Um protesto na manhã da última segunda-feira (6) ocupou a frente do Colégio Militar, na Tijuca, zona norte do Rio de Janeiro, onde o presidente Jair Bolsonaro (PSL) participava de uma cerimônia em homenagem aos 130 anos da instituição. Do lado de fora da comemoração, mais de três mil alunos, pais e servidores técnicos e docentes de colégios federais entoavam a palavra de ordem "não vai ter corte, vai ter luta".
Com faixas e cartazes contra a decisão anunciada pelo Ministério da Educação (MEC) - de bloquear 30% das verbas de custeio de todas as universidades e institutos federais do país -, o ato teve participação de estudantes do Colégio Pedro II, do Instituto Federal de Ciência e Tecnologia (IFRJ), do Centro Federal de Educação Tecnológica Celso Suckow da Fonseca (Cefet-RJ) e dos Colégios de Aplicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro (CAp-UFRJ) e da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (CAp-Uerj).
"Deu mais gente do que esperávamos e menos do que precisava, mas foi um ato lindo, fantástico. Desde 2016 não via um ato tão grande assim. A manifestação do dia 15 que vai acontecer na Candelária vai estar ainda mais cheia", enfatizou Caio Fatigati, de 17 anos, integrante do Grêmio Estudantil Marcos Nonato da Fonseca do Colégio Pedro II, campus Humaitá. "Marcos Nonato da Fonsesa foi um aluno negro da nossa unidade que foi morto durante a ditadura, temos muito orgulho de carregar esse nome do nosso Grêmio", acrescentou.
Fatigati explicou ainda que todos os institutos federais do Rio de Janeiro estão se comunicando para encontrar a melhor forma de continuar a mobilização contra o corte de verbas na área da educação. Através dos grupos de WhatsApp, há a tentativa de alcançar alunos de escolas estaduais, municipais e rede de ensino privadas. Com foco em retomar os atos na rua, a próxima manifestação deve acontecer já na quinta-feira (9).
Educação básica
O corte anunciado pelo MEC na semana passada afeta o pagamento de despesas com manutenção, limpeza e contas de água e luz de todas as universidade e institutos federais do Brasil. No estado do Rio de Janeiro há registro de mais de 13 mil alunos inscritos na rede pública, se somados a educação básica, o ensino médio e a Educação de Jovens e Adultos (Proeja). Entre as instituições de ensino, o colégio mais atingido será o CPII que vai perder mais de R$ 18 milhões do orçamento ainda neste ano, o mesmo de 36% do orçamento. A redução inviabiliza o funcionamento da escola, segundo os Diretores-Gerais.
"Eu Defendo o CPII" foi um dos assuntos mais comentados do Twitter nesta segunda (6). Para Julia Aguiar, estudante de Ciências Sociais na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e diretora da União Nacional dos Estudantes (UNE), a mobilização dos secundaristas é uma resposta ao desmonte da educação pública promovido pelo governo Bolsonaro.
"O MEC já demonstrou que não entende como funciona as escolas federais e a importância delas pra juventude brasileira. Com o corte implementado, talvez os colégios não tenham condições de terminar o ano letivo, o que é um ataque grave à educação. A população não pode aceitar esse descaso", afirma.
Em nota enviada ao Brasil de Fato, o MEC informou que 40% dos R$ 69,2 milhões previstos na Lei Orçamentária Anual (LOA) foram liberados no início deste ano para o Colégio Pedro II, para custear despesas até junho. Das verbas de custeio, segundo o órgão, a unidade utilizou 22% do valor disponível, tendo R$ 18 milhões para o próximo mês.
"Tudo isso demonstra que a unidade está em plenas condições de se manter e não utiliza todo o recurso disponível", diz a nota. O CPII é a única instituição de educação básica no país sob responsabilidade da União.
Ensino federal
"Entrei com seis anos e saí com 18, foi a minha formação humana. Minha família não tinha grana, não sei onde teria estudado", conta a designer Juliana Braga que assim como diversos ex-alunos também estava na manifestação apoiando os estudantes do Colégio Pedro II. Ela destaca o exercício da empatia e as disciplinas de cidadania, arte e música das quais teve acesso.
"É um colégio púbico de excelência, pude desenvolver minha aptidão pela arte desde cedo. E a empatia é inevitável porque são pessoas de realidades muito diferentes que aprendem a levantar seus posicionamento em um debate muito saudável", acrescenta.
Outra ex-aluna é Luciana Ribeiro, 32 anos, que decidiu se tornar professora por conta da vivência como estudante desde o ensino fundamental na década de 1990 no campus Tijuca. "Foi tão bom que me fez querer voltar e retribuir de alguma maneira a experiência que eu tive de me sentir acolhida e feliz como aluna", conta.
Desde 2015, ela é professora efetiva da disciplina de Inglês no lugar que norteou a formação profissional e onde teve início sua admiração pelo ensino. Luciana descreve a experiência no colégio como transformadora. "Tive oportunidade de sair de um mundinho de escola particular, classe média, limitado, e conhecer um mundo mais democrático com diferentes classes sociais e oportunidades que foi enriquecedor", conclui.
Edição: Mariana Pitasse