Coronavírus

Psol vai à OMS contra Bolsonaro por participação em protesto e contato com público

PSB e deputado do PT também criticaram conduta do presidente; médico faz alerta sobre doença

Brasil de Fato | Brasília (DF) |

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Presidente Jair Bolsonaro durante contato com apoiadores em protesto em Brasília - Sergio Lima/AFP

A ida do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) ao protesto de direita no domingo (15) provocou reações de diferentes setores. A bancada do Psol na Câmara dos Deputados, por exemplo, anunciou que vai denunciar o chefe do Executivo à Organização Mundial da Saúde (OMS) pelo fato de ele ter incentivado a manifestação e ainda se exposto ao contato com o público.

Segundo o partido, a denúncia será entregue ainda nesta segunda-feira (16) ao diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus, e ao relator especial da Organização das Nações Unidas (ONU) para o Direito à Saúde, Dainius Pūras.  

No domingo, Bolsonaro compareceu ao ato realizado por movimentos de ultradireita na Esplanada dos Ministérios, em Brasília (DF), e chegou a falar pessoalmente com alguns apoiadores, com os quais deu aperto de mão e tirou fotos.

O presidente estava de quarentena por suspeita de ter contraído o novo coronavírus durante viagem aos Estados Unidos. O primeiro teste realizado havia dado negativo, mas Bolsonaro ainda iria se submeter a um segundo exame para contraprova.

Em resposta às críticas, o presidente afirmou, em entrevista ao jornalista José Luiz Datena, da Rede Bandeirantes, nesta segunda (16), que não se arrepende de ter ido ao protesto. 

“Tenho obrigação de saudar o povo. Se eu me contaminei, ninguém tem nada a ver com isso. Não faço demagogia. Não faço populismo”, disse.

A líder da bancada do Psol na Câmara, Fernanda Melchiona (RS), aponta que a atitude do presidente fere a Constituição da OMS e o Regulamento Sanitário Internacional.

“Não só ele acabou estimulando os protestos, como pessoalmente, embora mais de dez pessoas da comitiva dele tenham testado positivo pro coronavírus, desceu nas manifestações e cumprimentou [as pessoas]. Fez exatamente o contrário do que um estadista deve fazer neste momento, que é [respeitar] o princípio da responsabilidade, de alertar a população sobre os riscos da contaminação do coronavírus e, de fato, evitar as aglomerações públicas”, afirma Melchiona.

O Brasil é um dos 194 membros da Organização Mundial da Saúde (OMS), agência da ONU que trata da promoção à saúde dos povos e se debruça sobre ações sanitárias de nível global. De acordo com o Psol, a ideia da denúncia é fazer com que o organismo notifique o país sobre suas obrigações e apure eventual descumprimento das normas internacionais por parte de Bolsonaro.  

Paralelamente, o partido avalia medidas judiciais no Brasil, onde o presidente já é alvo de uma série de críticas e outras ações por ter estimulado protestos que pedem o fechamento do Congresso Nacional e do Supremo Tribunal Federal (STF).

Na Procuradoria-Geral da República (PGR), por exemplo, tramita uma representação do Psol que pede apurações sobre o vídeo compartilhado pelo presidente no último dia 26 em que ele teria estimulado  os protestos.

Reações

Outras vozes políticas reagiram à atitude de Bolsonaro. O presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), criticou a conduta.

“O mundo está passando por uma crise sem precedentes. O Banco Central americano e o da Nova Zelândia acabam de baixar os juros; na Alemanha e na Espanha, os governos decretam o fechamento das fronteiras. Há um esforço global para conter o vírus e a crise. Mas, pelo visto, ele está mais preocupado em assistir às manifestações que atentam contra as instituições e a saúde da população”, afirmou pelo Twitter.  

Já o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), manifestou-se por meio de nota à imprensa na noite de domingo (15).

“É hora de amadurecermos como Nação. Com a pandemia do coronavírus fechando as fronteiras dos países e assustando o mundo, é inconsequente estimular a aglomeração de pessoas nas ruas. A gravidade da pandemia exige de todos os brasileiros, e inclusive do presidente da República, responsabilidade. Todos nós devemos seguir à risca as orientações do Ministério da Saúde”.  

Entre os partidos do campo da oposição, a bancada do PSB também soltou nota no domingo. O partido disse condenar a postura de Bolsonaro, que qualificou como “irresponsável e inconsequente”.  

“Enquanto a Ásia e a Europa já sofrem os efeitos nefastos do vírus, o Brasil tem o dever de antecipar-se e focar em ações preventivas, a fim de evitar o contágio em massa. Sem os devidos cuidados, o sistema público de saúde será sobrecarregado, prejudicando o acesso de todos a um atendimento digno e decisivo para salvar vidas. Sem dúvida, os mais pobres serão os que mais sofrerão com estas atitudes irresponsáveis”, acrescentou o líder do partido, Alessandro Molon (RJ).

Médico infectologista e ex-ministro da Saúde, o deputado federal Alexandre Padilha (PT-SP) também criticou Bolsonaro. Pelas redes sociais, ele disse que a conduta é marcada pela “irresponsabilidade com a vida e a saúde da nação”.

“Certamente, ele é o único chefe de Estado e de governo no mundo hoje que tenha tido uma atitude tão irresponsável. Ganhou a medalha de ouro da irresponsabilidade sanitária na história dos chefes de Estado”, disse o petista, que chamou atenção para o efeito manada que tende a ser gerado a partir da conduta do presidente.  

“Ele desmobiliza toda a equipe abaixo dele em relação a isso, todo o esforço que o Ministério da Saúde, os trabalhadores e trabalhadoras do SUS, os gestores do SUS [têm feito] de buscar enfrentar essa pandemia gravíssima que se espalhou pelo mundo e que está começando a se espalhar pelo Brasil”, completou.

Médico

Dentro da mesma linha de raciocínio, o médico Thiago Henrique Silva, da Rede de Médicas e Médicos Populares, demonstra preocupação com o incentivo de Bolsonaro a esse tipo de comportamento.

“Ele fez uma atitude que atenta contra a saúde pública. É importante até a gente ver como vai ser a nossa curva de casos porque ela já está bem acentuada. Daqui dois a cinco dias, a gente pode experimentar uma explosão de casos por conta dessa atitude do Bolsonaro”, afirma o médico, que é mestre em Saúde Pública.

Ele destaca o que ocorreu na Itália, onde, no início da epidemia de coronavírus pelo mundo, o governo de Giuseppe Conte chegou a desprezar os riscos da doença. Atualmente, o país é o mais afetado da Europa, com 1.809 mortes e cerca de 25 mil pessoas contaminadas.  

“Ainda bem que a gente não depende só do Bolsonaro, senão estaríamos no rumo da Itália no momento inicial. A gente tem um corpo técnico de vigilância e saúde no Brasil e vigilância epidemiológica que não depende do governo Bolsonaro. É um corpo técnico de carreira, muitas vezes, em várias secretarias estaduais e municipais de saúde. As medidas, em sua maioria, estão na direção correta”, avalia Silva.

Edição: Leandro Melito