Após a demissão do general João Carlos Jesus Corrêa, o novo presidente do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), órgão responsável pela promoção da reforma agrária em terras improdutivas, foi nomeado na quarta-feira (16). Trata-se do economista Geraldo José da Câmara Ferreira de Melo Filho, dono de fazendas de gado e herdeiro de uma das maiores fortunas do Rio Grande do Norte.
::Motivo da demissão do presidente do Incra, titulação de terras ajudará latifundiários::
O novo presidente do Incra é filho de Geraldo Melo e Ednólia Melo. De acordo com o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), a família Melo tem cerca de 17 mil hectares de terras no estado -- parte desta área está improdutiva há décadas, desde a falência das usinas de cana-de-açúcar por má-gestão.
Nessas áreas improdutivas, há cinco acampamentos do movimento, que reivindica a destinação das terras dos Melo para a reforma agrária -- algo que depende diretamente da atuação do Incra, hoje sob o comando do herdeiro dos latifundiários.
“O recém-nomeado presidente do Incra é a cara desse governo. É latifundiário, é escravocrata e que criminaliza a luta social. Ele rasga a Constituição e os direitos dos trabalhadores. Cabe a nós organizar, resistir e lutar pela reforma agrária”, explica Alexandre Conceição, da coordenação nacional do MST.
Histórico da família Melo
A família Melo é recorrentemente ligada a casos de corrupção e escândalos. Em 2017, foram presos Jerônimo Melo e Daniel Melo -- irmão e sobrinho do novo presidente do Incra --, durante a operação Cidade Luz, do Ministério Público do Rio Grande do Norte, que investigou pagamento de propina na Secretaria Municipal de Serviços Urbanos de Natal.
A matriarca, Ednólia Melo, foi prefeita de Ceará-Mirim (RN), região onde estão boa parte das propriedades da família. Ela foi condenada e teve que pagar uma indenização de R$ 76 mil por improbidade administrativa. A ex-prefeita não prestou conta dos recursos que deveriam ter sido usados no programa de combate à fome do município.
O pai do presidente nomeado para o Incra, Geraldo Melo, foi vice-governador do Estado, entre 1979 e 1983, filiado à Arena e depois ao PDS. Também foi governador, entre 1987 e 1991, já pelo PMDB, e senador, de 1995 a 2003, pelo PSDB.
A fortuna de Geraldo Melo começou um pouco antes do golpe militar de 1964, quando ele saiu da Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (Sudene), órgão que deveria promover ações de fomento no Nordeste, e, junto com outros colegas, criou a Administração Industrial e Planejamento (Adiplam).
No começo dos anos 1970, após uma crise no setor, a empresa assumiu o controle acionário das Usinas São Francisco Açúcar e Álcool S/A e Ilha Bela S/A.
Reforma agrária
Nessas terras, atualmente, o MST mantém nessas áreas os acampamentos Tatiane Lindolfo, Mariele Comuna, Chico Santa, Irmã Dorytty, Luiz Gonzaga, Cicero Pedro, Florestan Fernandes, Resistência Camponesa, Margarida Alves, Jaciele, Nova Esperança, Marielle Franco e Marcos Aurélio.
“Essas usinas têm dívidas com a Receita Federal, têm dívidas com o Estado, têm dívidas trabalhistas imensas porque nunca pagou ninguém. São áreas que o governo poderia desapropriar pelo valor das dívidas, sem precisar pagar os usineiros, e promover a reforma agrária”, afirma Conceição, da coordenação do MST.
Para Gerson Justino, da direção regional do MST no Rio Grande do Norte, as perspectivas não são boas após a nomeação de um pecuarista e latifundiário para o comando do Incra. Principalmente por conta do poder político e econômico da família Melo na região, onde é tensa a questão das terras onde estão os acampamentos dos sem-terra.
“Inclusive ameaçam as famílias com jagunços”, acrescenta.
O Brasil de Fato entrou em contato com o Incra pedindo um posicionamento do novo presidente, mas não obteve resposta até o fechamento desta matéria.
Edição: Rodrigo Chagas