A comemoração com risos e socos no ar do governador Wilson Witzel (PSC) pela morte de William Augusto da Silva, de 20 anos, após o desfecho do sequestro de um ônibus na Ponte Rio-Niterói, na manhã desta terça-feira (20), esconde um dos piores índices de segurança pública dos últimos anos em todo o estado do Rio.
Dados divulgados recentemente pelo Instituto de Segurança Pública do Rio de Janeiro (ISP-RJ) mostram que os seis primeiros meses de governo de Witzel bateram o recorde de mortes violentas, com 881 homicídios que tiveram policiais como autores em favelas. Desde 1998, quando esses dados começaram a ser compilados, o índice não era tão alto.
Nos últimos meses, especialistas em segurança pública e entidades locais e internacionais assistem, atônitos, à escalada da violência do Estado. Entre os dias 9 e 14 de agosto, cinco jovens – incluindo uma mãe com um bebê no colo – foram mortos em comunidades em decorrência de operações policiais. Diversas testemunhas afirmam que nenhuma delas tinha ligação com o crime.
Para Filipe dos Anjos Pereira, secretário geral da Federação das Associações de Favelas do Rio de janeiro (Faferj), Wilson Witzel oficializou a “necropolítica”, uma política de morte em que o Estado é autor, mas o governador não conseguiu, segundo ele, apresentar nenhum plano de inteligência de combate ao crime.
“Como marginais têm acesso a tantas armas? Essas armas passaram por uma estrutura gigantesca do Estado, furaram barreiras, atravessaram portos, aeroportos e rodovias. O Estado brasileiro tem muito interesse nessa narrativa da ‘guerra’, sabemos que ela gera capital político. Políticos como Witzel têm a resposta errada aos anseios da população e não apresentam um plano com mais inteligência e menos impacto”, avalia o representante da Faferj.
As diferenças entre a ações para salvar reféns do sequestro desta terça-feira (20) e as entradas da Polícia Militar e a autorização do governador para “atirar na cabecinha” nas favelas foram lembradas pelo deputado estadual Flávio Serafini (Psol). Ele disse que o estado vive seu momento mais violento da política de segurança pública.
“O governador tenta se apropriar de uma situação dramática, como foi essa do sequestro do ônibus, para se promover. É completamente diferente uma ação orientada para salvar reféns da política diária que estimula tiroteios e vitimiza pessoas nas favelas e nos territórios de pobreza do nosso estado”, afirmou Serafini, lembrando que nos últimos meses Niterói a polícia aparece na liderança da autoria de mortes.
Doutorando em Ciência Política pelo Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Iesp-Uerj), o cientista social Pablo Nunes lembrou que a favela da Cidade de Deus, na zona oeste da cidade, era alvo de bombas da Polícia Civil ao mesmo tempo em que o sequestro do ônibus ocorria na Ponte.
“Temos uma política pública que não tem respondido à redução de crimes que atingem a população, ao aumento das milícias de forma avassaladora. Sobre isso o governador pouco ou nada faz e não vem a público falar. A violência continua acontecendo nas favelas. Enquanto o ônibus estava sequestrado, um helicóptero da Polícia Civil derrubava bombas sobre a população da Cidade de Deus”, comentou Nunes.
Segundo o cientista social e pesquisador do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (CESeC), enquanto governos debatem a redução da letalidade que afeta a população e a polícia, Witzel estimula e sedimenta uma política de altos índices de morte em ações do estado e comemora a eliminação de pessoas “como se fosse um gol”.
“Nesses seis meses, a polícia foi responsável por 28% de todas as mortes violentas que aconteceram no estado do Rio. Na capital, esse índice chega a quase 40% e poderemos terminar 2019 com a polícia como autora de metade das mortes violentas na cidade. É esse o feito que a segurança pública quer deixar como legado?”, questionou o pesquisador.
Edição: Mariana Pitasse