Marighella, como diz Mano Brown, corresponde a um homem de mil faces, leal às suas ideias
Em livros, no cinema e agora nos quadrinhos a história de Carlos Marighella segue viva e ganhando projeção. Lançado em junho, a HQ Marighella #Livre traz três momentos cruciais da história e da vida do militante, guerrilheiro e poeta. O roteiro da obra é de Rogério Faria e as ilustrações são de Ricardo Souza e Jefferson Costa.
:: "Não tive tempo de para ter medo": 50 anos da morte de Carlos Marighella ::
A ideia da HQ começou a ganhar vida ainda em 2013, no contexto das jornadas de junho, explica Rogério Faria. Porém, foi somente em 2017 que o roteiro começou a ser escrito e a ideia de um gibi sobre a primeira prisão de Marighella, aos 24 anos, começa a tomar corpo.
:: "Marighella foi essencialmente um homem de ação", diz biógrafo Mário Magalhães ::
A partir de então, sobretudo com o sucesso da campanha de financiamento coletivo, o projeto se ampliou com um capítulo desenhado por Ricardo Souza, que conta sobre a prisão de Marighella em 1964.
E a terceira parte da obra tem os traços de Jefferson Costa, e narra o assassinato do guerrilheiro pela ditadura militar, no dia 4 de novembro de 1969, em São Paulo.
“A gente escolheu essa história, porque ele, com apenas 24 anos, resistiu com bastante dignidade e inteligência às sessões de tortura, ao ser preso pela polícia política da ditadura Vargas. A segunda história fala da prisão de Marighella em 1964, em um cinema no Rio de Janeiro, quando ele é cercado pela Polícia, toma um tiro no peito e, com 52 anos, luta contra 14 policiais. A gente usa essa história como uma alegoria para fazer uma crítica ao momento atual em relação à violência do estado. Para fechar, a gente aborda o assassinato dele em 1969, pelo DOPS [Departamento de Ordem Política e Social]" explica Rogério Faria.
:: Morre aos 96 anos Raphael Martinelli, um dos fundadores da ALN ao lado de Marighella ::
Ricardo Souza, artista que produziu duas das três histórias em quadrinhos que o livro retrata, conta que o fato de desenhar, sobretudo, a história de um jovem que tinha ideais de liberdade, foi o que mais lhe fez querer compor o projeto da HQ junto com Rogério.
Para Ricardo, o processo de conhecer Marighella vêm de antes do projeto da HQ. “Eu fui me interessar mesmo pelo Marighella quando o Racionais lançou o clipe ‘Mil Faces de Um Homem Leal’. E aí eu fui estudar e entender um pouco mais sobre Marighella”.
Para a produção da HQ, Ricardo conta que viu documentários e leu diversos conteúdos produzidos sobre a vida do “Preto”, como era chamado Marighella pelos companheiros da Ação Libertadora Nacional. Para além disso, Ricardo conta que assistiu a filmes e novelas de época para ajudar no processo de criação do personagem. O artista fala também sobre o processo de construir coletivamente um projeto de criação.
“Trabalhar em conjunto com outro artista é muito interessante porque quando têm esse casamento entre o roteiro e o desenho, essas duas pessoas estão contando juntas uma história, estão construindo uma história”.
Carlos Marighella, como diz Mano Brown, corresponde a um homem de mil faces, leal às suas ideias revolucionárias, que dedicou sua vida pela liberdade e pela soberania do Brasil, assim como pela possibilidade da construção de uma democracia e contra toda a forma de opressão e de domínio dos povos e dos territórios.
Marighella era um típico brasileiro que gostava de samba, carnaval e futebol. Mas foi sobretudo um militante comunista, nascido na Bahia, que acreditava que a revolução brasileira seria conquistada pelas mãos do próprio povo e que teria todas as características e jeitos do Brasil.
:: Fantasma da ditadura sobre a democracia, AI-5 completa 51 anos ::
Sobre a atualidade da luta de Carlos Marighella, Rogério diz que, para ele, “só o fato de falar em Marighella hoje em dia já é um ato de resistência, porque ele é uma figura cujos poderosos vêm tentando apagar da história do nosso país. Marighella representa um ideal de luta por uma sociedade mais justa, uma sociedade sem opressão, e essa luta é maior e mais importante do que a própria vida dele. E isso assusta quem está no poder”.
Para Ricardo, é importante que as pessoas se questionem sobre quem foi Carlos Marighella e busquem saber mais sobre sua essência.
“Eu acredito que a HQ vai levar as pessoas a se questionarem realmente quem foi Marighella, para que elas possam tirar suas conclusões por elas mesmas, saindo desta bolha onde as pessoas falam que Marighella era ‘só um guerrilheiro’, que era ‘só um baderneiro’. Mas que as pessoas possam realmente saber quem é Marighella dentro da sua essência. E que a gente possa cada vez mais buscar essa essência de Marighella nas nossas vidas, para que a gente possa fazer a diferença para o nosso país, a diferença para a nossa liberdade” defende o artista.
:: Opinião | O filme Marighella e a necessária revolução dos negros no Brasil ::
Marighella #Livre foi lançado pela Editora Draco no dia 11 de junho. O livro conta prefácio de Cynara Menezes e posfácio de Luis Nassif. A capa é fruto de uma colagem, feita pelo artista Phillzr, com milhares de pedaços de papel que remontam uma das mais famosas fotos de Marighella. A obra está disponível para vendas online pelo site da editora.
Edição: Lucas Weber