Rio de Janeiro

EXPRESSÃO

Núcleo Piratininga promove debate sobre os desafios da comunicação popular no Rio

Dia 24 de julho é o Dia Municipal da Comunicação Popular, uma homenagem ao jornalista Vito Giannotti, fundador do NPC

Brasil de Fato | Rio de Janeiro (RJ) |
Cerca de 50 pessoas acompanharam o evento que teve como tema a “Liberdade de Expressão Ontem e Hoje”
Cerca de 50 pessoas acompanharam o evento que teve como tema a “Liberdade de Expressão Ontem e Hoje” - Foto: Clívia Mesquita

O Dia Municipal da Comunicação Popular no Rio de Janeiro foi marcado pelo debate promovido pelo Núcleo Piratininga de Comunicação (NPC) no espaço do Armazém do Campo, na Lapa, centro da capital fluminense. A data é uma homenagem a Vito Giannotti que faleceu em 24 de julho de 2015. O jornalista foi uma das maiores referências para a democratização da comunicação no país e era membro fundador do conselho editorial do Brasil de Fato.

Cerca de 50 pessoas acompanharam o evento que teve como tema a “Liberdade de Expressão Ontem e Hoje”. Na mesa do encontro estiveram presentes Gizele Martins e René Silva, ambos comunicadores populares; Juan Leal, sociólogo e colaborador do NPC e Carlos Jardel, economista. 

Leal e Jardel trouxeram as questões do “ontem” relembrando das diferentes formas de censura utilizadas durante a ditadura civil-militar, das mobilizações dos trabalhadores para a realização de greves e do papel da comunicação popular neste período. 

O sociólogo destacou o investimento massivo em telecomunicação e o projeto cultural colocado em pauta durante o regime militar que criou uma identidade nacional e propagandeou a imagem do Brasil como sendo o país do futebol e da população cordial. Leal apontou também a necessidade de se disputar narrativa nos dias atuais em que o governo de Jair Bolsonaro (PSL) tenta destruir as formas de produção de conhecimento e cultura. 

“Pensar comunicação popular é cada vez mais complicado. Estamos disputando com o Estado, com valores extremamente conservadores nos costumes, autoritário e agressivo com os direitos da classe trabalhadora. Pensar essa movimentação à luz do que foi feito em 64 e o que vem sendo feito espelhado nessas formas de dar ao Estado o poder de produção cultural, é importante para a gente pensar quais são as nossas formas de linguagem e liberdade de expressão que estamos lutando”, ressaltou.

O segundo momento do debate apontou mais as questões do “hoje”, principalmente do papel da comunicação popular nas favelas do Rio de Janeiro. Gizele Martins, que mora no Conjunto de Favelas da Maré, começou a sua fala destacando a luta pela sobrevivência da população das favelas do Rio que já dura mais de 120 anos. A comunicadora salientou a comunicação comunitária como ferramenta para a preservação da memória.

“Queremos ter o direito à memória que o Estado e a polícia não permitem que tenhamos. A memória favelada, negra e indígena nas nossas expressões. Quando estamos construindo a comunicação dentro e fora da Maré, estamos incomodando e colocando que estamos disputando uma narrativa, palavras, linguagem e elas precisam ser colocadas todos os dias de forma pensada no nosso jornal comunitário, nas redes sociais, na forma de falar com o vizinho e a vizinha, na distribuição de um panfleto, na poesia e numa música, porque as palavras também matam, são racistas, meritocratas e capitalistas”, explicou Martins.

René Silva, do jornal Voz das Comunidades e morador do Complexo do Alemão, questionou a cobertura jornalística da mídia hegemônica que reforça o estereotipo da marginalização nas favelas e contou sobre o episódio ocorrido em 2016 quando foi preso durante uma transmissão ao vivo de uma operação policial no Alemão.

“Eu estava cobrindo uma ocupação que estava acontecendo próximo do Complexo do Alemão, três minutos depois que iniciei a transmissão ao vivo o comandante da operação pediu que eu parasse de gravar. Estava mostrando a reivindicação dos moradores, eles com faixas, bandeiras, muitos estavam nos seus acampamentos onde acontecia a ocupação. Gravei o momento em que policiais  estavam com isqueiro e fósforo, ateando fogo nesses locais onde estavam essas pessoas. Os policiais me deram voz de prisão, puxaram eu celular, me algemaram, me levaram pra delegacia e acusaram de crime de desacato e desobediência e as pessoas que estavam acompanhando a transmissão viram que não era o que estava acontecendo”, contou.

Segundo Silva, o episódio exemplifica como a população das comunidades tem sobrevivido diante da opressão que foi intensificada após a instalação da Unidade de Policia Pacificadora (UPP). Para o jovem, o desafio da comunicação comunitária é conseguir dialogar com as pessoas que estão fora da favela, mas, principalmente, com os moradores.
 

Edição: Vivian Virissimo