Disseminação acelerada para o interior é consequência do baixo isolamento social, aponta pesquisador
Depois de atingir principalmente as regiões metropolitanas, a covid-19 avança por todo o interior do país. Segundo o MonitoraCovid-19, levantamento feito pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), o percentual de cidades pequenas, com até 10 mil habitantes, com casos confirmados de coronavírus era de 5,7%, em 17 de abril, e passou a 33,8% no dia 17 de maio, segundo o tamanho da população do país. Um aumento de 28,1 pontos percentuais em um mês.
Ainda segundo os dados divulgados, nos municípios de 10 mil a 20 mil habitantes o percentual atingido pela doença era de 15,1% nas cidades, em 17 de abril, e 66%, em 17 de maio. Na faixa de 20 a 50 mil habitantes era de 34,4%, no mesmo período do mês passado, e 85,8%, neste mês. Um aumento médio de 51 pontos percentuais nos dois casos.
De acordo com o Ministério da Saúde, até o dia 17 de maio, o país chegou à 241.080 casos confirmados de covid-19 e 16.118 vítimas fatais da doença.
O pesquisador da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz), Alexandre Pessoa, avalia que disseminação acelerada do coronavírus para o interior do Brasil é uma consequência do “baixo isolamento social das grandes cidades” e alerta para os impactos deste cenário para as populações destas regiões.
:: Mais de 80% dos leitos de UTI estão ocupados nos 5 estados com mais casos da covid-19 ::
“O Brasil tem desde 2011 uma Política Nacional Integral das Populações do Campo, da Floresta e das Águas, que, infelizmente, não teve uma grande efetividade. Porque se assim tivesse, nós teríamos um Sistema Único de Saúde muito mais fortalecido nas áreas rurais, nos pequenos municípios para o enfrentamento do coronavírus”, aponta.
População mais vulnerável
Segundo Pessoa, as populações do campo, da floresta e das águas compreendem uma grande diversidade de povos e comunidades, que serão mais afetados pelo avanço da doença para o interior: são os indígenas, os extrativistas, os pequenos agricultores familiares, camponeses. São as populações das águas, os pescadores artesanais, os coletores, os marisqueiros.
:: Indígenas, quilombolas e camponeses denunciam aumento de ataques durante a pandemia ::
Ele evidencia que a realidade anterior à pandemia dessas populações as coloca em uma situação de ainda maior de vulnerabilidade diante da covid-19 tais como as invasões dos territórios nas comunidades indígenas, a poluição do petróleo nas áreas litorâneas que ainda afetam a população das águas e o baixo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) em que se encontra boa parte da diversa população camponesa brasileira.
Outro fator de indefensibilidade ao coronavírus que estas regiões estão sujeitas, de acordo com o pesquisador, é o saneamento domiciliar, que afeta um contingente populacional estimado em cerca de 4 milhões de pessoas, segundo dados de 2017.
“Um elemento da perspectiva do direito à água e ao saneamento importante é que a Pesquisa Nacional de Domicilio Contínua em 2019 revelou é que ainda temos um 1,6 milhões de domicilios sem banheiro, sem sanitário. Então quando a gente fala de barreira sanitária para covid, a questão da limpeza das mãos é estratégica ”, explica Pessoa.
Para ele a saída para reverter este cenário passa pela garantia de EPIs para os agentes de saúde e de combate a endemias, que atuam com estas populações, assim como máscaras para as pessoas do campo, das águas e das florestas, e redes regionais de atendimento à saúde.
:: Plataforma emergencial propõe medidas de defesa do campo, das florestas e das águas ::
“Em termos do Sistema Único de Saúde são fundamentais as redes regionalizadas de atenção à saúde, que possam estar integrados municípios e estados, porque o coronavírus não respeita das barreiras jurídicas, de estado. É fundamental essa ação integrada. E a organização comunitária das comunidades rurais é fundamental nessa mobilização social para o enfrentamento do coronavírus”, ressalta Pessoa.
Edição: Leandro Melito