Energia

Projeto legislativo propõe fim de concessão para empresa que comprou Eletroacre

Deputada autora da iniciativa destaca cobranças abusivas e problemas no atendimento ao consumidor após privatização

Brasil de Fato | Brasília (DF) |

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No Acre, consumidores se queixam de piora no serviço de energia após privatização; caso é alvo de CPI - Senado Federal/Ascom/Edacre

Em meio ao processo das privatizações no país, uma medida legislativa pretende desfazer o contrato de concessão entre a União e a Companhia de Eletricidade do Acre (Eletroacre), ex-estatal que foi vendida à empresa Energisa.

Após a privatização da companhia, promovida em 2018 pelo governo de Michel Temer (MDB), a concessionária hoje é alvo de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) na Assembleia Legislativa do Acre por conta de denúncias de cobranças abusivas e problemas no atendimento ao consumidor.

Apresentado na última terça-feira (4), o Projeto de Decreto Legislativo (PDL) 16/2020, de autoria da deputada Perpétua Almeida (PCdoB-AC), afirma que a forma de atuação da Energisa está “causando prejuízos a vários setores da economia, como produtores rurais, frigoríficos, hospitais, além da população que tem sofrido em suas residências”.

“Desde a privatização, o Acre virou um caos. São manifestações praticamente semanais em frente à Energisa. Na minha opinião, está havendo uma quebra de contrato dos serviços a serem prestados porque não têm cabimento os reajustes que estão acontecendo”, critica a deputada.

As disputas em torno do valor aplicado à conta de luz foram parar também na Justiça. Em julho do ano passado, por exemplo, a 2ª Vara Federal Cível e Criminal da Justiça Federal do Acre suspendeu um reajuste de 21,29% que havia sido adotado pela Energisa em dezembro de 2018, logo depois de a empresa assumir o controle da ex-estatal. O pedido de anulação foi feito pelas Defensorias Públicas do Acre e da União (DPU).

É aquilo que a gente já dizia e já esperava: privatização tem muitas consequências, como aumento da conta, precarização do serviço e demissões.

Entre outras coisas, os defensores apontaram que o aumento estava acima da inflação, que não houve aviso prévio sobre o reajuste e ainda que faltou “debate popular” sobre o tema. Eles também afirmaram, na ocasião, que a atuação da Energisa no estado era marcada por “queda constante da energia”.

Para a deputada Perpétua Almeida, a situação impõe ao estado uma “quebra do interesse público”.“Se a população está reclamando e deixando de pagar [a conta], se tem gente ficando no escuro porque não consegue pagar e eles não estão avançando nos serviços, então, tem um prejuízo pra população como um todo, e aí o Estado tem prejuízo”, acrescenta.

Em entrevista ao Brasil de Fato, o presidente do Sindicato dos Urbanitários do Acre (Stiu-AC), Marcelo Jucá, disse que o cenário que circunda a atuação da empresa no estado “não surpreende”.

“É aquilo que a gente já dizia e já esperava: privatização tem muitas consequências, como aumento da conta, precarização do serviço e demissões. E o consumidor é quem mais sofre com tudo isso. A população foi induzida a acreditar que a privatização traria um serviço de melhor qualidade, um serviço mais barato e, infelizmente, não foi isso que aconteceu ”, lamenta.


Eletroacre foi vendida em leilão no dia 30 de agosto de 2018, junto com as Centrais Elétricas de Rondônia (Ceron), em leilão na Bolsa de Valores de São Paulo. A promessa do governo, à época, era de redução tarifária (Foto: Arquivo/Agência Brasil)

Congresso Nacional

No Legislativo Federal, o contexto atual soa como desfavorável à aprovação de medidas que revejam processos de privatização.

O governo de Jair Bolsonaro (sem partido) prevê, por exemplo, a venda de 300 ativos da União este ano. Na Câmara dos Deputados, onde a resistência a esse tipo de projeto é maior, o jogo político é hegemonizado por parlamentares do chamado “centrão”, grupo que reúne legendas da direita liberal, que tem forte tendência privatista.

Eu acredito que vamos conseguir sensibilizar os deputados com o drama que o Acre está vivendo.

A autora do PDL 16/2020, pondera, no entanto, destacando a dificuldade que o Executivo tem tido para convencer uma parte dos parlamentares a aprovarem a venda da Eletrobras. A estatal vem sendo fatiada desde o governo Temer e é alvo de novas investidas que preveem um avanço da redução de sua estrutura.

“Eles não conseguiram ainda aprovar a privatização da Eletrobras porque tem muito deputado aqui jogando duro contra isso porque sabe o tamanho do prejuízo que o povo vai ter. Então, eu acredito que vamos conseguir sensibilizar os deputados com o drama que o Acre está vivendo”, projeta Perpétua.

Jurídico

Do ponto de vista jurídico, o PDL da deputada não alcança uma possível reestatização da Eletroacre, pedindo apenas o fim do contrato de concessão com a Energisa.

Na prática, isso significa que, em caso de eventual aprovação da medida pelo Congresso, a empresa não necessariamente voltaria em definitivo para os braços do Estado, podendo ser novamente colocada à venda em outro leilão.

O destino da companhia, nesse caso, tende a ficar a cargo da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). Isso se dá porque o contrato de concessão com a Energisa é uma autorização dada pelo poder público à iniciativa privada para que ela explore os serviços de distribuição de energia, cuja regulação cabe à União. A norma é definida pela Lei nº 8987/1995, que disciplina o funcionamento dos regimes de concessão e permissão para a prestação de serviços públicos.

Energisa

O Brasil de Fato tentou ouvir a Energisa a respeito do PDL, mas não houve retorno da assessoria de imprensa da companhia até o fechamento desta matéria.  

Edição: Rodrigo Chagas