Experiências estão devolvendo plantas nativas ao Nordeste
A beleza da caatinga é algo único. E isso não é papo de nordestino, que se emociona com histórias que aconteceram só nessa região, como o sonho de Canudos. Ou com os poemas de artistas locais, como o cearense Patativa do Assaré. A beleza da caatinga é única porque este bioma é único. Ele é exclusivo do Brasil. No entanto, o bioma não é reconhecido como patrimônio nacional. E o pior, a fauna e flora do bioma predominante no semiárido brasileiro seguem ameaçadas por práticas degradatórias.
Por outro lado, algumas iniciativas desenvolvidas com a sabedoria popular na perspectiva da convivência com o semiárido colaboram com a preservação do bioma. Uma dessas práticas é o reflorestamento, ou, recaatingamento, como algumas pessoas preferem chamar. O replantio de espécies nativas ou adaptadas na região tem tudo a ver com a agroecologia, como explica Luís Eduardo Sobral, da coordenação técnica da organização Cetra, que atua no Estado do Ceará.
“A questão do reflorestamento da caatinga vem visando a valorização de toda a cultura e todo o patrimônio genético dessa região. Partindo de termos práticos, eu tenho como entender quais são as espécies que compõem esse ecossistema e poder realizar, juntamente com práticas de conservação dos solos, práticas agroflorestais. Porque quando eu falo em reflorestamento da caatinga, eu falo também na realização de um sistema agroflorestal”, salienta.
O reflorestamento é um contraste com os processos de desertificação no semiárido, que hoje representa uma realidade de 13% do território. As principais causas da desertificação são o desmatamento por conta da agropecuária, excessos na mineração e salinização do solo pelo uso de irrigação. Essas três atividades econômicas foram apontadas como degradatórias por estudo do Plano Nacional de Combate à Desertificação.
Rivaneide Almeida é técnica do Centro Sabiá, organização que atua em Pernambuco. Ela cita que é preciso revisar os pontos de vista entre a lógica econômica, a questão ambiental e a diversidade popular, quando o tema é preservação da caatinga.
“Apesar de existirem políticas que atendem a esse tema, a execução dessas políticas ainda tem muita fragilidade. Então é um tema central para nós, povos do semiárido, e desse país. E a caatinga é central, é importantíssima no ponto de vista ambiental, social e econômico, para que o semiárido tenha processos de desenvolvimento e sustentabilidade das populações que aqui estão”, destaca.
Um exemplo de desenvolvimento e recaatingamento é o Sítio Axixá, na zona rural do município baiano de Várzea do Poço (BA). O local passou por transformações nos últimos anos, quando a agricultura convencional, utilizando a pecuária, abriu espaço para a agroecologia. O solo estava ficando degradado, os animais nativos tinham desaparecido e a vegetação cada vez limitada. O agricultor José Raimundo, mais conhecido como Di, lembra que apenas ao perceber essas alterações que veio a vontade de mudar os hábitos.
“Resolvemos plantar árvore para trazer de volta a cobertura do solo, as árvores que foram retiradas durante muitos anos. E dessa forma é que vemos o nosso sítio respondendo com essa questão da terra estar viva, de estar chegando próximo a nossa casa os animais que foram afugentados por conta da vegetação ter acabado, e o sentimento é o melhor possível. Estamos muito felizes de hoje poder cultivar dentro da caatinga”, lembra.
A meta no Sítio Axixá é plantar 50 mil espécies nativas. Por enquanto, a iniciativa de reflorestamento contabiliza 25 mil espécies. A propriedade tem 5 hectares e está sendo berço de espécies como copaíba, jacarandá, sibipiruna, ipê branco, ipê rosa e guabiroba.
O plantio diversificado também garante recursos e segurança alimentar para a família. De acordo com a perspectiva do reflorestamento e da convivência do semiárido, se faz necessário compreender as especificidades de cada localidade, além do saber popular, para fazer a caatinga continuar viva e inspiradora.
Edição: Lucas Weber