Responsáveis pela produção de 70% da comida que chega às famílias brasileiras, os pequenos agricultores nem sempre conseguem acessar o financiamento que necessitam para continuar sua produção. São entraves comuns as taxas de juros cobradas pelos bancos podem chegar a 400% ao ano, as condições burocráticas difíceis de serem supridas e os prazos pouco adequados à dinâmica de produção dos agricultores.
Agricultor do assentamento Filhos de Sepé, em Viamão, no Rio Grande do Sul, Oscar de Moura participa da cooperativa que é responsável pela maior produção de arroz orgânico da América Latina. Ele relata que apesar da alta produtividade, a cooperativa enfrenta dificuldades para acessar o crédito que possibilitaria a expansão da distribuição e beneficiamento da sua produção.
“Uma parte de nossas famílias busca o crédito no banco para poder girar e poder ter o capital de giro. Mas sabemos que o banco é aquilo, empresta no juro que ele bem quer e você tem que ter toda aqueles critérios para poder acessar. O período também, por exemplo, de carência, é muito ajustado. Isso dificulta também o desenvolvimento das famílias na produção”, afirma o agricultor.
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Não é um banco, não é um fundo de investimento. São pessoas que estão despertando que estão olhando para essa situação de injustiça do país.
Pensando nesse cenário, um movimento de financiamento popular voltado ao investimento de pequenos agricultores foi lançado pelo economista Eduardo Moreira, em parceria com o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). O projeto chamado de Finapop se propõe a aproximar investidores e projetos que necessitam de captação.
“O Finapop é um movimento de financiamento popular. Não é um banco, não é um fundo de investimento. São pessoas que estão despertando que estão olhando para essa situação de injustiça do país, e querem dar sua parcela de contribuição.” afirma Moreira.
Primeira etapa
Na proposta, as condições de empréstimo e investimento são bem mais atraentes para quem quer investir ou emprestar: as taxas de juros e de rendimento são em média de 4 a 5 % ao ano. Dessa maneira, quem empresta o dinheiro vai receber mais do que se aplicar na poupança e as cooperativas terão um mecanismo mais desburocratizado e flexível.
A primeira beneficiada pelo Finapop foi a Cooperativa de Produção Agropecuária Nova Santa Rita (Coopan), no município homônimo, também no Rio Grande do Sul. “Esse tipo de financiamento é importante para a família assentada, para o pequeno agricultor porque o financiamento vem sendo feito por quem acredita nessa forma de organização ou na organização dos pequenos na agricultura”, afirma Milton José Fornazieri, agricultor que integra a Coopan.
Nessa primeira etapa foram destinados R$ 1 milhão para a construção de um novo frigorífico no assentamento, que já possui criação própria e abatedouro para venda de carcaça suína. A meta agora é concluir as obras em fevereiro do próximo ano e começar a produzir inúmeros produtos, sendo os principais o salame, os defumados e a linguiça.
“Os próximos dois projetos que vamos estudar para investir são do nordeste para a gente poder olhar para esse região do nordeste. um de cacau e chocolate e um de mel. dois projetos do mst super bonitos”, explica Eduardo Moreira.
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Além de investir na ampliação da produção, outra ambição dos projetos do Finapop é a possibilidade de reinvestimento em projetos de desenvolvimento local. “Isso é realmente algo que nenhum banco faz isso. Aquela padariazinha que entrega alimentação nas escolas, aquela associação que tem um pequeno beneficiamento de frutas. Pequenos projetos que fazem muita diferença muito grande na vida daquelas famílias” afirma Fornazieri.
O cenário político assim como a pandemia que agravam as condições de produção no campo também são motivos que impulsionam a aposta em uma linha de financiamento independente, que não dependa do financiamento público, nem dos bancos.
“O Finapop surge num momento de incerteza sobre o rumo que o Brasil vai ter. Nós sabemos que nós vamos resistir, que vamos estar produzindo, mas não sabemos quais serão as condições para continuar produzindo, se vamos ter as condições necessárias para fazer isso. Então por isso, essa alternativa vem sendo uma garantia de a gente poder contar com esses investidores e acreditar nesse nosso processo”, completa o agricultor.
Edição: Rodrigo Chagas