O certo é que a grandiosidade de tudo em São Paulo espanta
São Paulo é um vício. Isso é o que eu costumo falar para pessoas que dizem estar cansadas da cidade, com a poluição, o barulho, a violência, o custo para viver aqui, mas continuam morando aqui.
Alguns mudam para um lugar pequeno, mais sossegado, mais barato e menos violento, mas parte deles não se acostuma, depois de pouco tempo, parte deles volta para cá. Estão viciados em São Paulo.
Aqui, passam anos sem ir ao cinema e muitos nunca foram a um teatro, mas quando vão para lugares que não têm cinema ou teatro dizem sentir falta deles.
O certo é que a grandiosidade de tudo em São Paulo espanta. E não é de hoje. Aliás, hoje espanta menos, porque nos lugares mais distantes as pessoas veem São Paulo todos os dias nos noticiários da televisão, e têm noção do tamanho da cidade e dos seus problemas. Mas e antes da televisão chegar a esses lugares?
Muitos conterrâneos meus, quando vinham a São Paulo voltavam para minha terra contando com ar de espanto o que viam aqui. E havia brincadeiras, gozações, para falar do nosso deslumbramento diante de uma cidade tão grande e tão movimentada.
Quando o Belmiro veio conhecer São Paulo e voltou para Minas, disseram que ele foi visto parado de cabeça baixa, com o chapéu na mão, na confluência da praça do Patriarca com a rua Direita, olhando de soslaio o intenso movimento de pedestres.
Perguntaram o que ele estava fazendo ali e ele respondeu:
— Uai, tô esperando essa procissão passar pra eu ir até a praça da Sé.
Para ele, tanta gente andando a pé só podia ser procissão.
Outra historinha é do Tonico, caminhoneiro que foi contratado para trazer um caminhão de batatas até o Ceasa, atual Ceagesp, e deu carona ao amigo Nelico, que queria conhecer a cidade.
Foram direto ao Ceasa e o Nelico ficou impressionado com tanta batata que viu lá. Ele comentou:
— Ô, Tonico, já tem tanta batata aqui, pra que que eles compraram mais batata lá na nossa terra?
O amigo respondeu:
— Rá! Essa batata, aqui em São Paulo, não dá nem pra dois dias!
— Brincadeira! Tem batata pra mais de mês aí! — falou o Nelico, que não acreditava de forma alguma que em São Paulo houvesse tanta gente, capaz de consumir em dois dias aquele mundão de batatas que viu no Ceasa.
Enquanto o caminhão era descarregado, os dois foram ao centro da cidade, comprar umas encomendas. Desceram do ônibus, passaram pelas avenidas São João e Ipiranga, pela rua Barão de Itapetininga, praça Ramos, viaduto do Chá... Na rua Direita, o Nelico parou e ficou olhando o povo, com cara de espanto, sem falar nada. O Tonico perguntou:
— Que que foi, Nelico?
E ele respondeu:
— Tonico... Vai faltar batata!
Edição: Júlia Rohden