A ação da Polícia Militar, que ocasionou a morte de nove jovens em um baile funk na comunidade de Paraisópolis em São Paulo nesse fim de semana, é responsabilidade do governo do estado, de acordo com entidades e organizações, que se reuniram nesta terça-feira.
O encontro foi organizado pelo Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (Condepe) e reuniu representantes da Assembleia Legislativa de São Paulo, da Ordem dos Advogados do Brasil, da Defensoria Pública e da sociedade civil.
Ao abrir o evento, o presidente do Condepe, Dimitri Sales, chamou atenção para o que parece ser uma nova forma de ação da Polícia Militar, sem o uso de armas de fogo e que dificulta a identificação dos responsáveis diretos.
Ele ressaltou que sete pessoas morreram no local e que, portanto, os corpos não poderiam ter sido retirados sem perícia, o que configura alteração da cena do crime.
“Nos dois últimos casos que o Condepe está acompanhando, as mortes não se deram por arma de fogo. No caso do Lucas, em Santo André e o caso agora de Paraisópolis. São nove vítimas que não foram alvo de arma de fogo. A impressão que nós temos é de que talvez tenha sido modificado o modo de atuação de agentes da segurança pública que têm agido fora da lei. Isso tende a complicar as investigações. Isso tende a impossibilitar a identificação dos autores de homicídios. Pode ser que estejamos vendo uma nova forma de extermínio e de massacre no estado de São Paulo”, explica Sales.
"Houve um massacre"
O Condepe já pediu acesso aos laudos periciais e quer esclarecimentos sobre as afirmações de que dois homens em uma moto furaram um bloqueio policial a dispararam tiros, o que teria sido o estopim da ação policial.
Foram requisitados os registros da suposta blitz, assim como os nomes de quem estava no comando da operação. Dimitri ressaltou que a ação em Paraisópolis foi deliberada e se utilizou de violência física e abuso de autoridade.
"Não compreendemos que houve um acidente ou algo fora do percurso. Houve um massacre, cujos responsáveis diretos e indiretos -- ou seja o comandante da operação, quem autorizou a ordem, e quem executou a ordem -- devem ser identificados e rigorosamente punidos nos termos da lei", ressalta.
Segundo o presidente do Condepe, o ocorrido se insere em um contexto de violência institucional estimulada pelo governo de São Paulo. "Lamentamos a postura do governador, quando, em que pese ter lamentado as noves mortes, reitera em seguida, numa insensibilidade profunda, que a sua política de segurança pública, que é a mesma que tem ocasionado mortes, não vai ser modificada.”
"Política de Estado"
Margarete Pedroso, da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil em São Paulo (OAB/SP), afirmou que a instituição pretende cobrar um fórum permanente de observação da conduta policial. Ela ressaltou ainda que os ataques à periferia são uma política de estado.
“Além do genocídio negro e do ataque à população periférica, há um ataque à cultura da periferia. Essa é uma política de Estado.”
A Ouvidoria das policias pediu o afastamento de seis policiais militares que participaram da ação em Paraisópolis. O ouvidor, Benedito Mariano, esteve na reunião organizada pelo Condepe e ressaltou que há elementos indicando que a ação foi precipitada
“Era uma ocorrência de controle de distúrbio civil, mas não havia distúrbio. Nós estamos avaliando, fundamentalmente do ponto de vista técnico, se foram seguidos os protocolos que a própria Polícia Militar tem com relação a ações de controle de distúrbio.”
O conjunto de entidades que esteve reunido no evento vai criar o Comitê Massacre Nunca Mais, com objetivo de monitorar, acompanhar e coibir casos de violência do estado em áreas periféricas. Além disso, os desdobramentos das investigações do caso de Paraisópolis serão acompanhados por uma comissão.
Edição: Rodrigo Chagas