A Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) garantiu a um réu condenado em segunda instância o direito de permanecer em liberdade até o trânsito em julgado do processo, ou seja, até o fim de todos os recursos possíveis. A decisão ocorreu nesta semana em um pedido de habeas corpus.
No caso, a decisão de primeira instância permitiu que o acusado recorresse em liberdade. Após a condenação ter sido reiterada no Tribunal de Justiça do Distrito Federal, a Vara de Execuções Penais determinou o início do cumprimento de pena, conforme a atual posição da maioria do Supremo.
A Segunda Turma se dividiu. Edson Fachin e Cármen Lúcia, tradicionalmente alinhados às posições defendidas pela Lava Jato, votaram contra, afirmando que a jurisprudência do Supremo permite a prisão após condenação em segunda instância. Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes se valeram da decisão de primeira instância para julgar a prisão sem fundamento jurídico.
Com o empate, prevaleceu a posição mais benéfica ao réu. Juristas ouvidos pelo Brasil de Fato apontam esse fator como um primeiro elemento de cautela em relação ao otimismo que o caso pode trazer em relação ao tema. Isso porque falta conhecer a posição de um quinto ministro, Celso de Mello, que integra a Segunda Turma e não votou porque estava ausente na hora da decisão.
Sérgio Graziano, advogado e pós-doutor em Direito, qualifica a decisão como “muito importante”, por ter restaurado o disposto pela Constituição em um caso específico. Mas entende que, apesar do desgaste da Lava Jato e de posições mais “punitivistas”, o STF ainda se encontra em um momento de avaliar “casuisticamente” cada processo.
“Como a gente não tem uma noção exata do que está passando na cabeça de cada um, esse debate é essencialmente político. Não há um conteúdo estritamente jurídico. Eles estão encaminhando a ideia de que no caso concreto se decide se vai ou não ser preso”, diz.
A recente anulação da condenação de Aldemir Bendine, cita Graziano, é exemplar: a ministra Cármen Lúcia fez explicitamente menção ao fato de que a interpretação pela anulação se aplicava somente ao caso do ex-presidente do Banco do Brasil.
Rogerio Dultra, professor de Direito da UFF, lembra que diversos acadêmicos já apontam a ausência de coerência jurídica nas decisões da Corte. Ou melhor, na existência de uma “coerência político-ideológica”, em detrimento de um rigor jurídico.
É por essa razão que são pequenas suas esperanças de que o texto constitucional seja restabelecido em definitivo, o que implicaria a liberdade do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva - preso após a segunda instância.
“O fato do STF ter sucumbido aos meios de comunicação de massa faz com que vá com a maré. Hoje, em qualquer decisão sobre prisão em segunda instância, não há relação como caso do ex-presidente Lula. O caso de Lula é uma demanda política dos meios de comunicação de massa e parte expressiva do poder econômico. O STF não vai julgar contra esses interesses”, critica.
Em sua opinião, apenas uma profunda mudança na opinião pública, “movendo placas tectônicas”, permitiria que o Supremo retornasse a uma posição geral pautada na Constituição sobre prisão após condenação em segunda instância.
Originalmente marcada para o primeiro semestre de 2019, o debate em torno das ações que pedem que o Código de Processo Penal e a Constituição voltem a ter validade neste tema foi adiado sem data definida para voltar a ocorrer.
Edição: João Paulo Soares