Um dos temas fundamentais dos evangelhos é a justiça social. Jesus sempre falava sobre este assunto. Ele fez críticas fortes à riqueza (Lucas 18:25), estabeleceu como critério de discipulado a distribuição da riqueza (Mateus 19:21; João 6:1-13).
A riqueza resulta do acúmulo de bens e de capital e gera desigualdades sociais. Para que haja alguns ricos, é preciso haver muitos pobres. Isto é injusto. Uma sociedade justa é aquela que faz distribuição de riqueza. O Brasil é dos países mais desiguais do mundo; consequentemente, é um dos mais injustos. Mas como é que uma estrutura social tão injusta se sustenta, através dos séculos, num país de maioria cristã? Não deveriam as Igrejas cristãs buscar que os valores mais profundos dos evangelhos sejam transformados em políticas públicas de distribuição de renda e de riqueza?
É aqui que a inversão de valores acontece. O discurso teológico e a prática da maioria das igrejas cristãs seguem a lógica do capitalismo, e a interpretação dos evangelhos é feita a partir da subserviência ao capital. Como denunciar o acúmulo de bens e de capital dos indivíduos e das empresas se as próprias igrejas acumulam propriedades, dinheiro, emissoras de rádio, TV e tantos outros haveres? Como denunciar a desigualdade social se é a desigualdade que mantém e justifica os privilégios de tantos líderes?
É nesse contexto que se cria um outro valor. A sexualidade passa a ser ensinada como valor fundamental do Evangelho. Temas como: relações sexuais, virgindade, homossexualidade, heterossexualidade e as outras sexualidades passam a ter uma relevância tão grande nas pregações e nos ensinamentos das igrejas, que as pessoas acreditam que este é um tema fundamental para os evangelhos. No Brasil, até um Kit Gay foi inventado e influenciou o rumo da última eleição presidencial. Mas Jesus não se ocupou dos temas relativos à sexualidade humana, a não ser em duas ocasiões, para defender as mulheres.
A ênfase na sexualidade é uma cortina de fumaça que busca ocultar o que, de fato, importa: a desigualdade e consequentemente, a injustiça social que dela deriva.
*Lusmarina Campos Garcia é teóloga e pastora luterana, e doutoranda em direito pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
Edição: Vivian Virissimo