Na manhã desta quarta-feira (21), cerca de 150 famílias de agricultores do acampamento Zé Maria do Tomé, em Limoeiro do Norte, no Ceará, estão resistindo e negociando com a Polícia Militar para impedir o cumprimento de uma ordem judicial de despejo em uma área da União, que está localizada em um perímetro irrigado com forte presença do agronegócio.
Os trabalhadores rurais sem-terra, que ocupam a área há quatro anos, estão cercados pelos policiais, que montaram um bloqueio na estrada que dá acesso ao acampamento para impedir a chegada de ônibus com pessoas que querem dar apoio aos agricultores.
No momento, os sem-terra e a ouvidoria de Direitos Humanos do governo do Ceará estão negociando um acordo com os policiais. Organismos pastorais da igreja católica e estudantes também estão no local.
O Brasil de Fato entrou em contato com Francisco Hermenegildo Souza, coordenador estadual do DNOCS, Departamento Nacional de Obras Contra as Secas, no Ceará, questionando sobre a pressão feita pelos latifundiários para que o governo expulse, a qualquer custo, os agricultores sem-terra da região. Souza não respondeu ao e-mail.
A Secretaria de Segurança Pública e Defesa Social do Estado informou que equipes do Batalhão de Polícia de Choque (Bpchoque), da Companhia de Distúrbios Civis (CDC) e do Comando Tático Rural (COTAR) participaram da ação. Segundo a nota da secretaria, chegando no local, os militares verificara "a necessidade de um planejamento mais aprofundado para que o cumprimento da ordem judicial acontecesse de forma tranquila".
Histórico
A ocupação fica na Chapada do Apodi, dentro do Perímetro Jaguaribe Apodi, implantado no final dos anos 1980, quando, segundo o site do MST, "a expropriação, expulsão e desmantelamento da produção de cerca de 6 mil famílias da região, que antes produziam alimentos e mantinham relações de identidade com o território".
Segundo a entidade, apenas 316 agricultores conseguiram participar do projeto de irrigação, porém 255 foram expulsos posteriormente, o que representa uma taxa de 81% de expropriação, de acordo com estudos realizados pela Universidade Estadual do Ceará/FAFIDAM.
O acampamento leva o nome de Zé Maria Tomé, que foi brutalmente assassinado dia 21 de abril de 2010 "a mando do agronegócio por defender terra, água e alimentos livres de venenos. Ele lutava pela proibição da pulverização aérea e por terra para quem nela trabalha. Para homenagear este companheiro que teve sua voz calada", afirma nota dos acampados.
Tomé presidia a Associação dos Ex-irrigantes Expropriados do Perímetro Jaguaribe-Apodi (AIJA), que conseguiu que o Departamento Nacional de Combate às Secas (DNOCS), responsável pelas terras, realizasse no ano de 2009, a mando da Justiça, um estudo sobre a estrutura fundiária do Perímetro Irrigado Jaguaribe-Apodi. O resultado identificou que, dos 10 mil hectares do projeto, 4 mil estão invadidos e grilados, principalmente, por empresas nacionais e transnacionais, que concentram 50% desse total (invadidas e griladas), somente em áreas acima de 100 hectares, são elas: Del Monte (1.223,27); Banesa (356,74); Fruta Cor (284,29) e WG Prod. e Distrib. De Frutas Ltda. (174,46)
“A ocupação da Chapada do Apodi aconteceu com a intenção dos trabalhadores e trabalhadoras as retomarem suas terras, de plantar, de garantir o acesso a terra, a água, por isso exigimos uma solução imediata do governo estadual e federal para resolução do despejo e desapropriação imediata. Esse não é o primeiro mandado de despejo, vieram outros antes desse. Aqui as famílias vivem sob constante ameaça de despejo”, afirma Iris Carvalho, da coordenação do MST.
Vitória
No começo da tarde, após a negociação entre as lideranças do acampamento e os oficiais da PM responsáveis pelo cumprimento da ordem de despejo, ficou acertada a suspensão da ação.
Foi enviado um vídeo da mobilização dos agricultores para o juiz Bernardo Lima Vasconcelos Carneiro, da 15ª Vara Federal de Limoeiro do Norte, que autorizou a suspensão do despejo. Os policiais foram embora e não houve confronto.
No entanto, a sentença judicial determinando que os agricultores deixem a área continua valendo. Ou seja, as 150 famílias de sem-terra ainda correm o risco de serem despejadas no futuro.
Edição: Brasil de Fato