“Rastros da Verdade: arquivos e memória da comissão estadual” é uma exposição de resgate dos trabalhos da Comissão Estadual da Verdade do Rio de Janeiro (CEV), instaurada em maio de 2013, que apurou os crimes cometidos na ditadura militar de 1964. A mostra, com parte do acervo da comissão em imagens e documentos, está em cartaz pela primeira vez aberta para visitação do público toda sexa-feira até o dia 12 de julho no Colégio Brasileiro de Altos Estudos da Universidade Federal do Rio de Janeiro (CBAE/UFRJ), no Flamengo, na Avenida Rui Barbosa, nº 762.
A Comissão Nacional da Verdade (CNV) foi criada pela então presidente Dilma Rousseff em 2011. A iniciativa foi seguida pela instauração de diversas comissões estaduais que mobilizaram a sociedade em torno da busca por memória, verdade e justiça sobre os mortos, torturados e desaparecidos do regime. Na época, o Brasil foi condenado pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos por violações de direitos durante a ditadura.
A CEV do Rio concluiu o trabalho em 2015, o relatório final foi entregue ao Arquivo do Estado do Rio de Janeiro e está disponível na internet. As pesquisas, porém, continuam tomando corpo e profundidade nas universidades, movimentos sociais e nas campanhas pela transformação de espaços de repressão em locais de memória e resistência.
Nesta semana, o evento “Arquivos, Verdade e Democracia” realizado pelo Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (IESP/UERJ) também promoveu debates sobre o regime militar, repressão e democracia em homenagem aos dez anos do Memória Reveladas - Centro de Referência das Lutas Políticas no Brasil.
“Esse esquecimento forçado que o estado costuma promover só pode ser enfrentado a partir das lutas sociais, e as pessoas não vão se calar, vamos seguir lutando para essa verdade não deixar de ser revelada, sobretudo pela memória social que permanece independente dos governos”, declara Nadine Borges, que presidiu a CEV no Rio de Janeiro e também foi assessora da CNV, que funcionou de maio de 2012 a dezembro de 2014.
“A alternância de governo não pode permitir que essa mancha histórica se perpetue. Essa história está preservada na memória do povo e não vai ser apagada nem esquecida”, completa. Nadine ressalta ainda que a CEV constituiu um momento histórico no Rio porque teve apoio massivo da sociedade civil por meio de fóruns de participação.
Repressão
Outra face pouco explorada da repressão do regime militar no Rio de Janeiro aparece nos conflitos agrários. Leonilde Medeiros, coordenadora do Núcleo de Pesquisa, Documentação e Referência sobre Movimentos Sociais e Políticas Públicas no Campo da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (CPDA/UFRRJ) explica que a dificuldade de chegar a dados concretos no campo é ainda maior.
Isso se deve, em boa parte, porque a violência em áreas rurais na ditadura acontecia fora das prisões, diretamente nos locais de vida e trabalho dos camponeses. “Dezenas de mortes que ocorreram não sabem sequer o nome porque não se conhece pelo nome, sobrenome, carteira de identidade. Mortes que acabam não sendo reconhecidas, mas os depoimentos são recorrentes”, disse.
Locais como Japeri, Nova Iguaçu, Duque de Caxias, Itaguaí, Magé e Cachoeiras de Macacu têm histórico de repressão no campo muito violento no estado, segundo Leonilde. No livro “Ditadura, conflito e repressão no campo: a resistência camponesa no estado do Rio de Janeiro”, organizado pela professora, são apresentados os resultados da pesquisa, financiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (FAPERJ).
“A preocupação é sempre de que se a reparação judiciária é muito difícil de ser feita, aconteça pelo menos uma reparação moral. Os camponeses tiveram um papel importante na resistência e a gente precisa colocá-los no mapa da história brasileira de novo. É o mínimo que a gente pode fazer em nome de uma reparação, pelo menos não serem personagens ausentes”, avalia Leonilde, que também integra a Comissão Camponesa da Verdade.
Edição: Vivian Virissimo