Igualdade

Coletivo lança agenda por cidades socialmente justas

Rede BrCidades apresenta proposta para territórios urbanos antirracistas, anti-patriarcais e democráticos

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |

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Lançamento da agenda na Ocupação 9 de Julho. - Foto: Eleonora Mascia

Parte da Frente Brasil Popular, a Rede BrCidades  lançou neste fim de semana, na Ocupação Nove de Julho, no centro de São Paulo (SP), uma agenda de propostas para a construção de justiça social nas cidades. Levando em consideração problemas estruturais que perpetuam exclusões, a agenda defende a garantia da função social da terra e do meio ambiente como bens comuns, de investimentos públicos nas periferias e favelas, de controle sobre o orçamento, mobilidade e saneamento, e do acesso à cultura, segurança e saúde.

O lançamento é uma resposta a dados que mostram a extensão das desigualdades nas áreas urbanas do Brasil. No século passado apenas 10% da população vivia em cidades. Em 2017 esse índice chegava a 85%, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia Estatística (IBG). O número de pessoas sem moradia digna ultrapassa 6 milhões, mais de 35 milhões de brasileiros não têm acesso a abastecimento de água e quase metade não conta com redes de coleta e tratamento de esgoto, de acordo com informações Confederação Nacional das Indústrias (CNI) .

Um dos pontos principais da agenda da rede BRCidades é o combate à percepção da cidade como negócio. Durante a atividade, o coletivo citou uma pesquisa realizada em 2016 pelo Estadão Dados, que aponta que 1% das famílias proprietárias concentra quase 45% do valor imobiliário da cidade de São Paulo.

A arquiteta e urbanista Erminia Maricato, que integra o Comitê Nacional do projeto, ressaltou que o Brasil regrediu no ambiente urbano e citou a explosão no preço da moradia e o aumento no tempo para deslocamentos. Ela afirma que a agenda é um primeiro esboço coletivo para oferecer um novo paradigma do urbanismo e da arquitetura.

“A maior parte das cidades são construídas sem Estado e sem mercado, esse mercado de porte capitalista imobiliário. Então eu quero dizer para vocês que pode demorar, mas eu não tenho dúvida de que nós vamos reconstruir uma nova democracia no Brasil e desta vez ela será mais profunda e mais inclusiva”, expressou Maricato.

Convidada para compor a mesa de lançamento, Elaine Mineiro, da Uneafro, afirmou de maneira enfática que não é possível falar da consolidação do capitalismo e da construção das cidades sem citar o racismo. 

“Se a gente for olhar para a cidade e pensar os territórios negros da cidade, veremos que são os territórios periféricos. Eu moro em Cidade Tiradentes, o segundo bairro que concentra a maior proporção de pessoas negras, e o bairro que tem a menor expectativa de vida da cidade e a menor oferta de emprego da cidade. A gente percebe que essa estruturação não acontece por acaso”, explicou Mineiro.

A Ocupação Nove de Julho, onde foi realizada a atividade de lançamento da agenda, abriga 120 famílias e é organizada pelo Movimento Sem Teto do Centro (MSTC). Desde 1997, o local se tornou símbolo de resistência.

A coordenadora da ocupação, Tatiana Rodrigues, falou sobre a necessidade da luta social e política para a conquista do direito a casas dignas: "Nossa luta pela moradia é muito constante. Nossa luta é mostrar que nós temos direito de morar no Centro. Não é só a população branca, rica e burguesa que tem esse direito. Então, nós não vamos parar".

A agenda foi construída em um processo que começou há dois anos com contribuições dos 16 núcleos estaduais, movimentos sociais, entidades técnicas, entidades estudantis, profissionais (arquitetos e urbanistas, engenheiros, advogados, assistentes sociais, geógrafos, médicos) além de professores e pesquisadores de 23 universidades.

Edição: Mauro Ramos