A carioca Luana Pardellas, de 37 anos, passou por um transplante de rim há seis anos. Com a efetivação do procedimento, ela deixou para trás uma série de situações conflituosas que enfrentava enquanto esperava pela cirurgia.
“Eu precisava conciliar o trabalho com a hemodiálise. Era um sofrimento com aquelas agulhas. Pra quem não sabe, a hemodiálise nos ajuda muito. Ela nos traz vida. Ao mesmo tempo em que ela é um processo psicológico e físico muito complicado. Parece que você não sai do lugar, que não vai mais conseguir fazer nada”, relembra.
O final feliz da história de Luana, no entanto, nem sempre se repete para outras pessoas que aguardam por um transplante no Brasil. Até agosto de 2019, a quantidade de potenciais receptores na lista de espera era de 44.689. O levantamento foi realizado pelo Ministério da Saúde.
Com o objetivo de conscientizar a população sobre a importância de ser doador, é celebrado em 27 de setembro o Dia Nacional de Doação de Órgãos e Tecidos.
A médica nefrologista Fabíola Pedron Peres é responsável técnica pela equipe de transplante renal no Hospital do Rocio, em Campo Largo, região metropolitana de Curitiba (PR).
Peres destaca que a maior dificuldade em relação à doação de órgãos é a recusa da família, o que muitas vezes ocorre por falta de conhecimento sobre o tema.
“Outra questão importante com relação à recusa familiar é o não conhecimento de morte cerebral. Na nossa cultura, a gente entende que a morte é quando o coração para, mas hoje nós sabemos que é o cérebro quem comanda tudo”, diz.
A Lei 9.434 estabelece que a doação de órgãos só pode ser feita quando for constatada a morte cerebral, e o procedimento realizado se houver autorização de um familiar.
Por isso, a médica destaca a importância de a pessoa expressar em vida o desejo de se tornar um doador.
Fabíola lembra que a família está em uma situação de fragilidade. "Ela está perdendo um ente querido. Neste momento, quanto mais a família estiver esclarecida e ciente da vontade de doar, ela tem uma resposta mais rápida”.
A publicitária fala sobre a mudança que sentiu após se submeter ao procedimento. “Eu fui transplantar em Curitiba. E depois, muita coisa mudou para melhor: tive mais liberdade para viajar e para trabalhar, não precisei mais da hemodiálise, daquelas sessões horríveis”, conta.
De acordo com o Ministério da Saúde, o Brasil é referência mundial na área de transplantes e possui o maior sistema público para a realização dos procedimentos do mundo. Atualmente, cerca de 96% dessas cirurgias em todo o país são financiados pelo Sistema Único de Saúde (SUS).
“Para, nos últimos anos, se tornar referência na doação de órgãos, o [SUS] intensificou o ensino, o treinamento dos intensivistas. Porque é muito importante, também, você notificar essa morte cerebral. Então, esse trabalho é feito por equipes que ensinam os profissionais intensivistas e plantonistas de UTI para fazerem os testes para morte cerebral”, explica.
A médica explica que a doação de órgãos é organizada pelo sistema nacional de transplantes. “É ele quem gerencia todos os transplantes de órgãos do país. É um processo extremamente sério, correto".
Peres diz ainda que cada fila de órgãos tem critérios diferentes: “O rim, por exemplo, é por semelhanças genéticas. Não é por ordem de ingresso na fila, e sim por semelhanças genéticas. No caso do fígado e coração, a fila obedece a um critério de gravidade. Vai sempre para os mais graves. O pâncreas é por ordem de chegada”.
Ainda segundo o Ministério da Saúde, em números absolutos, o Brasil é o segundo maior transplantador do mundo, atrás apenas dos Estados Unidos. Os pacientes recebem assistência integral e gratuita, incluindo exames preparatórios, cirurgia, acompanhamento e medicamentos pós-transplante, pela rede pública de saúde.
A Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO) ressalta que, além dos avanços tecnológicos, a conscientização da sociedade é fundamental para elevar o número de procedimentos no país.
Edição: Geisa Marques