhecidos e têm forte presença na Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp).

Edição: Leandro Melito