Na última quarta-feira (20), o ministro da economia Paulo Guedes anunciou a possibilidade de prorrogar o auxílio emergencial por um ou dois meses. Contudo, a condição seria a redução do benefício para R$ 200, valor apresentado pelo governo federal no início da pandemia no Brasil, em março. Vale lembrar que o auxílio passou a somar R$ 600 após a pressão de setores da sociedade civil organizada e de parlamentares que venceram o governo em votação no Congresso Nacional.
Na avaliação da diretora técnica adjunta do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), Patrícia Pelatiere, reduzir o valor do auxílio é provocar uma crise humanitária e significa uma “burrice” do ponto de vista econômico.
“Quando falo que é uma burrice do ponto de vista econômico é porque estudos do IPEA [Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada] mostram que cada real investido na transferência de renda, aumenta o PIB [Produto Interno Bruto]. Além disso, ele tem uma parte que retorna em forma de arrecadação. Manter a economia significa garantir renda para as pessoas poderem comer, sobreviver e consumir. Tanto do ponto de vista humanitário, quanto do ponto de vista econômico, não faz o menor sentido pensar em reduzir esse auxílio emergencial que, tudo indica, deveria ser transformado numa renda permanente”, explica.
::Quarentena: operações policiais superam 2019 e impedem ações solidárias em favelas::
Para a economista, o governo precisa de um plano econômico robusto para os próximos dois anos que garanta a sobrevivência de pessoas, empregos e empresas. Segundo Pelatiere, não há como a economia se recuperar sem a intervenção do Estado.
"É preciso entender que esse processo fez uma ruptura no circuito da renda e do emprego e que o Estado deve sim colocar os recursos para amenizar essa situação. Mais do que prorrogar para dois meses, tem que começar a se pensar e estudar esse estímulo, essa ajuda continua, por muito mais tempo, um tempo muito mais longo do que esse que o Guedes está falando de dois meses", destaca.
Ainda é pouco
Segundo informações no site do governo federal, mais de 46 milhões de brasileiros receberam a primeira parcela do benefício financeiro destinado a trabalhadores informais, microempreendedores individuais (MEI), autônomos e desempregados. Dados da Empresa de Tecnologia e Informações da Previdência (Dataprev) apontam que dos quase 100 milhões de inscritos no auxílio emergencial, 32,77 milhões estão inelegíveis e outros 13,67 milhões estão classificados como inconclusivos.
A ambulante Lucimar da Silva, de 49 anos, faz parte do grupo dos que já conseguiu acessar o benefício. A vendedora atua no centro do Rio de Janeiro e está há mais de dois meses sem trabalhar. Lucimar é mãe solteira de uma criança autista e de um jovem de 23 anos. Ela está recebendo o valor máximo do benefício R$ 1200, no entanto, tem gastos com a saúde do seu filho autista que a obriga a viver no limite.
“Mudou tudo, alimentação, a despesa, você almoça e não janta, janta e não almoça para não faltar para ele [a criança]. Você deixa mais as despesas para a criança, tem comida, remédio, ele tem uma alergia terrível à mudança de temperatura do tempo, se hoje amanhecer chovendo, ele já amanhece doente”, conta.
A notícia da possibilidade de redução do benefício preocupou Lucimar que possui hepatite C e baixa visão e está no grupo de risco para covid-19. Ao Brasil de Fato, ela destacou que a situação é “desesperadora”.
“É desesperador, às vezes eu durmo três ou quatro horas da manhã e penso: se eu for trabalhar, eu morro e deixo o meu filho sozinho, se eu não for trabalhar, passo necessidade com os dois dentro de casa. Com R$ 200 você vai ter que se arriscar, sendo do grupo de risco ou não sendo, vai ter que se arriscar para trabalhar, por que como vamos comer com esse valor?”, questiona a ambulante que tem contado com o apoio de cestas básicas do Movimento Unido dos Camelôs (MUCA) para complementar o valor recebido através do auxílio federal.
Futuro incerto
De acordo com o Dieese, mais de 52 milhões de brasileiros estão em situação limite para sobreviver. Patrícia Pelatiere ressalta que além da necessidade de se pensar uma ampliação da renda emergencial para um salário mínimo e garantir uma sobrevivência digna para a população, é fundamental um planejamento do governo para a manutenção de empregos.
“Duas medidas que devem ser aprofundadas na sua execução, porque ambas têm problemas, é a questão da manutenção da renda e do emprego dos trabalhadores. Quando falo renda, eu coloco aqui todos os trabalhadores, os informais e os autônomos. Isso deve ser ampliado, prolongado e o auxílio à manutenção das empresas, principalmente das micro, pequenas e médias empresas que são grandes geradoras de empregos e que, efetivamente, não estão tendo acesso ao crédito com baixo juros porque isso ficou na mão dos bancos privados”, afirma.
Edição: Mariana Pitasse