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POLÍTICA

Talíria Petrone: "Proteção do povo e de seus representantes é papel do Estado"

Deputada federal do PSOL diz que governador Witzel ignora ofícios da Câmara Federal sobre ameaças de morte

Brasil de Fato | Rio de Janeiro (RJ) |
Há mais de dois meses, Talíria Petrone (PSOL) convive com incertezas sobre ameaças de morte interceptadas na deep web
Há mais de dois meses, Talíria Petrone (PSOL) convive com incertezas sobre ameaças de morte interceptadas na deep web - Cleia Viana/Câmara dos Deputados

Há mais de dois meses, a Polícia Federal encaminhou um pedido de proteção para o Departamento de Polícia Legislativa (DEPOL) sobre ameaças de morte contra a deputada federal Talíria Petrone (PSOL). Desde o alerta, a DEPOL garante escolta parlamentar para a deputada em Brasília (DF). Já no Rio de Janeiro, onde foi eleita com 108 mil votos, o governador Wilson Witzel (PSC) se omitiu diante de dois ofícios da Câmara Federal e da bancada do PSOL sobre a segurança de Talíria.

"Tem uma questão grave porque ele negou o pedido por meio de nota à imprensa e segue sem ter respondido oficialmente. Ou seja, além de negar o pedido, em nenhum momento ele responde formalmente", afirmou em entrevista ao Brasil de Fato. As ameaças interceptadas na deep web - considerada uma camada invisível da internet - mudaram a rotina da deputada que declara não exercer plenamente o mandato no Rio. Para garantir a própria segurança e da equipe na cidade, aluga um carro blindado.

Em nota, o governo estadual afirmou que o pedido foi “tecnicamente analisado pelo Gabinete de Segurança Institucional (GSI) do Governo do Estado do Rio de Janeiro”. Disse ainda que, assim como outras autoridades, “a parlamentar tem direito à proteção da Polícia Militar do Rio de Janeiro quando estiver no estado em missão oficial”. E o pedido deve ser feito com até 48h de antecedência para poder ser autorizado pelo governador. A Superintendência da Polícia Federal no Rio de Janeiro não respondeu os questionamentos da reportagem.

Confira a entrevista com a deputada federal Talíria Petrone (PSOL):

Brasil de Fato: Qual foi o objetivo de trazer à público as ameaças?

Talíria Petrone: Desde que comecei a cumprir essa tarefa como figura pública, ainda como vereadora em Niterói, já foram muitas ameaças e violências. Desde ameaças nas redes sociais, de morte ou racismo muito explícito até gente armada monitorando o comitê. Então já era uma situação que nos preocupava. Tive escolta por alguns meses da Polícia Militar no Rio de Janeiro. Essa notícia da Polícia Federal que encaminhou um pedido de proteção para a Polícia Legislativa nos preocupou muito há mais ou menos dois meses e meio.

A gente optou por não publicizar porque nosso objetivo era estar segura. Mas diante de uma omissão do governo do estado depois de dois meses e meio e depois de dois ofícios da Câmara e um ofício da bancada do PSOL, optamos por divulgar para que houvesse uma resposta efetiva do governador. Coisa que não houve. 

Qual foi a resposta do governador? Houve algum avanço sobre os pedidos de proteção?

Tem uma questão grave porque ele negou o pedido por meio de nota à imprensa e segue sem ter respondido oficialmente. Ele foi acionado por meio de ofício, formalmente, e responde por meio de nota à imprensa. Ou seja, além de negar o pedido, em nenhum momento ele responde formalmente. Pelo menos até a última quinta-feira (4) não tinha resposta à DEPOL ou à Câmara Federal que foi quem acionou o governador. 

Em Brasília você tem escolta da Polícia Legislativa, já no Rio como garante sua segurança?

No Rio de Janeiro eu estou restringindo agendas, tentando ir para agenda com o maior número de pessoas e assessoria possível. No Rio, não estou conseguindo exercer plenamente meu mandato, o que é bastante grave. Mesmo antes já tinham algumas preocupações, já mudei radicalmente a minha vida. Ia de bicicleta, ônibus, para Câmara Municipal de Niterói no início do mandato. Hoje eu ando de blindado no Rio. A gente já tinha preocupações que se intensificaram com esse alerta da PF. Então é muito grave que o governador se omita primeiro e depois nem responda formalmente. Hoje a gente aluga um carro blindado no Rio.

Na sua opinião, por que o Witzel recusou ofícios da Câmara Federal e da bancada do PSOL?

Acho que é uma expressão da fragilidade da democracia brasileira. Um país que tem um deputado exilado pelas ameaças de morte, uma vereadora assassinada há quase um ano e meio sem nenhuma resposta de quem foi o mandante do crime, alguns deputados com necessidade de escolta e proteção policial para exercer seus mandatos e um governador que ignora esse quadro porque tem com ele a política da morte. 

Acho que na verdade não é uma questão de esquerda e direita nesse caso, é de democracia ou barbárie. Ele confunde o que é política de governo porque a gente é oposição ao governo que ele faz parte. Mas na verdade isso se trata de uma política de Estado, não de governo. Ele ignora que a proteção do povo e de seus representantes é papel do Estado.

A principal característica do nosso mandato é com o território, é a origem do que a gente faz. Isso é uma característica minha, sou muito da rua. E isso tem sido impedido nos últimos meses, é lamentável.

Qual foi sua reação quando foi alertada sobre o conteúdo das ameaças pela Polícia Federal?

A PF foi alertada por um outro órgão que eles não podem dizer qual foi. E é no bojo da deep web, o que é bastante difícil identificar o autor, então são muitas incertezas que permeiam. Desde o início do mandato a equipe falava em procurar a Polícia Legislativa para conversar sobre a nossa situação. Eu não queria porque são muitas restrições à vida. Então para mim foi mais um alerta de que minha equipe estava certa e que eu não poderia descuidar da questão que envolve a minha vida. E voltamos a esse patamar de exigir do Estado esse comprometimento.

Eu tenho que elogiar a Polícia Legislativa que tem sido incansável no sentido de buscar soluções. É onde eu me senti acolhida nesse processo de ameaças. Fizemos uma reunião com a Procuradoria para tentar pensar se a gente aciona o Ministério Público em conjunto com o DEPOL que está acionando o comando da Policia Militar.

O governo diz em nota que você tem direito à proteção da Polícia Militar se encaminhar o pedido com 48h de antecedência.

É diferente eu pedir um carro de uma PM fardada num espaço de agenda do que a gente ter um entendimento que eu sou uma parlamentar, defensora de direitos humanos, que estou em ameaça constantemente. Existe uma ameaça que a gente não sabe de onde vem. Então não se trata de ter apenas um respaldo burocrático de um órgão do Estado. Também não é assim que funciona a própria agenda parlamentar, muitas vezes acompanhamos algo de emergência.

Edição: Vivian Virissimo