A vitória eleitoral de Bolsonaro, em 2018, consumou o que várias organizações e pensadores da esquerda classificam corretamente como uma derrota de consequência estratégica. Iniciou-se um período de defensiva da classe trabalhadora no país (e também na América Latina), o que já era perceptível desde o golpe de 2016 -- quando já se verificava a queda no número de greves e também de mobilizações, após a greve geral de 28 de abril de 2017.
Ao mesmo tempo, a crise é colocada em primeiro plano, com a aceleração da crise política. O projeto do caos de Bolsonaro (PSL) mistura obsessão ideológica, submissão aos EUA e alinhamento ao projeto neoliberal, junto à ameaça contra a democracia na relação do Executivo com outros poderes. Elimina-se a possibilidade de um governo com início estável como seria natural.
As contradições internas do governo, os impactos disso na disposição à luta de trabalhadoras e trabalhadores, o impacto na correlação de forças até então desfavorável, faz com que seja imprevisível a velocidade de superação dessa derrota dos trabalhadores/as. Quem melhor tem escrito sobre essa reestruturação de longo eixo em contradição com essa crise imediata é o Valerio Arcary.
Agora, quando o governo elege como frente de ataque a Educação -- foco dos ataques de Bolsonaro, ao lado da cultura e do sindicalismo, áreas em que a esquerda de fato tem influência --, mexe num vespeiro. Novos atores são postos em cena e movimento: os estudantes, que inclusive se alçaram à universidade dentro das condições dos governos de Lula e Dilma. Eles foram são protagonistas já no período anterior, uma juventude negra, filha da classe trabalhadora , mas que até então havia se manifestado de forma esporádica.
O governo Bolsonaro é composto pela ala olavista direitista ideológica, pelo bloco militar e pelo bloco do chamado “partido Lava Jato”, encabeçado por um judiciário responsável pelo golpe contra Dilma e pela prisão de Lula. Este último, é representado pela figura de Moro, tão autoritária e ideológica quanto Bolsonaro. O grupo vem colecionando derrotas na relação com o legislativo, ao ser escanteado pelo próprio Bolsonaro (quem além de tudo é um ser em quem nem seus aliados mais íntimos podem confiar), na derrota na pauta do Coaf. Precisou de um editorial até mesmo da tão crítica Folha de S. Paulo buscando reerguê-lo e recolocá-lo no interior do governo.
O poder judiciário, núcleo central do desmonte de um projeto de desenvolvimento nacional, via operação Lava Jato, sofre abalos e mostra que a derrota do grupo no poder é possível. As entrevistas de Lula, autorizadas pelo Supremo Tribunal Federal (STF), têm sido uma derrota visível do partido Lava Jato, pelas críticas contundentes feitas pelo ex-presidente. Assim como aconteceu em países da Europa, o atual governo não dá solução para os problemas populares, aprofunda a doença ao receitar mais neoliberalismo à economia, que já sofre com desemprego, queda na construção civil, empobrecimento das massas, queda na produção industrial e retirada de dinheiro da economia.
Porém, este é um período difícil, imprevisível, de luta, de sangria do governo Bolsonaro e de com isso ser urgente mostrar à população e aos trabalhadores as consequências de um projeto neoliberal/autoritário, retomar entre a esquerda um debate estratégico, ausente do período anterior. Trabalho de base, refazer a aliança com setores operários e precarizados, investimento em comunicação e formação são mantras importantes que têm sido repetidos pelas principais lideranças e militantes e é importante de fato colocá-los em prática.
A esquerda deve ter a humildade de aprender com o novo, sem, óbvio, abrir mão dos debates e questões fundamentais.
Neste eixo de luta longo, porém acelerado, nos tocou à nossa geração lutar e lutar e lutar.
*Pedro Carrano é jornalista do Brasil de Fato Paraná e militante da Frente Brasil Popular.
Edição: Rodrigo Chagas