O conselho permanente da Organização dos Estados Americanos (OEA) decidiu nesta quarta-feira (11), aprovar uma resolução proposta pela Colômbia para ativar o Tratado de Assistência Recíproca (Tiar) contra a Venezuela. Como resultado, uma reunião com os ministros do Exterior dos países-membros será convocada para a segunda quinzena de setembro para deliberar sobre possíveis medidas.
A proposta contou com o apoio do deputado Juan Guaidó, autoproclamado presidente da Venezuela, além do Brasil e dos Estados Unidos, somando os 12 votos favoráveis necessários para a convocação do órgão de consulta definido pelo Tiar, que prevê a defesa mútua das nações do continente em caso de ataques estrangeiros.
Dos outros seis países signatários do tratado, cinco -- entre eles o Uruguai e o Peru -- se abstiveram e uma nação, as Bahamas, se ausentou.
O Uruguai argumentou que o tratado, aprovado em 1947, no contexto da Guerra Fria, é válido somente para ataques de países estrangeiros e que, portanto, não se aplicaria à crise venezuelana, uma questão interna do continente.
Tensão Colômbia x Venezuela
O governo da Colômbia tem acusado o governo de Nicolás Maduro de abrigar e financiar remanescentes das guerrilhas colombianas Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) e do Exército de Libertação Nacional (ELN). "A crise na Venezuela tem um impacto desestabilizador, representando uma clara ameaça à paz e à segurança no hemisfério", afirma a resolução aprovada.
O governo de Maduro classificou a decisão de infame e tachou o Tiar de "instrumento nefasto". Em comunicado oficial, a Venezuela afirma que o Tiar teve como propósito legitimar intervenções militares na América Latina e que, quando existiu uma agressão externa contra um país-membro, no caso da Guerra das Malvinas, em 1982, "os Estados Unidos traíram o continente" e apoiaram o Reino Unido contra a Argentina.
"A Venezuela seguirá apegada aos princípios da Carta das Nações Unidas, o respeito ao direito internacional, a prática do multilateralismo e a diplomacia de paz, e na busca do diálogo no meio da diversidade, da convivência e o bem-estar dos nossos povos", finaliza a nota.
Um tratado "desmoralizado"
Embora tenha sido invocado algumas vezes pelos Estados Unidos, o Tiar nunca chegou a ser efetivamente usado.
Também conhecido como Tratado do Rio -- por ter ocorrido no Rio de Janeiro, em 1947, a reunião da OEA que criou o pacto -- o Tiar tem como ponto central a “doutrina de segurança hemisférica”, segundo a qual a agressão contra um dos seus membros representa ataque a todos os países do continente, o que autorizaria uma ação conjunta contra o agressor.
O artigo 8º do tratado prevê que o órgão de consulta dos países-membro poderão adotar as seguintes medidas: "a retirada dos chefes de missão; a ruptura de relações diplomáticas; a ruptura de relações consulares; a interrupção parcial ou total das relações econômicas ou das comunicações ferroviárias, marítimas, aéreas, postais, telegráficas, telefônicas, radiotelefônicas ou radiotelegráficas, e o emprego de forças armadas".
Durante a sessão da OEA desta quarta (11), o governo da Costa Rica propôs uma emenda, rejeitada pela plenária, que limitaria o uso do Tiar para medidas que contribuíssem para "a restauração pacífica da democracia na Venezuela, excluindo aquelas que impliquem no emprego das Forças Armadas".
Para o sociólogo e especialista em relações internacionais Paulo Zero, o Tiar é um pacto "vetusto e desmoralizado" e representa mais uma aposta do governo dos EUA na desestabilização pela força do governo Maduro. "As tratativas anteriores fracassaram, mas, agora, sob o manto pretensamente multilateral e legítimo da OEA, poderiam ocorrer ações mais incisivas para promover a derrubada do governo bolivariano", analisa Zero
Ele analisou ainda a mudança de postura do governo brasileiro, que sempre apoiou as negociações pacíficas e democráticas para resolução do conflito interno venezuelano. "Um possível uso da força na Venezuela colidiria frontalmente com os princípios constitucionais da nossa política externa, como o da solução pacífica das controvérsias e o da não-intervenção", argumenta.
Edição: Rodrigo Chagas