Conheço um jovem negro, trabalhador, bem intencionado, manso no falar, sorridente, tranquilo na forma de conviver, educado e adepto de Bolsonaro.
Tentei entender o porquê. O motivo que me informou foi relacionado à violência, drogas, roubos e os bandidos soltos por aí sem ninguém fazer nada.
Procurei questionar se as propostas simplistas do candidato resolveriam o problema da violência. Percebi um bloqueio tipo “alguém tem que fazer alguma coisa”.
Em outro encontro com o bom rapaz tomei nas mãos uma propaganda do candidato do PSL. Lá estava escrito: “Brasil acima de Tudo.” “Deus acima de todos”.
Perguntei-lhe: “Você sabe qual era o lema de Hitler na Alemanha nazista?”
Respondeu-me que não.
“Deutschland über alles.”
“O que quer dizer isto?” – perguntou-me.
“Alemanha acima de tudo”. Igual a este aqui: “Brasil acima de tudo”.
Pareceu-me ter ficado surpreso e confuso. Ainda disse-lhe que começa assim, com frases totalitárias que parecem simpáticas, e acabam em guerras entre irmãos.
Foram sempre conversas tranquilas e educadas.
E depois disto mais não conversamos.
Lembrei então de quando, anos atrás, estive na Alemanha e meu grande amigo Rolf Künnemann, então secretário executivo de FIAN ( entidade internacional que defende o direito humano à alimentação) me levou a dois lugares simbólicos.
Em Nuremberg, no estádio onde Hitler fazia suas concentrações militares, com o povo nas arquibancadas e do púlpito o ditador levantava o braço direito e gritava; e todos respondiam:
“Alemanha.”
“Acima de tudo.”
Num gesto inconsciente, no mesmo púlpito, levantei o braço. Em seguida, envergonhado, em oração, meditei: “também tenho um ditadorzinho dentro de mim, preciso cuspi-lo fora”.
Depois Rolf me levou à praça de uma cidade alemã. Lá estavam, no centro da praça, fotos da cidade destruída em 1945 após os bombardeios das tropas aliadas. Toda destruída. Andando pela cidade, a tinha visto reconstruída.
Não resisti a uma pergunta:
“Rolf, me explica uma coisa. Como é que um povo culto, estudado e inteligente como o povo alemão, pode embarcar num fanatismo desses?”
Disse-me que nasceu depois da Segunda Guerra e que fizera a mesma pergunta a seus pais. E a resposta que ouvira deles fora:
“Foi como se tivéssemos tido um sonho coletivo de sonâmbulos. Quando acordamos, tudo tinha acontecido”.
Há fascistas convictos e dirigentes e estes precisam ser derrotados.
Mas quantos são simples sonâmbulos que podemos acordar deste sonambulismo que atinge gente boa da sociedade brasileira?
Edição: Diego Sartorato