O ministro Ricardo Lewandowski determinou, nesta segunda-feira (1), que seja cumprida sua decisão, divulgada na última sexta-feira (28), de autorizar que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva possa conceder entrevistas.
“Reafirmo a autoridade e vigência da decisão que proferi para determinar o acesso ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva a fim de que possam entrevistá-lo, caso seja de seu interesse, sob pena de configuração de crime de desobediência, com o imediato acionamento do Ministério Público para as providências cabíveis, servindo a presente decisão como mandado. Comunique-se ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região, à Juíza Federal da 12ª Vara Federal de Curitiba/PR. Publique-se e intimem-se. Cumpra-se”, disse o ministro, em despacho.
Na semana passada, recorrendo a uma decisão da juíza da 12ª Vara de Execuções Penais, Carolina Lebbos, o jornal Folha de São Paulo e a Rede Minas de Televisão conseguiram uma autorização do ministro Lewandowski para que os jornalistas Mônica Bergamo e Florestán Fernandes Júnior pudessem ouvir o ex-presidente. No mesmo dia, o ministro Luiz Fux, em decisão monocrática, suspendeu os efeitos da decisão do colega, gerando uma crise dentro do STF.
O advogado e doutor em Direito Leonardo Yarochewky qualificou a ação do ministro Fux como teratológica, ou seja, uma anomalia do ponto de vista jurídico, com implicações sérias para o funcionamento da mais alta corte do país.
“Essa decisão, realmente, fere o próprio Supremo Tribunal Federal, que tem entendimento contrário, já que a decisão do Lewandowski não foi uma liminar, ela avaliou o mérito e, portanto, não poderia ser derrubada por outro ministro”.
Para Beatriz Vargas, jurista, professora da Universidade de Brasília (UNB) e doutora em Direito, não há brechas na legislação que permitam que um ministro, de maneira monocrática, casse uma decisão de um colega de mesma hierarquia. “No caso da decisão definitiva, caberia, em tese, um recurso. Não há forma nem figura jurídica que permita que um outro ministro casse uma decisão definitiva. A Raquel Dodge [Procuradora-Geral da República] já tinha inclusive se manifestado no sentido de que não iria recorrer em respeito à liberdade de imprensa”.
A jurista explica que mesmo ocupando a presidência do STF de maneira temporária, a decisão do ministro Luiz Fux pode ser caracterizada como censura prévia. “É, sem dúvida, uma decisão que afeta muito a autoridade do Supremo. Porque uma pessoa que está ocupando uma presidência, um ministro, age como uma espécie de censor do outro. No caso do Fux eu acho ainda mais grave, primeiro porque a decisão do Lewandowski não era uma decisão liminar. Ele já havia decidido o mérito do pedido”, conclui, qualificando a postura de Fux como um “procedimento flagrantemente antidemocrático”.
Uma outra questão destacada por Yarochewsky é o fato que a decisão de Fux ter sido resultada de um pedido feito por um partido político, no caso, o Partido Novo, uma entidade de direito privado, quando, segundo o advogado, “a lei é clara no sentido de que apenas o Ministério Público e entidades jurídicas de direito público podem pedir a suspensão, entre aspas, de liminar”.
Na manhã desta segunda-feira, Lewandowski já havia criticado publicamente a decisão de Fux, sem citar o nome do colega, durante uma palestra da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP). “Essa decisão censurou um dos mais importantes veículos de comunicação do Brasil, impedindo que este veículo fizesse uma entrevista com um ex-presidente da República”, disse.
Abraji condena censura
Em nota, a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) condenou a censura prévia praticada pelo STF. “A Abraji vê com extrema preocupação o fato de ter saído do Supremo Tribunal Federal, guardião máximo dos direitos estabelecidos na Constituição, uma ordem de censura à imprensa e de restrição à atividade jornalística”.
Segundo o comunicado, "não cabe ao Supremo Tribunal Federal definir o que seriam 'informações falsas ou imprecisas’, antes mesmo de sua publicação, nem regular sua circulação, durante uma campanha eleitoral ou em qualquer outro momento".
E faz um apelo aos ministros da corte. "A Abraji apela ao plenário do Supremo Tribunal Federal para que reestabeleça o entendimento, já firmado pela própria Corte quando da extinção da Lei de Imprensa, de que ‘não cabe ao Estado, por qualquer dos seus órgãos, definir previamente o que pode ou o que não pode ser dito por indivíduos e jornalistas’, e de que ‘a censura governamental, emanada de qualquer um dos três Poderes, é a expressão odiosa da face autoritária do poder público’".
Edição: Diego Sartorato