Ele enchia um prato fundo de feijão, pulava para o buffet das frutas e punha uns pedaços de melancia
Tem gente que odeia jiló. Tem gente que acha jiló a maior delícia. Tem gente que odeia fígado de boi, tem gente que acha fígado de boi a maior delícia.
Contei para uns amigos sobre um tempo que ia muito a Belo Horizonte e todas as tardes ia ao Mercado Central, onde vários botecos serviam cachaças de primeira e cerveja bem gelada, e o tira-gosto mais requisitado deles era fígado com jiló.
Um amigo torceu o nariz, falou “eca... que horror”, e outro ficou doidinho pra ir lá.
Aí conversamos sobre como os gostos variam.
Minha mulher odeia doce de coco, o que eu acho estranho, porque gosto muito.
Numa coisa nosso paladar combina bem: nem ela nem eu suportamos comida temperada com coentro.
Tenho amigos que adoram dobradinha, aquele prato feito de tripas, e eu não consigo comer. Já tentei.
Um amigo resolveu fazer uma surpresa pra mim, num aniversário e me levou a um bar que segundo ele, tinha uma comida que eu ia gostar demais.
Chegando lá, revelou:
- Aqui servem a melhor dobradinha de São Paulo.
Foi uma das vezes que tentei comer, mas não deu.
Em alguns lugares do sertão da Bahia e de Minas Gerais vi muita gente que comia feijão com rapadura, e gostava muito. Nunca experimentei.
Mas um amigo baiano, o Robson, gosta não só disso, mas mais ainda de uma coisa que só vi ele comer, mais ninguém.
É feijão com melancia.
Durante o governo Erundina, na prefeitura de São Paulo, fui fazer uns trabalhos na Secretaria da Habitação e ele estava empregado lá.
Descobrimos um ótimo restaurante com buffet livre, incluindo sobremesas, por um bom preço.
E ficava tudo ali para a gente se servir: saladas, carnes, doces, frutas...
Eu me servia primeiro de salada, depois o prato principal e por fim a sobremesa. Ele enchia um prato fundo de feijão, pulava para o buffet das frutas e punha uns pedaços de melancia em cima.
Todo mundo olhava espantado, mas ele comia com o maior prazer.
Eu me acostumei com o gosto esquisito que ele tinha, mas um dia não resisti.
Foi quando ele, eu e uma amiga, a Railda, fomos comer uma feijoada. A Railda e eu pedimos cerveja, ele disse que não queria beber álcool e pediu uma fanta uva. Quando o garçom ia saindo pra buscar as bebidas, ele alertou:
- Sem gelo, viu? Eu tô meio resfriado...
Foi aí que não aguentei: falei fingindo brabeza:
- Robson, se me mandassem escolher entre fanta uva sem gelo e um tiro na testa eu ia vacilar na escolha...
Edição: Lucas Weber