Mais de 400 milhões de eleitores dos países-membro da União Europeia (UE) irão às urnas entre esta quinta-feira (23) e domingo (26) para eleger um novo Parlamento Europeu. Por não ter conseguido oficializar sua saída da UE dentro dos prazos anteriormente estipulados, o Reino Unido deverá participar, às pressas, das eleições.
Como consequência do desgaste causado pelo processo de divórcio com o bloco europeu, os tradicionais Partido Conservador e Partido Trabalhista, respectivamente liderados pela primeira-ministra britânica, Theresa May, e pelo deputado Jeremy Corbyn, devem ter uma participação bastante reduzida na casa.
O partido mais afetado será justamente o da premiê britânica. Pesquisas indicam que o nacionalista Partido do Brexit, criado em janeiro deste ano, deverá conquistar o maior número de assentos. Na sequência estão Liberal-Democrata, Partido Trabalhista e Partido Conservador.
O Partido do Brexit ganhou força com o impulso de uma figura carimbada do Reino Unido, o deputado do Parlamento Europeu, Nigel Farage, que agora tenta liderar o grupo. Autêntico ultranacionalista eurocêntrico, Farage comandou, nas eleições europeias de 2014, a vitória do Partido pela Independência do Reino Unido (UKIP), de extrema direita.
::: O que você precisa saber sobre o crescimento da extrema direita europeia :::
As pressões internas no Partido Conservador, causadas pelo triunfo do UKIP nas últimas eleições, ajudaram a gestar, de certo modo, as condições propícias para que o então primeiro-ministro, David Cameron, convocasse um referendo para consultar a população a respeito do Brexit.
A derrocada dos partidos tradicionais já havia ficado evidente no início deste mês, quando o Liberal-Democrata, que defende a permanência do Reino Unido na UE, foi o grande vencedor das eleições locais. O resultado do pleito representou uma grande derrota ao Partido Conservador, que perdeu mais de 1.300 assentos e o controle de quase 40 governos municipais.
Tendências opostas
Os últimos pleitos parecem expressar uma contradição, já que partidos como Change UK e Liberal-Democrata ganharam espaço nas eleições locais defendendo a permanência do Reino Unido na UE, ao mesmo tempo que a sigla mais bem colocada nas eleições europeias defende o oposto: deixar o bloco, mesmo que sem a aprovação de um acordo.
Segundo o professor de relações internacionais da Universidade Federal do ABC (UFABC), Giorgio Romano, “faz parte do jogo usar as eleições europeias e locais para dar os recados. Muitos que votaram no Partido Trabalhista e Conservador nas eleições gerais querem expressar sua insatisfação”.
No entanto, para ele, essa tendência não necessariamente indica um encolhimento das principais siglas nas eleições gerais, que devem ocorrer em 2022. “Na última eleição europeia o UKIP também era o maior partido. Depois sumiu nas eleições gerais”, afirma.
Pedro Feliú Ribeiro, professor do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de São Paulo (IRI/USP), tem uma posição parecida. Ele acredita que o crescimento de partidos novos pode ser explicado por um certo esgotamento do bipartidarismo em vigor no Reino Unido.
“Embora os partidos advoguem posições contrárias em relação à UE, eles compartilham a narrativa política anti-stablishment, o que pode render votos, independente da direção das medidas propostas”, afirma.
Além desse fenômeno, pesquisas apontam que parte do eleitorado parece estar optando por partidos que apresentam posições mais bem definidas com relação ao divórcio entre Reino Unido e UE, o que explica o crescimento de Liberal-Democrata, Change UK e Partido do Brexit.
May sob pressão
Após três votações no Parlamento Britânico para tentar aprovar o acordo do Brexit, Theresa May parece ficar cada vez mais sem opções e sob pressões vindas tanto de seu partido, quanto da oposição.
Em posição complicada, a primeira-ministra buscou um acordo com o líder trabalhista, Jeremy Cobyn, para tentar conseguir a aprovação do pacto.
“May quer complicar a vida do Corbyn, já que a dela está complicadíssima. Corbyn só pode entrar em acordo se houver garantia de acesso ao mercado comum [europeu]. Isso significa, na prática, um tipo de união aduaneira entre a UE e o Reino Unido”, afirma Romano.
A manutenção de uma fronteira aberta entre o Reino Unido e o bloco, no entanto, é um dos pontos mais sensíveis para a aprovação do acordo, já que muitos setores defendem que manter uma zona de livre circulação de bens e serviços é, de certo modo, continuar fazendo parte da UE.
Os especialistas não acreditam que May conseguirá aprovar o acordo para o Brexit, que deverá ser votado mais uma vez em junho. Para Ribeiro, “a sensação é que não passa novamente. A questão central, como demonstram os dois novos partidos, é a própria essência da decisão de sair da UE e menos como sair. Ainda assim, a conta tende a ser mais apertada no Parlamento com a nova proposta”.
A falta de alternativas fez com que May anunciasse nesta terça-feira (21) que pedirá para que o Parlamento decida se haverá um segundo referendo sobre o Brexit. A premiê afirmou ser contra a medida, no entanto, percebe “sentimentos genuínos e sinceros” dentro do Parlamento nesse sentido.
Edição: Aline Carrijo