A redução de horários e ofertas de barcas para a Ilha de Paquetá, ilha-bairro do Rio de Janeiro, pela concessionária CCR Barcas, que começou no último sábado (25), vem provocando diversos transtornos para moradores e prejuízos para o turismo e a economia do bairro bucólico. Durante a semana, são sete viagens a menos. Já nos fins de semana, a concessionária promoveu um corte de 11 travessias entre a Praça XV e Paquetá.
O professor e cineasta Zeca Ferreira trabalha todos os dias no Rio e está engajado junto com os moradores de Paquetá para pressionar o governo do estado e tentar reverter a situação. Enquanto a medida impopular está em vigor, ele conta que já há moradores pensando em decisões mais drásticas, como deixar a ilha.
“Morar em Paquetá e trabalhar no Rio virou algo impossível. Algumas pessoas têm que pegar a barca tão cedo, que elas ficam duas horas pela rua antes de entrar no trabalho. No fim do dia, outras sequer conseguem voltar para casa. Tem muita gente esperando que a situação seja revertida, mas tantos outros moradores que disseram que vão se mudar”, conta ele, que acusa a CCR e o governo de matarem um bairro.
“Se isso não for revertido pelo governo ou na justiça, o bairro não vai mais existir como ele é, vai ser um lugar dormitório, um bairro bastante empobrecido. Não estamos passivos diante dessa situação, mas a luta está difícil. Esperamos que o Rio nos ajude, que nos veja como um bairro da cidade. Até agora, Paquetá se sustenta com um turismo de médio porte”, afirma Zeca.
Economia
O turismo mais forte que a ilha vinha consolidando nos últimos 10 anos não está resistindo às mudanças. De passeios mais caros ao comércio de rua, todos estão sendo afetados. Administrador do Paquetá Iate Clube, Marcos Silveira contabilizou, com tristeza, a queda no movimento de frequentadores do local, muitos de fora da ilha.
“Fomos muito prejudicados, a tendência é o clube fechar as portas em breve. Essa constatação não é só minha, é de praticamente todo o comércio de Paquetá. Eu atendia 60 mesas nos fins de semana. No primeiro fim de semana com menos barcas, foram menos de cinco mesas. Nós estamos assustados, e os turistas não têm previsão de horário para voltar para casa, então eles não vêm”, conta Silveira.
Nascido e criado em Paquetá, Carlos Alberto da Silva Ferreira, de 44 anos, vende açaí na área próxima ao desembarque dos passageiros das barcas. Com outra faixa de público, a constatação dele também é a mesma. “Se continuar assim, vai parar tudo, não vamos aguentar. A mudança é recente e eu já vi minhas vendas caírem 60%, é menos da metade do que eu vendia”.
Transporte
Representantes da área de transportes, que costumam atuar na área das barcas e levar os turistas para conhecer os pontos da ilha, também se queixam da queda no movimento. “Ficou muito ruim para nós, o governo do estado tirou mais que metade das viagens mesmo sabendo que a ilha e a população daqui vivem do turismo”, contou Tiago Mendes de Araújo, da cooperativa de carros elétricos.
Para Isaura Cristina Ferreira, profissional dos transportes de ecotáxi, não é possível prever as próximas semanas para Paquetá. “A ilha está vazia, não sabemos como será o amanhã. Fomos muito prejudicados”.
Desemprego
Com a queda de movimento de turistas, o desemprego já é uma realidade. Neusa Matos, que tem “62 anos de ilha”, como ela faz questão de afirmar, e dona da Casa de Noca, espaço que serve almoço durante o dia e oferece música à noite, conta que precisou dispensar dois dos seis funcionários que trabalhavam com ela.
“Há quatro anos, quando abri a Casa, Paquetá estava na mídia, todo mundo queria vir aqui. Agora, eu não consigo pagar mais os dois turnos, com a queda de movimento no último fim de semana e nos últimos dias, já tive que mandar dois funcionários embora. Isso é generalizado, já há restaurantes demitindo seus funcionários. É muito triste”, conta a comerciante.
Proprietária há 10 anos da Casinha Amarela junto com a irmã Andrea, Márcia Kevorkian constata que “o baque é inevitável” e vai afetar empregadores e trabalhadores. “Aqui no nosso caso, qual é o hóspede que vai pagar uma diária se ele precisa tomar de volta para o Rio a barca das 14h30 pra não enfrentar a última barca lotada no fim do dia? No último fim de semana, nosso público foi todo da ilha, não havia turistas”.
Tarifa
No jogo de empurra entre a CCR Barcas e o governador do Rio, Wilson Witzel (PSC), a população é a mais prejudicada. Além da troca de acusações entre as partes – a CCR cobra quase R$ 1 bilhão por revisões contratuais enquanto o governador faz discursos contra a concessionária, sem resolver a questão –, a partir de 12 de fevereiro a tarifa passa de R$ 6,30 para R$ 6,50.
Edição: Mariana Pitasse