No último dia 09, o Estado de S. Paulo revelou que “emissários do governo” vinham distribuindo a deputados da base aliada um dossiê com nomes, fotos e “prints” de redes sociais de pesquisadores financiados pelo CNPq cujos temas de estudo incluíam relações de gênero, direitos humanos e ditaduras na América Latina.
A notícia serviu para acirrar os ânimos de quem já vinha criticando a proposta de fusão do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) elaborada pelo governo. A proposta é associada ao esvaziamento do incentivo à pesquisa no país.
Em entrevista ao Brasil de Fato, a presidente da Associação Nacional de Pós-Graduandos (ANPG), Flávia Calé, disse ver na medida mais uma iniciativa de Bolsonaro para “fortalecer o obscurantismo no país”. Para ela, governo induz esse sentimento ao tentar “caracterizar as universidades como lugares pouco importantes, de pensamento único voltado à esquerda". A tentativa de criminalizar "o conhecimento, o pensamento crítico e a universidade se dá através da perseguição contra as humanidades”, critica.
Segundo o Estadão, uma eventual agência fruto da fusão entre CNPq e CAPES seria subordinada diretamente à Presidência da República, o que acarretaria em uma maior controle e centralização governamental sobre o financiamento da ciência no país.
O presidente do Fórum Nacional de Pró-reitores de Pesquisa e Pós Graduação (Foprop) e professor titular da USP, Márcio Castro, classificou a elaboração do dossiê distribuído na Câmara como “absurda” e defendeu a manutenção da separação entre CAPES e CNPq: “O que nós precisamos é aperfeiçoar esse modelo, não desconstruí-lo a partir de uma decisão [tomada por] pessoas que não frequentam esse meio e que têm outros interesses além do fortalecimento da educação e da pesquisa”, afirmou ele em entrevista à reportagem.
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Castro diz que o Fórum vêm conversando com deputados e senadores na tentativa de impedir a fusão. Ao que parece, essas movimentações deram resultado: no último dia 06, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, e as lideranças da Casa -- incluindo maioria e minoria parlamentar e partidos todo o espectro político -- assinaram um artigo no jornal O Globo defendendo o aumento do investimento em pesquisa e se colocando contra a fusão das agências.
Procurada pelo BdF, a deputada federal Erika Kokay (PT) também criticou a proposta: "A verve fascista do governo o coloca de forma muito pronta em oposição ao desenvolvimento da ciência, da cultura, da arte e da educação. A fusão não se justifica. Não há nenhum dado que pontue que ela representaria um fortalecimento da educação ou da ciência e tecnologia", argumenta.
Para Kokay, parlamentares da oposição devem pedir uma investigação à Polícia Federal (PF) para rastrear os responsáveis pela produção e distribuição do dossiê: "Nós vamos elaborar uma moção contrária à divulgação do dossiê e, ao mesmo tempo, solicitamos que a Comissão de Direitos Humanos agende com o diretor da PF para uma investigação da origem desse documento", concluiu.
Qual é a diferença entre CNPq e CAPES?
O CAPES é subordinado ao Ministério da Educação (MEC). Além de conceder bolsas para pós-graduandos, ele organiza programas de capacitação de professores do ensino básico e fundamental e avalia periodicamente os cursos de pós-graduação no país.
Já o CNPq, vinculado ao Ministério de Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC), financia diretamente projetos de pesquisa e, ao mesmo tempo, concede bolsas individuais de pós-graduação. O Conselho é responsável por um terço da pesquisa científica no Brasil.
Edição: Julia Chequer
