Um dia após a aprovação da reforma da Previdência na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados, o líder da oposição na Casa, Alessandro Molon (PSB-RJ), reagiu à notícia da liberação extra de R$ 40 milhões em emendas que teriam sido prometidas pelo governo a parlamentares em troca de apoio à proposta na votação do plenário, caso a medida chegue à terceira fase de avaliação.
“É uma denúncia gravíssima. Mostra que essa conversa de ‘nova política’ é conversa pra boi dormir. O governo Bolsonaro pratica o velho, o decrépito ‘toma lá dá cá’ que sempre disse condenar, mas, com poucos meses de governo, já foi pro balcão de negócios”, criticou o líder.
O dado veio à tona após reportagem publicada pelo jornal Folha de S. Paulo nesta quarta-feira (24). De acordo com o veículo, a promessa teria sido feita pelo ministro-chefe da Casa Civil, Onyz Lorenzoni, na semana passada e incluiria a liberação da verba até 2022.
O valor de R$ 40 milhões seria para cada deputado que aceite votar favoravelmente à Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 6/2019, nome técnico da reforma no Poder Legislativo.
O aporte prometido pelo governo aumenta em 65% o valor que cada deputado pode manobrar no orçamento federal previsto para este ano. A verba proveniente das emendas é utilizada por parlamentares para atender demandas de investimentos em projetos nas suas bases estaduais. Por conta disso, as emendas são utilizadas como ferramenta de capital eleitoral para deputados e senadores.
Após a veiculação da notícia sobre as emendas, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), rebateu as críticas da oposição afirmando que a Câmara “não está trocando nada”. Ele tem sido o principal articulador da reforma dentro da Casa, em aliança com a equipe do Palácio do Planalto e líderes partidários ligados ao governo.
"O orçamento está contingenciado, a reforma foi aprovada. Agora, se executar o orçamento for crime, não sei mais como se faz política. Uma coisa é execução do orçamento, outra coisa é trocar, e a Câmara não está trocando nada", sustentou Maia.
Comissão especial
Para Alessandro Molon, os principais desafios da oposição a partir de agora incluem a necessidade de maior detalhamento dos diferentes trechos da PEC, de forma a esmiuçar e amplificar o debate nacional sobre o tema durante a tramitação da proposta na comissão especial.
“É mostrar pro povo brasileiro que isso que eles chamam de reforma é, na prática, destruir a Previdência Social brasileira. Na medida em que os brasileiros entenderem o que o governo Bolsonaro está propondo, a tendência é que a opinião pública fique cada vez mais contrária [à pauta]”, complementa o líder.
O colegiado especial, que tem o objetivo de avaliar o mérito da matéria, teve o ato de criação despachado nesta quarta-feira (24) pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia, e deverá ser instalado até a próxima semana.
Entre outras coisas, os seis partidos de oposição tentam retirar da reforma, por exemplo, os dispositivos que enrijecem as regras previdenciárias para idosos – por meio de mudanças no Benefício de Prestação Continuada (BPC) – e as propostas do governo para trabalhadores do campo.
Os dois estão entre os aspectos da reforma mais alvejados por diferentes grupos políticos da Câmara, inclusive pelo “centrão” – espectro político que reúne partidos de direita não oficialmente aliados do Planalto, como PP, PR, PSD, MDB, PRB, DEM e Solidariedade –, mas, na CCJ, o governo não aceitou retirar os dispositivos do texto.
Os centristas serão maioria na comissão especial da reforma, com pelo menos 21 das 49 vagas do colegiado, cujos integrantes devem ser nomeados nos próximos dias. Para que a PEC seja aprovada, o governo precisará de um mínimo de 25 votos porque a votação se dá por maioria simples.
Apesar das articulações que o centrão vem travando com o governo em troca de cargos e emendas para negociar apoio à reforma, o líder da oposição acredita na chance de retirada de pontos mais críticos da PEC, como é o caso do BPC e da aposentadoria rural.
“Acho que é possível, mas também não acho que seja suficiente. Não basta retirar BPC e a questão do trabalhador rural. Há muitas outras crueldades nessa proposta, em especial a mudança de regime para a capitalização”, pontua Molon, acrescentando que a oposição deverá seguir na batalha pela manutenção do modelo de financiamento atual do regime previdenciário.
Para a vice-líder da bancada do PT, Maria Rosário (PT-RS), a mobilização contra o movimento que o governo vem costurando junto ao centrão tem como oxigênio a interação da oposição na Câmara com os movimentos populares nas diferentes regiões. A ideia é pressionar os diferentes deputados para tentar convencê-los a rejeitar a PEC.
“Acho que isso é o fundamental, porque o deputado vai ter que optar entre o Bolsonaro, que tem índices negativos de aprovação, e o povo e os votos que o elegeram. O nosso objetivo como oposição é fazer conexão com as ruas”, disse a vice-líder.
Requerimento
A oposição também segue em mobilização permanente nos bastidores da Casa para tentar validar o requerimento que pediu, na terça-feira (24), a suspensão da tramitação da reforma pelo fato de o governo não ter apresentado documentos e cálculos oficiais que demonstrem o impacto da reforma para os cofres públicos. O movimento foi das siglas PT, PDT, PSB, PCdoB, PSol e Rede.
Os opositores aguardam a validação de parte das assinaturas, que foram rejeitadas pela Câmara na noite de terça, pouco antes da votação do relatório do Deputado Marcelo Freitas (PSL-MG). Se o documento for definitivamente rejeitado, a oposição pretende ir ao STF para pedir a anulação da sessão de votação do relatório.
“Pra nós, esse debate continua vivo”, disse a vice-líder da bancada do PT, Maria do Rosário (RS).
Se o pedido for finalmente aceito pelo presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), a tramitação da reforma será suspensa por vinte dias, impactando o período de discussão da proposta na comissão especial.
Edição: Aline Carrijo