Em meio aos debates sobre o Projeto de Lei (PL) 735/2020, que prevê medidas emergenciais para agricultores familiares durante a pandemia, parlamentares de oposição e segmentos populares vêm intensificando as articulações para tentar garantir a liberação de uma linha de crédito específica para mulheres do campo. O tema não foi contemplado no parecer do relator, deputado Zé Silva (Solidariedade-MG), e é um dos principais pontos de pressão no jogo político sobre o tema.
A Articulação Nacional de Agroecologia (ANA) está entre as entidades que hoje tentam pleitear com o parlamentar a inclusão dessa demanda no documento. O texto ainda não tem data prevista para votação no plenário da Câmara dos Deputados e é alvo de intensas costuras políticas da Frente Parlamentar Agropecuária (FPA), a chamada “bancada ruralista”, com o governo Bolsonaro.
“O que a gente vem discutindo é a importância de ações que deem subsídios pra continuidade da produção de alimentos, tanto paro o autoconsumo como para a comercialização de alimentos saudáveis. Nesse contexto, as mulheres têm uma importância significativa porque elas têm continuado a produzir nos seus quintais, nos seus roçados, mas precisam de maior infraestrutura”, afirma Sara Luiza, do núcleo executivo da ANA.
O PL 735 é de autoria da bancada do PT e tramita em conjunto com outras 25 propostas de diferentes partidos que tratam de socorro aos trabalhadores rurais durante o estado de calamidade – que vigora no país até dezembro deste ano. Atualmente, PT, PSB, PDT, PCdoB Psol e Rede têm articuladores políticos que tentam emplacar a medida.
“Houve uma confluência grande para introduzir o tema da agricultura familiar como um setor que precisa urgentemente de crédito para se sustentar”, salienta José Guimarães (CE), um dos articuladores petistas. A bancada também é autora de uma das propostas que tramitam com o PL 735, o PL 886/2020, cujo texto foi produzido pelos parlamentares a partir de uma pauta de reivindicações apresentada por movimentos populares.
Reforço
Paralelamente à tramitação do PL 735, o deputado Vilson da Fetaemg (PSB-MG), signatário de algumas das propostas que estão apensadas ao projeto, tenta acelerar também o PL 2501/2020, de sua autoria, que trata especificamente do credito especial para mulheres durante a pandemia. Ele argumenta que o segmento tem menos acesso a esse tipo de política.
“Temos, no Brasil, muitas mulheres que são agricultoras, empreendedoras rurais. E tem muitas que não têm um companheiro, um marido, mas têm tripla jornada de trabalho, criam os filhos, cuidam da roça, dos animais, da casa, e a gente percebe uma resistência muito grande das instituições financeiras em liberar crédito pra elas. Os bancos ficam sempre empurrando isso com a barriga”, assinala.
O deputado tenta agora construir uma articulação com lideranças do centrão e de outros partidos para buscar uma votação de urgência para o PL 2501 e reforçar o coro pela aprovação de uma linha de crédito dessa natureza. “Estou partindo do lado do diálogo, da negociação, porque eu acho que um projeto desse não pode ter agremiação partidária. Vamos ver aonde vai dar”, disse ao Brasil de Fato.
Orçamento
Em meio às costuras políticas em andamento, o deputado Nilton Tatto (PT-SP) afirma que a pauta das mulheres seria uma das prioridades da oposição, que levanta ainda outras demandas nos projetos em questão. O PL 886, por exemplo, prevê renegociação de dívidas de agricultores familiares, apoio a tecnologias de acesso à água, compra de produtos desses trabalhadores para distribuição de cestas básicas populares pelo governo, entre outros pontos.
Tatto enxerga na equipe econômica do governo “o maior entre os empecilhos” que há no percurso de tramitação das medidas relacionadas ao PL 735, que dependem de liberação de verbas.
“Já estamos há três meses da pandemia e muitas outras categorias tiveram projetos [de auxílio] aprovados. Nós temos uma dificuldade grande de conseguir apoio pra agricultura familiar. Na hora de liberar recursos pro sistema financeiro, o governo é muito mais rápido do que o que interessa para a grande maioria do povo, por isso acho que é importante a Câmara dar uma resposta rápida [no sentido de] aprovar e obrigar o governo a pagar, até porque o projeto ainda precisa ir pro Senado”, afirma Tatto, acrescentando que mesmo entre a bancada ruralista a pauta encontra “algum apoio”.
O relator, Zé Silva, por exemplo, é membro da FPA e tem, em sua base eleitoral de Minas Gerais, agricultores familiares. O Brasil de Fato tentou ouvir o parlamentar a respeito do tema do PL 735, mas não conseguiu contato até o fechamento desta matéria. O mesmo ocorreu em relação ao líder do governo na Câmara, Vitor Hugo (PSL-GO), que não atendeu as ligações da reportagem.
Edição: Rodrigo Durão Coelho