CRIME DA VALE

JusDh questiona contratação de Ellen Gracie para apuração do crime ambiental da Vale

Em nota, avaliação é que contratação da ex-ministra do STF pela Vale busca minimizar a crise perante a opinião pública

Brasil de Fato | Porto Alegre (RS) |
Vale estaria tentando se valer do prestigio e imagem do STF
Vale estaria tentando se valer do prestigio e imagem do STF - Reprodução

Em nota publicada nesta segunda-feira (04) a Articulação Justiça e Direitos Humanos (JusDh) questiona o anúncio de que a ex-ministra e ex-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Ellen Gracie, irá coordenar o Comitê Independente de Assessoramento Extraordinário de Apuração (CIAEA). Criado pela própria empresa Vale, o Comitê foi anunciado pela empresa como responsável pela apuração das circunstâncias do rompimento da barragem em Brumadinho, no último dia 25 de janeiro.

De acordo com a manifestação pública da JusDh, a contratação da ex-ministra do STF pela Vale, em um contexto em que a empresa atua para minimizar a crise perante a opinião pública, tenta se valer do prestigio e imagem do STF.

“Desde que saiu do STF (por vontade própria), Ellen Gracie vem atuando, nestes moldes, como uma expert que, na condição de ex-presidente do STF, empresta para as empresas contratantes, usualmente em momentos em que necessitam defender e melhorar sua imagem perante a opinião pública e as autoridades, especialmente judiciais, o prestígio e a própria imagem do Supremo Tribunal Federal, em uma perspectiva de legalidade, autonomia e independência”, diz um  trecho da nota.

Para a JusDh, rede nacional composta por entidades e organizações de assessoria jurídica e movimentos sociais de defesa da democratização da justiça, o Comitê de apuração do crime da Vale deverá, necessariamente, ser composto por membros da comunidade e de movimentos sociais.

“A JusDh compreende que um comitê verdadeiramente independente, ainda que contratado pela empresa, de ser composto por especialistas indicados pela comunidade e movimentos sociais, não sendo outra, inclusive, a medida que a própria ex-ministra do STF deveria tomar à frente deste comitê”, aponta outro trecho

Veja abaixo a íntegra da Nota

Nota da JusDh sobre contratação da ex-ministra Ellen Gracie para coordenação de Comitê da Vale para apuração do crime ambiental de Brumadinho (MG)

Chama atenção a contratação da ex-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), para chefiar o comitê nomeado pela empresa Vale para apurar as falhas e responsabilidades da própria empresa ante o que se anunciou e já se confirma como um dos maiores crimes socioambientais do país.

Como se observa em outras oportunidades, desde que saiu do STF (por vontade própria), Ellen Gracie vem atuando, nestes moldes, como uma expert que, na condição de ex-presidente do STF, empresta para as empresas contratantes, usualmente em momentos em que necessitam defender e melhorar sua imagem perante a opinião pública e as autoridades, especialmente judiciais, o prestígio e a própria imagem do Supremo Tribunal Federal, em uma perspectiva de legalidade, autonomia e independência.

Nestes termos, o que a contratação da ex-ministra do STF explicita, em uma tragédia de dimensões criminosas como essa, é o perfil dos agentes e lugar que o sistema de justiça se coloca e se encontra, quando se trata das denúncias cotidianamente realizadas por movimentos sociais e defensoras/es de direitos humanos, em face de violações dramáticas porém corriqueiras que, não raro, no limite se desfecham em catástrofes criminosas, como a que novamente a empresa Vale se vê enredada, porém relutantemente responsável.

Não é apenas no ambiente e na mente empresarial que a propriedade e o lucro valem mais que a dignidade de uma ou centenas de vidas. A catástrofe de Brumadinho e a sugestiva contratação de uma ex-presidente do STF para assumir a dianteira da Vale perante a opinião pública e as autoridades, pôe em voga todas as centenas de denúncias e as usualmente frustrantes respostas do sistema de justiça em face da luta pela dignidade, liberdade e pelos  direitos humanos no Brasil, especialmente quando opõe sujeitos e comunidades das mais diversas expressões étnicas e socioculturais, com empresas de capital multinacional que, a cada dia, disputam, contratam e conquistam não apenas minérios, terras, rios, florestas e os espaços urbanos, mas também o ambiente, o gabinete, os eventos, e a lealdade judicial.

Nestes termos, a JusDh compreende que um comitê verdadeiramente independente, ainda que contratado pela empresa, de ser composto por especialistas indicados pela comunidade e movimentos sociais, não sendo outra, inclusive, a medida que a própria ex-ministra do STF deveria tomar à frente deste comitê, inclusive como sinalização do compromisso que se espera que uma ex-ocupante da mais alta corte de justiça do país possua em relação à voz, à dignidade e às vidas tragadas pela negligência da Vale, em Brumadinho.

 Brasília, 04 de fevereiro de 2019.

Edição: Marcelo Ferreira