Com o medo e a incerteza sobre o futuro se disseminando pela sociedade durante o pandemia do coronavírus, o trabalho das instituições religiosas, que atuam diretamente no acolhimento afetivo e espiritual das pessoas, torna-se mais evidente.
Mas, com as igrejas, paróquias e mesquitas de todo Brasil fechadas devido à necessidade de distanciamento social, como tem sido feito o trabalho de atendimento dos centros religiosos?
Lideranças das religiões evangélica, católica e muçulmana contaram ao Brasil de Fato como tem sido o funcionamento de suas atividades, as ações sociais que mobilizam, e também como suas crenças interpretam o momento que vivemos.
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Segundo o bispo Dom Pedro Luiz Stringhini, da Diocese de Mogi das Cruzes, duas grandes mudanças foram feitas: as celebrações passaram a ser transmitidas pelos meios comunicação e, ocasionalmente, os padres têm saído às ruas, em carreata com o santíssimo sacramento, levando a eucaristia pelas ruas e abençoando a população.
"Com a pandemia, o isolamento, muita gente perdeu o emprego, muita gente está passando necessidade. Os pobres já passam normalmente, agora mais ainda. A igreja procura ser sensível. As paróquias estão se mobilizando sobretudo na coleta de mantimentos, cestas básicas, e a distribuição na paróquia ou levando nas próprias casas", explica.
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Outro grupo mobilizado virtualmente e também em práticas solidárias é a Comunidade Cristã Reformada, liderada pelo pastor Ariovaldo Ramos em São Paulo.
"A partir da pandemia, os pedidos cresceram de forma exponencial. Nós estamos tentando obviamente assistir as pessoas da maneira que podemos, que lamentavelmente se restringe à virtualidade. E temos nos engajado com outros grupos, evangélicos ou não, na distribuição de cestas básicas e kits de higiene e essas necessidades que se tornaram prementes agora", aponta o pastor.
A comunidade muçulmana, na representação do Sheikh Hossein Khaliloo, também afirma que as atividades de pregação e do estudo do Alcorão estão acontecendo só via internet, e que o foco atualmente é no apoio aos mais necessitados.
"A nossa crença é apoiar, ajudar as pessoas que passam dificuldades, nossa obrigação é ficar ao lado deles", diz.
Solidariedade
Apesar de mobilizados para atender de forma comunitária as necessidades das famílias mais vulneráveis, as lideranças exigem mais agilidade no atendimento da população.
“A gente tá vendo as filas enormes para que as populações possam receber os benefícios. É uma burocracia exacerbada. Então, [é necessário] olharmos, vislumbrarmos também as políticas sociais com mais agilidade no atendimento a sociedade.” afirma o bispo Dom Pedro.
Os efeitos das políticas públicas que estão sendo tomadas pelo governo também são motivo de preocupação. Para o pastor Ariovaldo há uma apreensão sobre o que será da história imediata do Brasil pós pandemia.
É óbvio que nós estamos todos apreensivos, principalmente no Brasil, cuja marca da ação do Estado é a pior possível. O Estado não tem consciência de que se não salvar primeiramente as pessoas, não vai conseguir salvar coisa nenhuma. Essa ênfase na recuperação da economia só vai aumentar a angústia, o temor, a preocupação com a vida, que vai obviamente desestimular todos os seres humanos. São políticas inacreditáveis.
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Apesar da angústia e temores trazidos por esse momento de pandemia, eles defendem que a mensagem a ser replicada é a de esperança e resiliência.
Para Sheikh Hossein Khaliloo, as dificuldades sempre existiram e sempre vão existir e que a melhor postura é resistir e investir no apoio mútuo.
Às vezes algumas pessoas pensam que está chegando o fim do mundo. Sobre esse assunto a nossa religião está falando é que a primeira coisa não é o fim do mundo. Isso não é de hoje, na história aconteceu, e quem lutou as dificuldades, ficaram vitoriosos. Hoje essa pandemia também podemos dizer que a gente não vai abaixar a cabeça pra essa pandemia, vamos lutar nesse caminho.
O pastor Ariovaldo concorda com o posicionamento do líder muçulmano. Segundo ele, a esperança é o principal motor para a superação de adversidades.
“As pessoa precisam se nutrir de transcendência, de consciência de que o ser humano é mais o que os seres humanos conseguem ver imediatamente. De que há uma esperança para além dessa vida, de que há um propósito para continuar vivendo e lutando pela vida, que o ser humano não é uma mera máquina, que uma vez desligada, lançada num depósito, num ferro velho ou coisa que o valha, que a vida humana tem significado. E esse significado é transcendente.” conforta o pastor.
Para o bispo Dom Pedro, o momento adverso irá ensinar a necessidade de novos tipos de relacionamentos, humanos e com a natureza.
Passando a epidemia, temos que olhar para frente, para um novo modo de relacionamento, entre os seres humanos e para com a natureza. Um novo tipo de vida, mais sóbria, e um relacionamento mais fraterno e mais harmônico e a natureza. Isso tudo tem que ser colocado em pauta.
Edição: Leandro Melito