Coluna

Os trabalhadores no palanque

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Um dia os trabalhadores vão tomar o poder
Um dia os trabalhadores vão tomar o poder - Pixabay
O que a gente quer não é vingar, é construir uma sociedade mais justa

Hoje, quero contar uma historinha acontecida nos bons tempos da fundação do PT, ou melhor, um pouquinho depois: foi durante a campanha eleitoral de 1982.

Era uma empolgação danada, com muita esperança. Ser petista era uma paixão. Nas viagens, quando víamos um carro com adesivo do PT era uma festa, saudações pra lá e pra cá.

Um personagem que eu gostava era apelidado Ratinho, por ser magrinho, baixinho, menos de um metro e meio, aparência frágil demais. Ele havia sido militante das Ligas Camponesas de Pernambuco, onde foi preso depois do golpe de 1964. Barbaramente torturado, sobreviveu. Mas muitos companheiros dele morreram.

Depois veio para São Bernardo do Campo, onde tornou-se metalúrgico, e em 1980 ajudou a fundar o PT. Nas primeiras eleições em que o PT participou, em 1982, ele saiu candidato a deputado federal.

Uma caravana do PT saiu fazendo comícios pela região de Piracicaba. O primeiro foi em Americana. O Ratinho, em seu discurso, falou dos companheiros das Ligas Camponesas que morreram, de outros companheiros que foram mortos na resistência à ditadura, das perseguições que os metalúrgicos militantes sofriam em São Bernardo, e completou seu discurso dizendo que um dia os trabalhadores tomariam o poder e vingariam tudo:

— Vou ficar de sangue até a canela...

Lula e os demais participantes da caravana ficaram horrorizados. Foram falar com ele:

— Ratinho, você não pode falar assim, em vingança. O que a gente quer não é vingar, é construir uma sociedade mais justa. Queremos fazer justiça contra os torturadores, os que assassinaram trabalhadores, mas não fazendo o mesmo que eles... — e fizeram um longo discurso na orelha dele.

Em Limeira, no comício seguinte, na hora do discurso do Ratinho ficou aquele clima tenso, todo mundo preocupado com o que ele ia falar.

E ele começou a falar dos companheiros das Ligas Camponesas mortos na tortura, dos companheiros que morreram na resistência à ditadura, das perseguições aos operários militantes de São Bernardo do Campo... Os petistas do palanque estavam todos suando frio, esperando a conclusão do discurso, e ele concluiu assim:

— Sei o que vocês estão pensando. Vocês acham que um dia os trabalhadores vão tomar o poder e vingar tudo isso, que eu vou ficar de sangue até a canela, mas não vamos fazer isso, não.
 

Edição: Michele Carvalho