Gestão

"Não se pode louvar trabalho de omissão", diz ex-ministro da Saúde sobre Mandetta

Arthur Chioro afirma que falta de testes e respiradores revelam falta de planejamento no combate à pandemia

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“País perdeu dois meses de possibilidade de planejamento”, diz Arthur Chioro - Sérgio Lima/AFP

Para o ex-ministro da Saúde Arthur Chioro, os ataques feitos pelo presidente Jair Bolsonaro a medidas como o isolamento social, que se mostrou medida eficaz para conter a evolução do contágio por coronavírus em diversos países, têm garantido o apoio de boa parte da população ao atual ocupante da pasta, Luiz Henrique Mandetta. No entanto, não se pode fechar os olhos para falhas, algumas graves, que têm sido cometidas na condução do combate à pandemia.

Como exemplo, ele cita a quantidade de testes feitos para o coronavírus até agora. “O Brasil, hoje, é o país entre os 30 com maior número de casos de covid-19 no mundo que menos testes realizou. Só temos mais testes que Índia, Malásia, Filipinas e Indonésia”, pontua, em entrevista a Marilu Cabañas e Glauco Faria, no Jornal Brasil Atual.

“Enquanto Espanha e Itália fazem 10 mil testes por milhão de habitantes e outros países da Europa fazem entre 4 e 7 mil, estamos com volume de 248 testes. Por isso que nós não temos inclusive capacidade de entender qual é o real tamanho da epidemia nas nossas cidades, o número real de óbitos e casos graves", diz Chioro.

Para o ex-ministro da Saúde a falta de testes representa a falta de planejamento do governo Brasileiro para lidar com a pandemia de coronavírus, que ele classifica como "irresponsabilidade".

Não tem teste. E mesmo que compre, a capacidade de realização de testes no Brasil, segundo o próprio ministério da Saúde é na faixa de 6,7 mil por semana e são necessários, segundo o próprio ministro, 50 mil por semana. Não foram ampliados os leitos de UTI, não se acham respiradores e muito menos profissionais de saúde que saibam utilizá-los da noite para o dia. Este país perdeu dois meses de possibilidade de planejamento e o discurso é o do planejamento. Não consigo ser condescendente com tamanha irresponsabilidade.

O ex-ministro atribui isto a uma “incapacidade por parte do Ministério da Saúde”.

"Ainda que as alternativas que se coloquem ao nome do ministro Mandetta sejam muito piores que ele, vejo a sociedade louvar um trabalho de omissão. E com mais descoordenação ainda pela auto-oposição que Bolsonaro faz ao próprio governo. É um quadro surreal", afirma.

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O ex-ministro também aponta outras falhas no trabalho do Ministério da Saúde e do governo em geral no enfrentamento à pandemia. “Os recursos não chegaram ainda nos estados e municípios, não foi feita nenhuma regulação do setor privado, dos planos de saúde, em relação àquele atendimento aos casos de covid-19 que estão sendo feitos pelo SUS a pessoas que têm plano de saúde. Continua uma bagunça”, ressalta..

Distanciamento Social Ampliado

Chioro chama a atenção para a importância do isolamento social no atual contexto e faz uma advertência a respeito de uma sinalização de relaxamento em relação a essa diretriz, feita nesta segunda-feira (6) na coletiva em que o ministro da Saúde anunciou sua permanência no cargo.

“Ontem vi o discurso do secretário de Vigilância em Saúde (Wanderson Kleber de Oliveira), com medidas que não têm nenhuma fundamentação e são concessões inaceitáveis. Alguns epidemiologistas repercutiram essa informação ao longo da noite demonstrando estranheza, mas quero colocar aqui, contundentemente, uma que é desastrosa: a ideia de desmobilizar (o isolamento social) nas cidades com 50% da capacidade de taxa de ocupação de leitos de UTI. Como critério, isso não se justifica sob hipótese alguma", afirma.

A medida citada por Chioro consta no Boletim Epidemiológico 7 da secretaria. “A partir de 13 de abril, os municípios, Distrito Federal e Estados que implementaram medidas de Distanciamento Social Ampliado (DSA), onde o número de casos confirmados não tenha impactado em mais de 50% da capacidade instalada existente antes da pandemia, devem iniciar a transição para Distanciamento Social Seletivo (DSS)”, diz o texto.

O texto define o Distanciamento Social Seletivo como uma “estratégia onde apenas alguns grupos ficam isolados, sendo selecionados os grupos que apresentam mais riscos de desenvolver a doença ou aqueles que podem apresentar um quadro mais grave, como idosos e pessoas com doenças crônicas (diabetes, cardiopatias etc) ou condições de risco como obesidade e gestação de risco. Pessoas abaixo de 60 anos podem circular livremente, se estiverem assintomáticos”, aponta.

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Na prática, é uma flexibilização em relação ao chamado Distanciamento Social Ampliado (DSA), que exige “que todos os setores da sociedade permaneçam na residência durante a vigência da decretação da medida pelos gestores locais.” Esta medida tem como objetivo restringir ao máximo o contato entre pessoas para diminuir a velocidade de transmissão do vírus.

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“O Brasil tem 5.570 municípios e 438 regiões de saúde. Mais de 70% das cidades têm menos de 20 mil habitantes e dependem da cidade-polo. Portanto, é um critério que não foi utilizado em nenhum lugar do mundo, não se justifica, vai liberar a transmissão do vírus. Por que? Porque o ministério já para de trabalhar, apesar do discurso do ministro de ‘vou trabalhar com base na ciência, no foco e no planejamento’. Na ciência, de vez em quando; no foco, desde que seja para se manter (no cargo), e no planejamento, com fundamentos, agora, que não se justificam”, aponta Chioro.