O despejo dos moradores do Edifício Nossa Senhora da Conceição, popularmente chamado “Prédio da Caixa”, localizado no centro de Niterói, na região metropolitana do Rio de Janeiro, completou um ano na primeira semana de junho em meio a crise causada pela pandemia do novo coronavírus. O processo de desocupação, no ano passado, acatou uma ação judicial movida pelo Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MP-RJ) que determinou a interdição do condomínio devido às “precárias condições de segurança e habitação”.
Na época, a Justiça deliberou que a Prefeitura de Niterói pagasse por um ano aluguel social aos moradores que fossem registrados em um cadastramento. Após o vencimento do prazo, os residentes que acessaram o benefício de R$ 789,69 convivem diariamente com a incerteza com relação ao futuro. A geografa Lorena Borges é um deles. Ela morava com sua mãe em um apartamento próprio no Edifício Nossa Senhora da Conceição e conta que acumulou dívidas para mobiliar o imóvel de 15 m² que alugou com o benefício após o despejo, pois até hoje seus pertences não puderam ser retirados do Prédio da Caixa.
“Estamos na mesma situação de insegurança. O prefeito declarou que tinha a intenção de desapropriar o prédio para habitação social, mas depois não se posicionou mais. Veio a crise, a pandemia, o prédio foi aberto, teve uma limpeza, mas nós não conseguimos tirar nossas coisas ainda. Um ano de aluguel social se passou e estamos nessa incerteza de saber se vamos receber o aluguel social mês que vem, se vai ser renovado por mais um ano ou não”, explica Lorena que integra o Fórum de Luta pela Moradia em Niterói.
Vulnerabilidade Social
O “Prédio da Caixa” abrigava também moradores em situação de vulnerabilidade social, que ocupavam os primeiros andares do edifício. De acordo com Lorena, muitas dessas pessoas não conseguiram acessar o benefício do aluguel social e foram parar nas ruas ou em ocupações precárias vivendo em condição de extrema pobreza.
“Boa parte da população do prédio continua sem receber o aluguel social, algumas pessoas em situação de rua. Tivemos esse ano um fato muito triste com a morte da Suely que era uma moradora antiga do prédio. Ela morreu em situação de rua por pneumonia na [Avenida] Amaral Peixoto. Logo no início da pandemia tivemos uma demanda muito grande dos moradores em relação ao básico e nós fizemos uma campanha de arrecadação para a doação de cestas [básicas], conseguimos atender algumas famílias”, relata a geografa, completando que o Fórum de Lutas pela Moradia e o Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) ajudaram na campanha que beneficiou cerca de 140 pessoas.
O vereador Renatinho (Psol), que preside a Comissão de Direitos Humanos da Câmara de Niterói, afirma que tem esbarrado na falta de respostas adequadas tanto do Judiciário quanto da Prefeitura para as iniciativas apresentadas para moradores do prédio.
"Se o despejo teve como justificativa proteger a vida dessas pessoas, como explicar que um ano depois ainda estejam em situação de rua? Parte nunca sequer recebeu o aluguel social. Parte sofre sistematicamente novos despejos por causa da irregularidade no recebimento do aluguel social. Essa parte ainda tem que escolher entre morar ou comer, porque o dinheiro não dá para as duas coisas", ressalta o vereador que realizará uma audiência pública na Câmara Municipal de Niterói na segunda-feira (22) para tratar do assunto.
Posicionamento
Ao Brasil de Fato, a Prefeitura de Niterói garantiu que a Secretaria Municipal de Assistência Social e Direitos Humanos, por orientação da Procuradoria Geral do Município, segue com os pagamentos do aluguel social até que uma nova decisão judicial seja tomada.
Já sobre o plano de desapropriação do prédio para implementação do projeto de habitação popular, a Prefeitura de Niterói relatou que deverá entrar em vigor no segundo semestre deste ano. Segundo o governo municipal, a crise da pandemia do novo coronavírus obrigou priorizar ações sanitárias e de saúde pública na cidade, atrasando outras demandas.
Por sua vez, o MP-RJ, responsável pela ação judicial, continua atuando no caso. O órgão informou à reportagem que no dia 10 de março acompanhou a ação de limpeza no Edifício Nossa Senhora da Conceição e que o cronograma para a retirada dos pertences dos moradores ocorrerá somente após o retorno das atividades presenciais da instituição - que foram paralisadas devido a pandemia.
Edição: Mariana Pitasse