Acusado de corrupção e de relação com grupos paramilitares da Colômbia, o opositor Juan Guaidó não conseguiu assegurar sua reeleição como presidente da Assembleia Nacional da Venezuela em votação realizada neste domingo (5). Luis Eduardo Parra, do partido Primeiro Justiça – integrante da Mesa de Unidade Democrática -, foi eleito com apoio de opositores insatisfeitos e deputados do PSUV, partido de Nicolás Maduro, e assumiu o lugar do autoproclamado presidente.
:: Especial: O que está acontecendo na Venezuela? ::
A nova direção do Parlamento venezuelano será comandada por Parra, Franklin Duarte (Copei), José Gregorio Noriega (Vontade Popular) e Negal Morales (Ação Democrática), todos integrantes do bloco opositor. Segundo a rede TeleSUR, eles foram eleitos com 81 votos dos 140 presentes (ultrapassando o quórum mínimo de 84 parlamentares). No total, são 167 deputados.
Pelas redes sociais, Guaidó e líderes de outros partidos da oposição denunciaram que a Guarda Nacional Bolivariana (GNB) estaria impedindo o ingresso de deputados de oposição na Assembleia. “Oficiais militares tentam impedir que os deputados cumpram seu dever de defender os venezuelanos, o povo que eles também juraram proteger. Contra isso, estamos lutando e vamos superá-lo juntos”, declarou.
Em seguida, o deputado ainda ameaçou seus antigos aliados, que apoiaram a eleição de Parra. “Hoje, quem ajuda a impedir a instalação legítima do Parlamento venezuelano se torna cúmplice da ditadura e cúmplice daqueles que estão oprimindo o povo da Venezuela. Eles serão expostos a seus parentes, ao país e ao mundo!”, tuitou.
“Não quis entrar”
Segundo apoiadores do chavismo, os seguidores de Guaidó não entraram no Parlamento porque sabiam que iriam perder a votação. “A Assembléia foi instalada, houve quorum e Guaidó e parte dos seus não entraram porque não tinham votos e sabiam que perderiam”, disse William Castillo, integrante do Ministério de Relações Exteriores da Venezuela.
O presidente eleito da AN, Luis Parra, também disse que Guaidó não quis entrar. “Ninguém impediu Juan Guaidó de entrar. Ele não entrou porque não tinha votos, por isso ficou fora do Palácio Legislativo Federal. Outros que tinham mandado de prisão entraram bravamente. Não vamos ficar viciados no passado e Guaidó é o passado”, disse.
Luis Parra, nuevo Pdte AN en Vzla, explica lo sucedido. pic.twitter.com/zchTM70WTp
— Patricia Villegas Marin (@pvillegas_tlSUR) January 5, 2020
Apesar das acusações de Guaidó de um suposto golpe, a insatisfação de integrantes da oposição com sua liderança já era visível e a queda parecia iminente. “Durante muita parte de 2019, você foi a maior esperança desse país, mas virou a maior decepção. […] Juan Guaidó, a partir de hoje seu tempo acabou”, disse o deputado opositor José Brito pouco antes do início da sessão da AN.
A GNB publicou uma nota negando o impedimento. “Garantimos a liberdade de imprensa, a segurança dos deputados e cidadãos que estão dentro e fora dessas instalações; promover a paz e respeitar os direitos humanos”, disse.
O presidente Nicolás Maduro, durante uma emissão televisiva em cadeia nacional, também afirmou que o operativo de segurança foi solicitado pelo setor opositor guaidosista ao vice-presidente de Comunicação, Cultura e Turismo, Jorge Rodríguez, pelos deputados Stálin González e Edgar Zambrano.
Mais tarde, o ministro de Defesa, Vladimir Padrino López reiterou que a GNB utilizou dispositivos de segurança padrão e "garantiu a entrada de deputados e deputadas, algo que foi um fato público, notório e comunicacional", afirma.
Uma série de vídeos publicado por meios de comunicação e nas redes sociais confirmam que a Guarda permitia a entrada de Juan Guaidó, quem se negava a passar, afirmando que entravam"todos ou nenhum", enquanto abraçava Gilberto Sojo, um dos deputados do partido Vontade Popular, que tiveram sua candidatura impugnada pela justiça venezuelana.
Nadie le negó el paso a Guaidó hacia la Asamblea Nacional, fue él quién se negó a pasar.
— Misión Verdad (@Mision_Verdad) January 6, 2020
¿Por qué? No teniendo los votos seguros para su reelección, quizo ingresar a un diputado que está inhabilitado. pic.twitter.com/Ia3U06yN2e
Sojo foi eleito deputado suplente pelo estado Aragua e esteve preso entre 2014 e 2016 por ter participado das guarimbas - atos violentos opositores - em 2014. Por ter empossado seis deputados que tiveram suas candidaturas impugnadas, a Assmbleia Nacional atua em desacato com o Tribunal Supremo de Justiça, que considera nulas as decisões do Parlamento, enquanto os deputados inabilitados participem das decisões.
Guaidó, assim como os demais deputados, sabiam que Sojo e outros legisladores não tiham direito político de participar dessa sessão deliberativa. Williams Dávila, deputado pelo partido Ação Democrática, quem deixou claro que seu partido apoiava a reeleição de Juan Guaidó como presidente da Assembleia, reconheceu o fato horas antes da votação que elegeu a nova junta diretiva da AN. "Somente Cazadilla e os deputados do Amazonas que não puderam entrar, de resto, todos entramos", garante.
.@williamsdavila diputado a la AN, afirmó que el partido @ADemocratica continúa apoyando a Juan Guaidó y que este tiene los votos necesarios para seguir siendo presidente (E) de Venezuela. #EnVIVO por #VIVOplay: https://t.co/1QcPa5TS5U pic.twitter.com/h3prKrtwYH
— VIVOplay (@vivoplaynet) January 5, 2020
Assim como Dávila, a maioria dos 140 deputados presentes decidiu entrar no Capitólio venezuelano, pela ausência de Guaidó, que era o presidente do organismo, o regimento prevê que o parlamentar mais antigo deve presidir a sessão e, dessa forma, a nova junta diretiva foi eleita.
Insatisfeito com o resultado, Guaidó convocou os deputados que o acompanhavam para uma sessão paralela da Assembleia, na sede do jornal diário El Nacional. Ali um grupo reduzido de deputados, fora da sede legislativa do país, decidiram reeleger o autoproclamado como presidente da AN - um movimento que contraria tanto a Constituição Venezuela, como o regulamento interno do parlamento.
Isolamento político
Um fato importante para entender esse contexto é que antes de iniciar a sessão e já nas últimas semanas de dezembro de 2019, um grupo de cerca de 30 deputados já havia anunciado que iria romper com a liderança de Juan Guaidó tanto pelas escândalos de corrupção desse setor, como pela ineficiência da sua gestão.
Sem esse apoio, Guaidó sabia que não teria os votos necessários para a sua reeleição. Perdendo o cargo de presidente do Poder Legislativo venezuelano, o deputado opositor também perde a justificativa legal para ser o "presidente encarregado da nação" - ponto de partida para todas as suas ações de tentativa de derrubada do governo de Nicolás Maduro.
Nessa terça-feira (7), Luis Parra convocou a primeira sessão ordinária da Assembleia Nacional sob a nova direção. Guaidó convocou para o mesmo dia os deputados que o acompanharam na sessão paralela no diário El Nacional para encontrar-se na sede da AN.
Edição: Revista Fórum